Cinco filmes assistidos que merecem destaque:
sábado, 31 de maio de 2025
PL►Y: Tudo que Imaginamos Como Luz
Confesso que assisti Tudo que Imaginamos Feito Luz assim que estreou o TeleCine, mas demorei muito para escrever sobre ele. Pensei que fosse bom até revê-lo, já sabendo do tipo de filme que se trata, mas não cheguei a fazê-lo. Comecei a escrever sobre ele algumas vezes desde então, mas sempre apagava o texto. Recomeçava. Desistia. Nas últimas semanas resolvi que ele seria um daqueles longas a que assisto e que não escrevo no blog, ou por não merecer muito comentário ou porque simplesmente não consigo escrever o texto certo para falar sobre ele (e isso acontece mais do que você imagina, tanto que somente recentemente, ao comentar Baby descobri que nunca terminei e publiquei meu texto sobre Corpo Elétrico). Mas por que eu devo escrever sobre este filme? Simplesmente por muitos considerarem que a Índia fez uma baita mancada quando não o indicou para uma vaga ao Oscar de Filme Internacional no ano passado, mesmo com o sucesso do filme em festivais, a começar por seu lançamento no Festival de Cannes - de onde saiu com o Grande Prêmio do Júri (espécie de medalha de prata). A Índia preferiu indicar Laapataa Ladies, que ficou de fora das peneiras iniciais o Oscar, mas ao assistir ao filme de Payal Kapatia fica fácil entender o motivo do país não o escolher. Famoso pelas características de Bollywood, Tudo que Imaginamos como Luz é o oposto do que lembramos quando vemos um filme indiano. Não existe aquele visual multicolorido, as danças e os sorrisos fartos, talvez por isso o país não o tenha considerado um representante digno do seu cinema (o considerou europeu demais?), no entanto, muita gente gotou da sensação de ver um cinema indiano diferente, mais contido, introspectivo – o que não deixa de ser uma ousadia. O filme opta por apresentar Bombaim por outra ótica, mais noturna e diversa. A cidade serve de cenário para duas enfermeiras, Prabha (Kani Kusruti) e Anu (Divya Prabha), que trabalham juntas e dividem o mesmo apartamento. O roteiro tem a preocupação de apresenta-las como mulheres antenadas, que defendem anticoncepcionais e rejeitam casamentos arranjados pela família, trocam mensagens de celular, usam metrô, escutam músicas, são apresentadas como tantas mulheres que vivem em uma grande metrópole para depois o roteiro aprofundar os dilemas das personagens com raízes bastante culturais. O marido de Prabha foi para a Alemanha e faz tempo que não manda notícias, colocando a personagem em um conflito de sentimentos entre o casamento e a ideia de abandono, enquanto isso, Anu se apaixona por um muçulmano a contragosto da família deseja que se case com outro rapaz. Apesar de todas as possibilidades melodramáticas perante a vida amorosa das personagens, o filme segue por uma linha diferente, o diretor estica o tempo, a narrativa não acelera e lida com o drama de forma bastante discreta até que a narrativa muda de cenário para aprofundar as metáforas do texto, mesclando o que é real com a imaginação das personagens e do espectador. A forma como o filme lida com o amor e a sexualidade das personagens, assim como a cultura local, fazem com que o filme destoe da vasta produção de seu país. A fotografia pode parecer mais sombria que o habitual e os diálogos mais simples do que o esperado, mas isso reforça o realismo do diretor em abordar o cotidiano de seus personagens. Acredito que para muita gente o filme não traz nenhuma novidade, mas o mérito do longa está justamente nisso: ser um filme indiano que consegue apresentar suas personagens como se pudessem viver em qualquer lugar do mundo.
