terça-feira, 31 de maio de 2016

HIGH FI✌E: MAIO

Cinco filmes assistidos em maio que merecem destaque::

As Bruxas de Salém (1996) de Nicholas Hytner ☻☻☻☻


Ave, César! (2016) de Joel & Ethan Coen ☻☻☻☻


Capitão América: Guerra Civil (2016) de Joe & Anthony Russo ☻☻☻☻


Para Minha Amada Morta (2016) de Aly Muritiba ☻☻☻☻


Truman (2015) de Cesc Gay ☻☻☻☻

segunda-feira, 30 de maio de 2016

N@ CAPA: "O Grande Lebowski" por Joe Forkan

Na Capa: a arte segundo Lebowski. 

A capa do blog no mês de maio foi uma pequena homenagem para O Grande Lebowski (1998), filme de Joel & Ethan Coen que inspirou uma série de telas pintadas pelo artista plástico Joe Forkan com referência nas obras de Carvaggio, Velázquez e outros artistas clássicos.  Forkan se formou em Artes pela Univerisdade do Arizona em 1989 e em 2002 concluiu seu mestrado em Pintura pela Universidade de Delaware, desde então ele é professor de Arte pela Universidade de Fullerton no estado da Califórnia. Você pode conhecer mais sobre ele visitando o site do artista












Na Tela: Amor Por Direito

Page e Moore: direitos civis resolvidos no tribunal. 

A história que gerou Amor Por Direito já foi premiada com o Oscar quando deu origem ao documentário em curta-metragem dirigido por Cynthia Wade em 2007 chamado Freeheld, assim como este longa dirigido por Peter Sollett - e reforça algo que já comentei antes aqui no blog, que muitos diretores estão buscando inspiração em documentários premiados para desenvolver seus projetos com atores. Julianne Moore vive Laurel Hester, policial exemplar que mantém sua vida sexual às escondidas até que conhece a jovem Stacie Andree (Ellen Page). Ainda que tenham algumas diferenças, as duas se apaixonam, compram uma casa e passam a morar juntas, ainda que Laurel ainda encontre dificuldades de assumir a relação perante seus colegas de trabalho - sobretudo para o parceiro e amigo que parece ter uma queda por Laurel, Dane Wells (o bom Michael Shannon). Mesmo temendo o preconceito, Laurel e Stacie farão um registro de união estável, que garantirá a elas alguns direitos diante da não legalização do casamento gay. As coisas complicam quando Laurel descobre que está com câncer no pulmão e começará a sua cruzada para deixar a casa e sua pensão para a parceira. Neste momento os preconceitos misturados aos interesses políticos se sobrepõem à justiça e caso chama a atenção da mídia de de militantes da causa gay. A história é tão interessante e bem vinda que nem precisava de um bom diretor para chamar a atenção, mas Peter Sollett relaxa demais e faz um filme no piloto automático, diminuindo a força do que tem em mãos. Além disso, comete alguns tropeços (eu considerei um grande erro colocar o comediante Steve Carrell para ser um rabino defensor do casamento gay, já que nem sempre sua postura cômica funciona diante de algo tão sério e polêmico). Sorte que Julianne More é uma grande atriz (e não há dúvidas sobre isso) e defende Laurel com garra, mas Ellen Page faz mais do mesmo alcançando um resultado apenas eficiente (vale ressaltar que foi na época em que trabalhava no filme que a atriz assumiu que era lésbica), curiosamente achei que Michael Shannon é quem chama mais atenção ao viver o sujeito hétero que percebe a importância de lutar pelos direitos iguais para sua colega de trabalho. Apesar do tema polêmico, Amor Por Direito é um filme simples (filmado como um filme para TV dos anos 1980) e profundamente humanista, que denota como os direitos humanos acabam ficando fora de manobras políticas. O filme merece ser visto para relembrar como o preconceito é uma das coisas mais absurdas já inventadas pelo homem (e cresce feito erva daninha em pleno século XXI). 

Amor por Direito (Freeheld / EUA-2015) de Peter Sollett com Julianne Moore, Ellen Page, Michael Shannon, Steve Carell, William Sadler e Josh Charles. ☻☻☻ 

sábado, 28 de maio de 2016

Na Tela: A Vingança está na Moda

Winslet: levando um pouco de glamour ao interior australiano. 

