sábado, 8 de dezembro de 2012

KLÁSSIQO: Psicose (ou Hitchcock x Gus Van Sant)

Perkins: o original é muito melhor. 

Até hoje eu não consigo entender o que passou na cabeça de Gus Van Sant para refilmar o clássico Psicose de Alfred Hitchcock, na época a justificativa era que o público mais jovem não assistiam ao filme porque era em preto e branco. Francamente, seria muito melhor educar o público a perceber que o preto e branco não desmerece em nada uma produção, muito pelo contrário, pode até favorecer a criação de climas e atmosferas que o diretor almeja alcançar. Todo mundo sabia que o filme de Van Sant seria pior que o original, mas fingiram que não estavam nem aí, a coisa começou a ficar ainda mais desengonçada quando o marketing se sustentava em argumentações como ter seguido o cronograma de filmagem original, ter mantido os diálogos e planos... ou seja, tratava-se de uma cópia, ou pelo menos, ambicionava ser - de bom só o trailer com um sugestivo chuveiro jorrando água. Não vou perder meu tempo desmerecendo ou exaltando a arte de copiar um mestre, mas posso dizer que não vejo sentido em refazer um filme que já cumpria o seu papel de forma excepcional. A atenção pela obra de Hitchcock deve aumentar ainda mais nos próximos meses com a chegada aos cinemas de um longa metragem baseado na produção de Psycho, Anthony Hopkins encarna o cineasta e Scarlett Johansson vive Janet Leigh - que sentem na pele os conflitos desta produção baseada na obra de Robert Bloch (dizem que Hitchcock comprou todos os exemplares para que ninguém comprasse o livro e descobrisse o final surpreendente). Era 1960 quando Psicose original estreou com a história de Marion Crane (Janet Leigh, mãe de Jamie Lee Curtis), secretária que dá o desfalque de 40 mil dólares na imobiliária em que trabalha e foge por uma autoestrada e acaba encontrando o Hotel Bates onde é atendida pelo, aparentemente inofensivo, Norman Bates (Anthony Perkins em antológica atuação - e engraçado como me lembrou Andrew Garfield!). No início Norman é todo atencioso contando história de como é viver sozinho naquele hotel com a mãe autoritária e castradora, mas basta um comentário de Marion sobre sua mãe para que ele comece a demonstrar ser mais esquisito do que pensavamos. Vale lembrar que o filme tem três atos bem marcados - a vida de Marion na cidade antes da fuga, a temporada no hotel e a investigação sobre o desaparecimento dela -, todos magnificamente conduzidos por Hitchcock numa narrativa modernosa que qualquer um percebe ser difícil de reproduzir. O trabalho de Perkins e Leigh são tão precisos que junto à trilha sonora inesquecível o resultado só poderia ser um grande sucesso de bilheteria (o filme custou 800 mil e rendeu 50 milhões ao redor do mundo), além disso, Hitchcock sempre opta por planos em que a estranheza se instale na mente do espectador (como a própria abertura onde linhas se friccionam aparentando uma anomalia aqui ou ali). Por investir no horror sem perder de vista como funciona a mente de um psicopata, Psicose se tornou um dos filmes mais cultuados de Hitchcock.  O filme recebeu quatro indicações ao Oscar: atriz coadjuvante (Leigh - que ganhou o Globo de Ouro na categoria), fotografia, direção de arte e diretor. O trabalho foi tão arrepiante que mais de vinte anos depois rendeu três sequências (que não chegam aos pés deste aqui) e o que dizer de sua presunçosa refilmagem? Gus Van Sant se achou tão poderoso depois que foi indicado ao Oscar com o superestimado Gênio Indomável (1997) que achou que poderia fazer qualquer coisa. Juntou um grupo de atores do cinema indie americano e brincou de Psycho! Apesar de seguir algumas características do original, Vince Vaughn (que na época ainda queria ser levado a sério) encarnava Bates com mais cara de drogado do que psicótico e Anne Heche construiu uma Marion Crane mais frágil e claudicante. A verdade é que nada fazia muito sentido, desperdiçando as as atuações de Julianne Moore (como a irmã de Marion e que todo mundo disse ser lésbica nesta versão), Viggo Mortensem (como o amante de Marion, Sam) e William H. Macy (o detetive encarregado do desaparecimento de Marion). O filme soa arrastado e sem clima (quem conhece o cinema de Van Sant sabe que ele está para Hitchcock como Roberta Sá está para Madonna) e a fotografia (ironicamente) é berrante demais. Mais caro e menos assustador, a refilmagem de Psicose foi um dos maiores abacaxis que Hollywood ousou fazer, bem feitinho, mas oco até a alma. Moral da história: ninguém refilma um clássico impunemente. 

Vaughn: mais drogado do que que psicótico. 

Psicose (Psycho/EUA-1960) de Alfred Hitchcock com Anthony Perkins, Janet Leigh, John Gavin e Vera Miles. ☻☻☻☻

Psicose (Psycho/EUA-1998) de Gus Van Sant com Vince Vaughn, Anne Heche, Viggo Mortensen, Julianne More e William H. Macy.

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