Tudo que Imaginamos Com Luz (All We Imagine As Light / França - Índia - Itália - EUA - Suíça / 2024) de Payal Kapatia com Kani Kusruti, Divya Prabham, Hridhu Haroon, Chhaya Kadam, Azees Nedumangad, Anand Sami e Madhu Raja. ☻☻☻
sexta-feira, 30 de maio de 2025
MOMENTO ROB GORDON: Personagens icônicos de Harrison Ford
Nascido na cidade de Ilinois em Chicago em 13 de julho de 1942, Harrison Ford começou sua carreira como ator nos anos 1960 e na década seguinte já estava participando de sucessos na telona. Ford ajudou a escrever a história do cinema desde então e poucos atores coleciona tantos papéis icônicos no cinema. Alguns dos trabalhos do ator se tornaram verdadeiras referências ao longo do tempo e este Momento Rob Gordon serve para lembrar cinco de seus trabalhos mais marcantes:
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#05 John Book (A Testemunha) |
PL►Y: Capitão América - Admirável Mundo Novo
domingo, 25 de maio de 2025
PL►Y: Herege
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Grant: labirinto retórico que funciona. |
Herege (Heretic / EUA - Canadá / 2024) de Bryan Woods e Scott Beck com Hugh Grant, Sophie Tatcher, Chloe East, Topher Grace, Elle Young e Elle McKinnon. ☻☻☻
PL►Y: Here
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Liyo e Stefan: de humanos e musgos. |
Confesso que tenho um pouco de dificuldade em acompanhar as narrativas dos filmes do belga Bas Devos. Sei que ele tem fãs ao redor do mundo e realmente os admiro por enxergar atrativos em suas narrativa quando, na maioria das vezes, o que geram é minha desatenção. Tenho um amigo que é muito fã do cinema de Devos e vê-lo falar tão entusiasmado do último filme do cineasta (que acabou de chegar no Filmicca), tornou assistir Here uma verdadeira questão de honra. O curioso foi que se tornou o primeiro longa do diretor que consegui assistir completo (como ele possui apenas quatro longas no currículo, talvez eu possa dar uma segunda chance aos outros). Se não fosse o comentário do tal amigo, mais uma vez, eu não veria nada demais na história que temos aqui: Stefan (Stefan Gota) é um trabalhador da construção civil que está prestes a sair de férias e ir visitar à família na Romênia. Paralelo a isso conhecemos Shuxiu (Liyo Gong), que leciona microbiologia na faculdade de manhã e ajuda a tia em um restaurante chinês à noite. Se ele habita um ambiente urbano, com muitos prédios e concreto (ampliado pelos planos abertos utilizados pelo diretor), Shuxiu volta-se cada vez mais para o micro, um universo tão pequeno em comparação aos arranha-céus que passa desapercebido pela grande maioria das pessoas. O encontro dos personagens faz com que a narratia estabeleça uma espécie de zoom, que vai da construção de um prédio na cidade, passando para os núcleos familiares de seus personagens até chegar ao estudos de Shuxiu sobre musgos. Não é por acaso que o roteiro explora o encontro de um rapaz que está de férias e volta às suas origens e uma microbiologista de origem estrangeira. Existe entre os dois uma busca por conexão com os lugares que habitam (e com o mundo em si) e o diretor estabelece um quase romance entre os dois personagens de forma bastante discreta e singela, mas que não deixa de ter uma certa sensualidade ao explorar o sorriso irresistível de Shuxiu ou as pernas sempre à mostra de Stefan (a quem a personagem se refere como "o rapaz de short"). Bas Devos sempre mostrou-se um diretor que gosta de criar belas imagens, muitas vezes estando mais preocupado com a estética dos filmes do que com seus roteiros. Aqui ele consegue conciliar isso de forma quase terapêutica, estabelecendo uma viagem do macro ao micro da vida na Terra, seja da vida dos seres humanos em seus encontros, idas e vindas ou da presença de musgos que irão herdar o mundo quando as pessoas partirem. Essa sensação de respiro que o filme proporciona rendeu no Festival de Berlim o prêmio de melhor longa na mostra Encounters, do qual saiu também com o prêmio da crítica.