O cinema australiano sempre teve um humor bastante peculiar e foi nos anos 1990 que ele ganhou o mundo com vários sucessos de bilheteria. Da breguice de Vem Dançar Comigo (1992), passando pelas drag-queens de Priscilla - A Rainha do Deserto (1994) à busca pela auto-estima de O Casamento de Muriel (1994), o cinema da terra dos cangurus sempre fez comédia distante do convencional hollywoodiano. Quem lembrar disso não deverá estranhar A Vingança está na Moda, novo filme da diretora Jocelyn Moorhouse (de A Prova/1991) estrelado por Kate Winslet. Há quem veja ecos do livro  Tieta do Agreste de Jorge Amado nesta adaptação da obra de Rosalie Ham, já que ambos tem protagonistas que voltam para sua terra natal em busca de vingança décadas depois de sofrerem com a expulsão da cidade. Myrtle Dunnage (Winslet) teve que sair da cidade quando era criança por ser acusada de um crime que ela nem lembra como aconteceu. Ela conta com a ajuda da mãe baratinada Molly Dunnage (um envelhecida Judy Davis) e do "alegre" sargento Farrat (Hugo Weaving) para juntar as peças do passado e tentar compreender o que estava por trás de sua saída da cidadezinha. Enquanto esteve fora, Myrtle trabalhou com moda na França e passa a utilizar o glamour para chamar atenção das moradoras locais. Uma das ideias mais bem sacadas do filme são os figurinos exuberantes criados por Marion Boyce e Margot Wilson para as personagens femininas que vivem no meio do campo. Vestidas como verdadeiras divas, elas conferem uma diversão a parte na história em cenas que beiram o surreal. Além de construir os vestidos para as moradoras, ela ainda se envolve com um amigo de infância, Teddy (Liam Hemsworth), com quem prevê até um final feliz. No entanto, nem tudo são flores na vida de Myrtle, existe uma pequena conspiração na cidadezinha para que ela continue sendo excluída e aos poucos conhecemos os motivos para isso. Moorhouse cria um filme que não se prende a um gênero, existe humor, drama, romance, suspense e toques cavalares de humor negro (principalmente depois que a protagonista lembra do tal crime que cometeu e uma onda de mortes chega à localidade). Essa mistura pode parecer indigesta para os desavisados, mas a direção consegue transitar entre eles com uma leveza surpreendente. Para quem curte o cinema australiano A Vingança está na Moda é irresistível, seja por vermos Winslet posando de diva, rever Weaving reviver a alma drag de Priscilla ou matar a saudade da sempre interessante Judy Davis - que filma cada vez menos. Não é para todos os gostos, mas é divertido se você entrar no clima. O filme ganhou vários prêmios da crítica e do Australian Film Instintute (o Oscar australiano) com seu jeito, digamos, peculiar. 

A Vingança está na Moda (The Dressmaker/Austrália-2015) de Jocelyn Moorhouse com Kate Winslet, Liam Hemsworth, Judy Davis, Hugo Weaving, Sarah Snook, Kerry Fox e Jordan Mifsud. ☻☻☻

sexta-feira, 27 de maio de 2016

PL►Y: Cinco Graças

Cinco irmãs: a repressão na cultura turca. 

O representante da França no Oscar de Filme Estrangeiro de 2016 despertou estranhamento por ser ambientado na Turquia, contar com atores turcos e... ser totalmente falado em turco. O fato é que os franceses caíram de amores por essa co-produção com a Turquia, Alemanha e Qatar que foi exibido no Festival de Cannes e começou uma bela carreira em festivais e premiações. O filme conta uma história de repressão feminina na Turquia nos dias de hoje, onde algumas famílias insistem em manter uma educação rígida e ultra-tradicional às garotas, o que muitas vezes gera situações trágicas. A história foca numa família onde cinco irmãs são criadas pela avó (Nihal G. Kodas) e pelo tio rigoroso (Ayberk Pekcan). No início elas são alegres e esperançosas, mas depois de uma fofoca na vizinhança, começam a ser submetidas à uma educação cada vez mais rígida e voltada para o casamento - ao ponto de se tornarem praticamente prisioneiras dentro da própria casa. Tamanha rigidez influi na colocação de grades pela casa, inibição de qualquer forma de diversão, armação de casamentos e algumas desventuras que se tornam cada vez mais graves. Deniz Gamze Ergüven realiza um filme seco, sem uso de trilha sonora, ou maior detalhamento dos personagens, de forma que as cinco irmãs são apresentadas como um grupo de adolescentes irmãs e suas reações enquanto são tolhidas. Com exceção da caçula Lale (Günes Sensoy), que narra a história, as outras personagens tem os traços mais marcantes revelados quando o inevitável casamento se aproxima. São nesses momentos que descobrimos um pouco mais sobre Dur (Doga Zeynep Doguslu), Selma (Tugba Sunguroglu), Ece (Elit Scan) e Sonay (Ilayda Akdogan) e uma prévia do que o futuro lhes reserva. O filme me lembrou a história de As Virgens Suicidas (1999), famoso filme de estreia de Sofia Coppola, mas Deniz Gamze Ergüven não tem o menor interesse em fazer seu filme ter um apelo popular. Com cenas cotidianas que parecem improvisadas, alguns momentos cômicos e outros intensamente dramáticos, Cinco Graças aborda um tema interessante mas sua narrativa não impressiona. 

Cinco Graças (Mustang/Turquia - Alemanha - Qatar - França/2015) de Deniz Gamze Ergüven com Günes Sensoy, Nihal G. Kodas, Günes Sensoy, Doga Zeynep Doguslu, Tugba Sunguroglu, Elit Scan, Ilayda Akdogan. ☻☻☻

quinta-feira, 26 de maio de 2016

Na Tela: Memórias Secretas

Landau e Plummer: lembrando o holocausto. 