Here (Bélgica - 2024) de Bas Devos com Stefan Gota, Liyo Gong, Cédric Luvuezo, Teodor Corban, Saadia Bentaïeb, Alina Constantin e ShuHuan Wang. ☻☻☻
sábado, 24 de maio de 2025
PREMIADOS FESTIVAL DE CANNES2025
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Um Simples Acidente: Palma de Ouro em Cannes 2025. |
Parece que o páreo da 78ª Edição do Festival de Cannes foi acirrado! Ouvi tantos comentários entusiasmados da crítica sobre os filmes exibidos que foi difícil prever quem seria o ganhador. No fim das contas, o apelo do cinema iraniano clandestino de Jafar Panahi prevaleceu. Com isso, Panahi se tornou o raro tipo de diretor que conquista os principais prêmios dos maiores festivais de cinema do mundo (antes, ele já recebeu o Leão de Ouro por Taxi Teerã/2015 no Festival de Berlim e o Leão de Ouro no Festival de Veneza por O Círculo/2000). Se muitos apontavam o novo de Joachin Trier como o favorito, ele ficou com um honrado segundo lugar com o Grande Prêmio do Júri (que este ano foi presidido por Juliette Binoche e contava ainda com nomes como Halle Berry, Alba Rohrwacher e Jeremy Strong). O representante brasileiro não levou o prêmio principal mas não fez feio, levando três prêmio importantes que selam seu passaporte no início de sua repercussão na temporada. Abaixo todos os premiados do maior Festival de Cinema no mundo... (e já podemos começar a campanha do Wagner para melhor ator no Oscar do ano que vem?):
Melhor Atriz | Nadia Melitti (The Little Sister)
Melhor Ator | Wagner Moura (O Agente Secreto)
Melhor Roteiro | "Young Mothers" de Luc e Jean-Pierre Dardenne
Câmera de Ouro | "The President's Cake" de Hasan Hadi
PL►Y: A Cura
Muitos consideram o cineasta Kiyoshi Kurosawa um mestre do terror japonês. Dirigindo desde a década de 1970, ele acumula vários títulos que são dignos de culto pelos fãs. Um deles é este intrigante A Cura, que foi lançado em uma época em que os serial killers cinematográficos estavam em alta em produções de Hollywood - e se David Fincher soube fazer a diferença com Se7en (1995), dois anos depois, Kurosawa (que não tem nenhum parentesco com o Akira Kurosawa) também soube deixar a plateia hipnotizada com o suspense de sua trama. O filme conta a busca do detetive Kenichi Takabe (Kôji Yakusho) pela relação que existe entre uma série de crimes cometidos por pessoas diferentes em circunstâncias semelhantes. No entanto, alguns elementos demonstram que os crimes possam ter uma relação entre si. Seus autores eram pessoas inofensivas que, subitamente, sem maiores explicações, assassinaram pessoas próximas. O interessante é que a trama conta esta história de uma forma diferente, ao invés de manter o foco somente no detetive, a narrativa parece um tanto dispersa no início, apresentando vários personagens e, aos poucos, nos damos conta do painel traçado como se fosse um mapa das pistas que levarão até o provável responsável pelas atrocidades. Quando ele aparece (um ótimo trabalho de Masato Hagiwara), esquecido, perdido, sem identidade, somos incapazes de dizer do que aquele jovem é capaz de fazer - mas não demora para que possamos perceber o quanto aquela figura difusa é ameaçadora. Em determinados momentos o detetive parece até mais ameaçador do que o rapaz de fala macia e conversas enigmáticas. Colocando o vilão emaranhado na mente de seus "cúmplices", o filme assume riscos que o torna ainda mais estimulante e surpreendente, deixando os caminhos do detetive tão imprevisíveis quanto os crimes cometidos. Não por acaso, o final lembraria o filme de Davi Fincher se o roteiro não se esticasse mais um pouco e apresentasse que ameaça pode estar em qualquer lugar. Vendo o filme lembrei de uma conversa sobre Longlegs/2024 em que dois alunos (que curtem muito cinema) me recomendaram este filme que não estava disponível em streaming algum (agora está fresquinho no Filmicca). Kiyoshi Kurosawa faz um filme seco e até elegante perante a atmosfera psicológica que emana desde os momentos iniciais.
A Cura (Cure/Kyua - Japão/1997) de Kiyoshi Kurosawa com Kôji Yakusho, Masato Hagiwara, Tsuyoshi Ujiki, Anna Nakagawa, Yoriko Dōguchi, Yukijirō Hotaru e Ren Osugi. ☻☻☻☻
sexta-feira, 23 de maio de 2025
4EVER: Sebastião Salgado
Sebastião Ribeiro Salgado Júnior nasceu na cidade de Aimorés em Minas Gerais. Graduou-se em Economia na Universidade do Espírito Santo, realizou mestrado na Universidade de São Paulo e doutorado na Universidade de Paris. Economista de formação, inicialmente trabalhou como secretário para a Organização Internacional do Café (OIC). Sua primeira sessão de fotos foi nos anos 1970 e o inspirou a ser fotojornalista independente. Depois de passagens por agências de fotografia renomadas, passou a ser ainda mais reconhecido por seus livros de fotojornalismo que se tornaram referências mundiais. O seu olhar crítico social fez de obras como Êxodos (sobre os movimentos migratórios) sucessos editoriais. Salgado contribuiu ao longo dos anos com causas humanitárias, trabalhando ao lado da UNICEF, ACNUR, OMS, Médicos sem Fronteiras e Anistia Internacional. Junto à esposa, Lélia Wanick, apoiaram o Instituto Terra em causas de reflorestamento. O engajamento do fotojornalista gerou o documentário O Sal da Terra (2014) dirigido pelo alemão Win Wenders que ganhou o César de Melhor Documentário e foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional.
segunda-feira, 19 de maio de 2025
PL►Y: Babygirl
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Nicole e Harris: o sexo subvertendo hierarquias. |
Ano passado houve um verdadeiro congestionamento de estrelas na disputa por uma vaga ao Oscar de melhor atriz. Alguns deles estavam no páreo do Globo de Ouro de melhor atriz em filme de drama, dentre elas, quatro ganharam os holofotes da mídia no Festival de Veneza do ano passado: Angelina Jolie, Tilda Swinton, Fernanda Torres e Nicole Kidman. Dentre elas, a premiada foi a brasileira que se tornou a única do páreo a cravar uma indicação ao Oscar na temporada. No entanto, perante o júri de Veneza foi Kidman a ser considerada a melhor interpretação feminina. Era para tanto? A atriz interpreta Romy, uma executiva poderosa de uma empresa conceituada, ela vive uma vida confortável ao lado do esposo (Antonio Banderas) e das filhas (Esther McGregor e Vaughan Reilly). Ela fica surpresa ao descobrir que foi inscrita em um programa de monitoria para estagiários. Para piorar (ou melhorar, depende...), ela se depara com Samuel (Harris Dickinson), um jovem, digamos, insolente. Não demora muito para que se instaure um jogo de sedução entre os dois, nele o rapaz subverte a estrutura de poder da empresa. Fica claro desde o início que ele ditará as regras nos encontros e nas relações sexuais estabelecidas entre eles. A parte mais curiosa do filme dirigido e escrito pela holandesa Halina Reijn é que Romy embarca naquele jogo sem paraquedas, explorando aspectos de sua sexualidade que preferiu manter em segredo até mesmo de seu marido. Conforme ela se envolve cada vez mais com o jovem amante, algumas surpresas aparecem pelo caminho. O filme sabe utilizar bem a plasticidade de Nicole para explorar o que se esconde por baixo da aparência gélida da personagem, de certa forma, mas o mesmo com a aparência "certinha" de Dickinson, que constrói um personagem imprevisível justamente por não ter o que perder. No entanto, quem espera cenas de sexo explícito irá se frustrar, já que Reijn opta por uma abordagem mais sutil da relação tórrida entre os personagens. O filme escorrega aqui e ali em vários clichês do gênero, especialmente na parte em que outros personagens começam a perceber o que acontece entre a executiva e seu estagiário. Diante disso, Nicole carrega o filme nas costas com uma personagem em constante conflito com seus desejos. Para quem conhece a filmografia da diretora Halina Reijn é inevitável não lembrar de seu primeiro longa-metragem, Instinto (2019), em que explorava a atração de uma psicóloga com um detento da penitenciária em que trabalha. Mudando as características e um tanto da posição de seus personagens em meio às relações profissionais, Babygirl soa quase como o passo seguinte à estreia da diretora. Embora seja menos impactante que seu antecessor, o resultado ainda é uma obra interessante para tempos tão conservadores.
Instinto (Países Baixos - EUA / 2025) de Halina Reijn com Nicole Kidman, Harris Dickinson, Antonio Banderas, Sophie Wilde, Esther McGregor, Victor Slezak, Leslie Silva e Robert Farrior. ☻☻☻
domingo, 18 de maio de 2025
PL►Y: Como Ganhar Milhões Antes que a Vovó Morra
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Putthipong e Usha: herança familiar. |
M (Putthipong Assaratanakul) é um jovem tailandês que acaba de deixar a faculdade e não parece interessado em nada além de videogames. No início do filme ele participa com a família do que seria uma espécie de Dia de Finados do seu país. Naquele dia, sua avó, Mengju (Usha Seamkhum) contou para a família que gostaria de ser enterrada em um grande terreno que custa uma fortuna fora de seu alcance. Ninguém imaginava que naquele mesmo dia ela seria levada ao hospital por conta de uma queda e que, apesar de não ter sofrido nada demais com o tombo, através dos exames irão descobrir que ela está com câncer em fase terminal. A família resolve manter em segredo o diagnóstico, mas M percebe ali a oportunidade de cuidar da avó e ganhar algo de uma herança iminente. O rapaz começa então sua jornada para conquistar a exigente avó para receber algo em troca. No entanto, o que era para ser um jogo de interesses, recebe outras camadas conforme os laços entre os dois voltam a se estreitar depois de tanto tempo. Na convivência com a avó, M começa a mudar seu olhar sobre a dinâmica da família e percebe outras nuances na relação entre seus tios e a avó, além da própria dinâmica entre sua mãe e a matriarca. Se a dinâmica entre avó e o neto já deixa o filme gradativamente mais interessante, a produção se torna ainda mais rica quando envolve as relações entre os outro personagens e questões sobre envelhecimento e solidão. Por conta disso, nem precisa dizer que o filme se torna cada vez mais emocionante e ainda reserva algumas surpresas ao longo da sessão. Todos estão ótimos em cena, mas o destaque mesmo fica por conta de Putthipong Assaratanakul e Usha Seamkhum na pele de neto e avó que estabelecem uma dinâmica de sensibilidade crescente entre os personagens, da primeira até a última cena. Embora seja dirigido pelo estreante Pat Boonnitipat (que sabe o momento exato de utilizar momentos melodramáticos na trama), o filme demonstra bastante equilíbrio em conciliar drama com um tempero cômico ao longo da narrativa. Em cartaz na Netflix, o filme se tornou o longa tailandês de maior bilheteria mundial e foi selecionado pelo país para concorrer à uma vaga na última edição do Oscar na categoria de Filme Internacional, chegando à avançar nas pré-listas, mas ficou de fora dos cinco escolhidos.
Como Ganhar Milhões Antes que a Vovó Morra (Lahn Mah / Tailândia - 2024) de Pat Boonnitipat com Putthipong Assaratanakul, Usha Seamkhum, Sanya Kunakorn, Pongsatorn Jongwilas, Jear Sarinrat Thomas, Tontawan Tantivejakul e Duangporn Oapirat. ☻☻☻☻
KLÁSSIQO: Onde Fica a Casa do Meu Amigo?
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Babak: um clássico do cinema iraniano. |
Pode se dizer que Onde Fica a Casa do Meu Amigo de Abbas Kiarostami desencadeou uma onda de interesse pelos filmes iranianos. Nos anos seguintes vários filmes feitos no país receberam destaque mundial e seu tornaram cults com suas histórias singelas e realistas executadas para abordar temáticas amplas sobre aquele país. É a ideia do micro, falando do macro. Durante todo o longa o que vemos é a inocência e a amizade de duas crianças em confronto com o mundo dos adultos em suas asperezas. É assim que acompanhamos a jornada de Ahmed (Babak Ahmadpoor), um menino que desde a primeira cena sofre ao ver o amigo levar uma bronca do severo professor por não ter usado o caderno para fazer a lição. Kiarostami parece nos colocar no meio da agitação daquela sala de aula e nos deixa aflitos diante da situação, compartilhamos assim a mesma indignação do pequeno protagonista naquele contato com aquela personificação da autoridade e da disciplina. Acontece que na saída da escola naquele dia, Ahmed leva o caderno do amigo para casa por engano e ficara angustiado para entregá-lo. Se a mãe considera que aquela história é só uma desculpa pra os dois brincarem o dia todo, o garoto irá partir em uma verdadeira odisseia para encontrar a casa do amigo e entregar o caderno a tempo dele fazer a lição para o dia seguinte. A cada pessoa que o menino encontra, a cada situação que enfrenta, o que vemos é uma espécie de um denso encontro de gerações. O filme segue carregado da tensão de Ahmed (valorizada ainda mais pelos olhos reluzentes do menino que o interpreta) e a certa altura ficamos aflitos não apenas sobre a entrega do bendito caderno, mas também sobre seu paradeiro e seu retorno para a casa. A ideia de construir uma espécie de suspense a partir dos dramas de seus personagens se tornou uma marca do cinema iraniano e um dos motivos para se tornar tão envolvente, mesmo que os acontecimentos aqui soem dispersos, a tensão permanece até o fim. Teóricos e críticos de cinemas consideraram esta a primeira parte de uma trilogia na cinematografia de Kiarostami, que ficou conhecida como Trilogia Koker (o nome do vilarejo em que a trama acontece). No filme seguinte (E A Vida Continua/1992) vemos a busca dos meninos protagonistas de Onde Fica a Casa do Meu Amigo sob o receio de terem falecido no terremoto que aconteceu em 1990 que vitimou 50.000 pessoas ao norte do Irã e Através das Oliveiras retoma uma cena do segundo filme para construir uma narrativa em destaque. Kiarostami se tornou um os diretores mais importantes do cinema desde então.
Onde Fica a Casa do Meu Amigo (Khane-ye doust kodjast? / Irã - 1987) de Abas Kiarostami com Babak Ahmadpour, Ahmed Amadpour, Iran Outari, Khodabaksh Defai, Ayat Ansari e Teba Soleimani. ☻☻☻☻
quinta-feira, 8 de maio de 2025
PL►Y: Sex (Love Dreams)
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Jan Gunnar Røise: relacionamento em conflito. |
Avdelingsleder (Thorbjørn Harr) é o chefe de Feier (Jan Gunnar Røise) no trabalho de limpeza de chaminés. Entre um trabalho e outro os dois começam a conversar sobre um sonho que deixou Avde intrigado. Ele sonhou que David Bowie o observava como se apreciasse uma mulher. Ainda que fosse um sonho, a sensação vivenciada por ele foi muito real e o deixou pensativo. Ele não imaginava que após relatar o sonho, o colega iria lhe confidenciar que transou com um homem pela primeira vez no dia anterior. Vale ressaltar que ambos se consideram heterossexuais, são casados com mulheres e possuem filhos numa estrutura familiar bastante convencional e sem maiores conflitos, pelo menos até aquele momento. Feier conta com bastante naturalidade sobre o ocorrido, da mesma forma que contou para a esposa sobre a experiência e acreditou estar tudo bem, afinal, para ele traição seria manter um relacionamento afetivo com alguém fora do casamento, o que não é o caso. Porém, Feier não imaginava que sua esposa, Lege (Anne Marie Ottersen), começaria a questionar um casamento que aparentava total estabilidade. O primeiro filme da trilogia Sex Love Dreams de Dag Johan Haugerud já demonstra que o diretor quer fazer a plateia embarcar em uma reflexão sobre os temas que dão título aos filmes do projeto. Não quer apontar respostas, dizer quem está certo ou errado, mas fazer a cabeça do espectador fermentar perante as ações dos personagens. Ao longo do filme Feier, que parecia tão confiante com sua primeira experiência sexual com outro homem, começa a perceber como isso afeta seu relacionamento com a esposa - além disso, um certo temor começa a se instaurar sobre a percepção que as pessoas possuem dele. Embora ele repita o tempo inteiro que não é gay (da mesma forma que ressalta que beber cerveja não o torna um alcoólico) suas interações com a esposa se tornam cada vez mais difíceis em conversas sobre ciúme, desejo e fidelidade. O ator Jan Gunnar consegue dar conta do personagem em conflito por um viés inusitado, seu rosto de certinho, sua expressão sempre acanhada e uma certa ausência de sex appeal nos desperta uma sensação diferente ao tentar julgá-lo e por vezes gera risos nervosos, como naquele momento em que a esposa pede para que conte (em detalhes) como foi fazer sexo com outro homem. Aos poucos a dinâmica entre os dois se torna uma tortura psicológica, ela cada vez mais cortante e ele cada vez mais esquivo, dando a impressão que somente a demonstração de alguma culpa (algo que ele não apresenta no início) será capaz de amenizar a tensão instaurada. Fosse só a trama de Feier em crise o filme já seria interessante, mas o texto escorrega ao ter de lidar com os sonhos do outro homem da trama. Sem saber muito para onde ir com Avdelingsleder (que nome difícil para um personagem), o que poderia ser uma discussão interessante sobre gênero e religiosidade (este um tema que rende um dos diálogos mais inusitados do filme) fica pelo meio o caminho. Duas curiosidades sobre o filme: ele não possui cenas de sexo e conta com uma pequena participação de Bjorn (Lars Jacob Holm), que recebe mais destaque em Love, o segundo filme da trilogia. O fato é que o longa me deixou ainda mais curioso para ver a terceira parte da trilogia, Dreams, que ainda não tem previsão de estreia por aqui.
Sex (Sex / Noruega - 2024) de Dag Johan Haugerud com Thorbjørn Harr, Jan Gunnar Røise, Siri Forberg, Anne Marie Ottersen e Birgitte Larsen. ☻☻☻☻
NaTela: Thunderbolts*
Na Tela: Homem dom H
Quando soube que estavam produzindo uma cinebiografia sobre Ney Matogrosso eu fiquei um tanto receoso, já que todo mundo já deve estar cansado daquelas biografias protocolares sem sal de colagem de fatos soltos sobre a vida de um artista conhecido, mas que não carrega nada da identidade do retratado. Poucos filmes se salvam da seara do gênero, se pegarmos os filmes brasileiros, basta ver o bom resultado de Dois Filhos de Francisco (2005) em contraposição com a decepcionante Meu Nome é Gal (2018). Vale ressaltar que não estou discutindo gosto musical por aqui, mas estou falando de cinema e sua capacidade de contar histórias bem construídas em uma narrativa envolvente. Eu comecei a ficar animado com Homem com H por conta do projeto ser idealizado por Esmir Filho, um cineasta para prestarmos atenção desde sua estreia com o atmosférico Os Famosos e os Duendes da Morte (2009), depois eu soube que escalaram Jesuíta Barbosa para viver o artista na telona, mas fiquei preocupado, já que sempre percebi Jesuíta um ótimo ator para viver personagens contidos que vivem seus conflitos de forma mais internalizada, não consegui nem imaginar o ator pernambucano convencendo no palco com os Secos e Molhados, por exemplo. Sorte que o rapaz realizou uma preparação física poderosa e está perfeito como Ney Matogrosso, encarnando sua pessoa discreta fora dos palcos e aquela persona mítica dos palcos (tanto que em algumas cenas eu fiquei pensando se eram cenas de arquivo ou com o ator). Melhor ainda constatar que Esmir Filho emoldura a performance arrebatadora do seu protagonista com uma produção de respeito. Pra começar, ele não se esquiva de abordar a sexualidade de seu biografado, seja nos palcos ou fora dele, o filme transborda uma energia sexual para lá de envolvente, seja pelos movimentos no palco, a vida de Ney com seus parceiros ou com o uso das letras para emular sentidos que por vezes até esquecemos por julgar que as conhecemos tão bem. Particularmente adorei a parte dedicada à música que dá nome ao filme, confesso que fiquei hipnotizado com a montagem desta parte - vale ressaltar que a edição é perfeita em sua alternância de ritmo sem perder a fluência entre as cenas mais dramáticas e, digamos, as mais... eufóricas. O longa usa sucessão de episódios importantes sobre a vida do cantor par subverter a própria fórmula, ele nunca perde o seu fio condutor amparado pela relação de Ney com a arte, a construção de sua identidade artística intensa e sua personalidade serena, além do espectro do tempestuoso relacionamento com o pai (vivido por Rômulo Braga). O cuidado de Esmir Filho em suas escolhas para tecer a trajetória de Ney na telona é de um cuidado minucioso, construindo um arco emocional que não se rompe ao longo de duas horas e envolve o espectador com um personagem transgressor, instigante e necessário para os tempos caretas que atravessamos. Ao final do filme, Ney (que participou ativamente das filmagens) surge radiante com seus 83 anos e nos faz pensar no conceito de imortalidade não apenas de sua voz única. Para os fãs (como eu) é um verdadeiro deleite, para quem não é, torna-se apenas obrigatório.
Homem com H (Brasil / 2025) de Esmir Filho com Jesuíta Barbosa, Rômulo Braga, Hermila Guedes, Bela Leindecker, Jeff Lyrio, Bruno Montaleone, Mauro Soares, Jullio Reis e Ney Matogrosso. ☻☻☻☻
quarta-feira, 7 de maio de 2025
4EVER: James Foley
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28 de dezembro de 1953 ✰ 06 de maio de 2025 |
James Foley nasceu no Brooklyn em Nova York. Filho de um advogado, James se formou em psicologia, mas ao iniciar seus trabalhos na profissão, decidiu fazer filmes e foi estudar na Universidade da California. Em 1984 estreou na direção com Jovens Sem Rumo estrelado por Aidan Quinn e Daryl Hannah, dois anos depois seu filme Caminhos Violentos, estrelado por Sean Penn. O longa foi selecionado para o Festival de Berlim, mas ficou mais conhecido pela inclusão do hit Live to Tell de Madonna na trilha sonora. Foley ficou famoso por seus vários trabalhos com a artista, com quem fez clipes (ao todo foram seis), shows e um filme (um clássico da Sessão da Tarde: Quem é Essa Garota? de 1987). Embora nunca tenha sido levado muito a sério como cineasta, Foley rendeu uma indicação ao Oscar para Al Pacino por O Sucesso A Qualquer Preço (1993), foi responsável por um dos primeiros papéis de destaque de Reese Whiterspoon e Mark Wahlberg (em Medo/1996), além de ter trabalhado com Gene Hackman (O Segredo/1996) e Halle Berry (A Estranha Perfeita/2007). Foley também dirigiu episódios para séries famosas como Twin Peaks, Hannibal, House of Cards e Billions. Seus últimos trabalhos no cinema foram os sucessos bregas de 50 Tons Mais Escuros (2017) e 50 Tons de Liberdade (2018). O diretor faleceu em decorrência de um tumor cerebral.
domingo, 4 de maio de 2025
PL►Y: Love (Sex Dreams)
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Andrea e Thomas: coisas do amor no século XXI. |
PL►Y: Um Homem Diferente
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Adam e Sebastian: a aparência em crise de identidade. |
Edward (Sebastian Stan) é um ator com neurofibromatose e, por conta dos inúmeros tumores benignos que desenvolve, sua aparência tornar-se bastante peculiar. Existe uma grande frustração em Edward já que tudo ao seu redor é pautado pela forma com que as pessoas reagem à sua condição. Dos trabalhos para os quais é escolhido à forma como as pessoas interagem com ele, tudo é vivenciado com bastante desconforto. Até quando ele começa a se aproximar da vizinha Ingrid (Renate Reinsvie), a aparência se torna um impeditivo para qualquer investimento que o relacionamento avance para algo maior. Na esperança de haver alguma mudança em sua vida, Edward aceita participar de um tratamento experimental para a doença em questão. Edward sempre imagina que na pesquisa ele ficou com o grupo de controle que tomará os placebos, mas se surpreende quando percebe que seu rosto está se deteriorando até que... um novo rosto surja abaixo do antigo. Animado com as possibilidades de sua nova aparência, Ed assume uma nova identidade, mas a coisa desanda quando reencontra Ingrid em seu novo projeto e existe a estranha sensação que a ruptura com sua antiga vida lhe causou danos nunca imaginados. Muito do interesse que nutri pelo filme, surgiu da forma como me esquivei de saber maiores informações sobre a trama e me surpreendi bastante com os rumos que o diretor e roteirista Aaron Schimberg escolheu para construir a história. Misturando um tanto de metalinguagem e crise de identidade, o filme mergulha cada vez mais nos conflitos do protagonista que perdeu de si mesmo no meio do caminho. Neste processo, seu contato com o confiante Oswald (Adam Pearson, um ator que realmente possui neurofibromatose) tornará sua nova vida ainda mais complicada. Sebastian Stan está ótimo no papel principal, com ou sem a maquiagem pesada (indicada ao Oscar) ou a máscara que usa em algumas cenas, a forma como atua com seus gestos, voz e posturas deixam claro o quanto seu personagem está passando por uma crise de identidade fortíssima. Seu prêmio de atuação no Festival de Berlim foi merecido, assim como o Globo de Ouro de ator de comédia ou musical (curiosamente, a categoria feminina ficou com Demi Moore por A Substância que encontra semelhanças com este outro aqui em sua abordagem da destruição do selfie). Este é o tipo de filme que ao terminar eu fico imaginando de onde o seu criador conseguiu tamanha inspiração. Ajuda a entender o fato de que Schimberg nasceu com lábio leporino e, assim como visto em seu filme anterior (Acorrentado para a Vida/2018 também estrelado por Adam Pearson) curte explorar temáticas sobre, digamos, aparências diferentes. Misturando humor negro, psicologia, drama e um tantinho de body horror, Um Homem Diferente merece uma vaga na lista de meus favoritos do ano.
Um Homem Diferente (A Different Man / EUA - 2024) de Adam Schimberg com Sebastian Stan, REnate Reinsvie, Adam Pearson, C. Mason Wells, Owen Kline, Charlie Korsmo, Patrick Wang e Michael Shannon. ☻☻☻☻
sábado, 3 de maio de 2025
Pódio: Lady Gaga
quinta-feira, 1 de maio de 2025
4EVER: Nana Caymmi
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29 de abril de 1941 ✰ 1º de maio de 2025 |
Nascida na cidade do Rio de Janeiro, o talento musical de Dinahir Tostes Caymmi começou cedo. Filha do compositor, cantor e músico Dorival Caymmi e da cantora Stella Maris, Nana começou sua carreira artística nos anos 1960 quando gravou a faixa Acalanto ao lado do pai, a canção tem um significado ainda mais especial já que foi composta para ninar a cantora quando ainda era criança. Seu primeiro LP foi lançado em 1963. Em 1966 participou do I Festival Nacional da Canção e desde então o tom solene de sua voz grave se tornou sinônimo de um dos maiores talentos da música brasileira. Seus álbuns, parcerias e espetáculos fizeram história. Canções como "Só Louco", "Não se esqueça de Mim", "Suave Veneno" e o enorme sucesso de "Resposta ao Tempo" se mostraram atemporais. Ao longo da carreira Nana lançou 68 álbuns e se consagrou como um dos grandes nomes da MPB. A artista faleceu em decorrência de disfunção de múltiplos órgãos após um longo período de internação.