Atom Egoyan foi um dos diretores independentes mais celebrados dos anos 1990.  Com o celebrado Exótica (1994), seguido pelas indicações ao Oscar de roteiro e direção por O Doce Amanhã (1997) e as críticas positivas recebidas por O Fio da Inocência (1999), o egípcio naturalizado canadense se tornou um diretor em que os cinéfilos sempre ficam atentos. Com a chegada do século XXI, o cinema de Egoyan tornou-se um tanto irregular. Ainda que os críticos fiquem atentos aos seus lançamentos - e os festivais sempre dediquem espaço aos seus projetos, sua carreira perdeu voltagem. Porém, seu recente Memórias Secretas ressalta que o diretor ainda tem muito a dizer. Embora tenha sido recebido com indiferença pela plateia do Festival de Veneza no ano passado, o roteiro do estreante Benjamin August toca num assunto que merece ser lembrado: a memória do holocausto. Pode parecer exagero, mas diante de tantos discursos de ódio presentes na internet e em palanques políticos, penso que a humanidade precisa ser lembrada das atrocidades que é capaz de cometer. Num mundo carente de conhecimento sobre direitos humanos (onde estes se chocam com pontos de vistas subjetivos, preconceitos e um bocado de ignorância), August e Egoyan repetem o tempo todo que, em breve, as pessoas que testemunharam os horrores da Segunda Guerra Mundial terão partido, mas suas lembranças precisam ser preservadas para que a humanidade não caia nas mesmas armadilhas do passado. Talvez o caminho pelos dois para contar esse alerta não seja o melhor, mas, ainda assim, merece atenção. Li algumas críticas ao filme por ele não ter embasamento em uma história real, mas pelo que eu saiba, trata-se de um filme de ficção e isso é o que menos importa. O filme conta a história de Zev Guttman (Christopher Plummer), um senhor senil que sofre os efeitos do tempo em sua memória. Morando em um asilo, ele se recupera da perda recente de sua esposa e conta com o amigo Max Rosenbaum (Martin Landau) para lembrar do que não consegue mais. Ambos são sobreviventes do campo de concentração de Auschwitz e, após anos trabalhando na procura de nazistas fugitivos da justiça, Max conta com Zev para encontrar o oficial nazista que exterminou as famílias de ambos - e que assumiu uma identidade falsa para se esconder. Zev foge do asilo e parte em busca do oficial com uma carta de Max no bolso (que servirá para ele lembrar do seu objetivo) e a história será construída a partir do encontro do protagonista com outros personagens e suas lembranças, até o desfecho "surpreendente". Os encontros de Zev são sempre reveladores (alguns assustadores) e demonstram como Egoyan está atento aos detalhes, mesmo diante de uma construção narrativa bastante tradicional. Seja na escalação dos atores, no cão que não para de latir ou na menina que lê a carta cheia de atrocidades com voz inocente, Egoyan ainda demonstra ter fôlego para reencontrar seu valor no cinema atual. Particularmente, a guinada final está longe de ser essencial para a história, mas pode ser vista como uma lembrança de que o mal está dentro de cada um de nós. Memórias Secretas merece ser visto não como uma história de vingança, mas por tudo que se esconde em suas entrelinhas. 

Memórias Secretas (Remember/Canadá-Alemanha/2015) de Atom Egoyan com Christopher Plummer, Martin Landau, Henry Czerny, Bruno Ganz e Jürgen Prochnow. ☻☻☻ 

quarta-feira, 25 de maio de 2016

Pódio: Tom Cruise

Devo dizer que não tenho problema algum com Tom Cruise. Sempre acho que pegam no pé dele por motivos óbvios, não me interessa informações sobre sua vida sexual, sua escolha religiosa ou a fama alcançada com os tropeços de sua vida social. Tom Cruise é um ator e o que vale é o que ele faz com um roteiro diante de uma câmera. Ponto. Dito isso, destaco nesse pódio os meus três momentos favoritos daquele que já foi o menino de ouro de Hollywood!


Bronze: o veterano de guerra.
03 Nascido em 04 de Julho (1989)
Embora não seja grande admirador do filme de Oliver Stone, respeito bastante a atuação de Cruise como o veterano Ron Kovic, que foi para a Guerra do Vietnã e voltou paraplégico para os EUA. Ao voltar, sente-se traído pelo país que sonhava defender e torna-se um ativista contra a guerra e a favor dos direitos humanos. Aos 27 anos, Cruise desenvolve as diversas fases de Kovic diante das câmeras, passando dos ideais de um jovem patriota à desilusão provocada pela nova realidade. A atuação lhe valeu a primeira indicação ao Oscar de sua carreira. 

Prata: o vampiro cult. 
Muita gente estranhou quando o diretor Neil Jordan escolheu Cruise para viver o cultuado vampiro Lestat dos livros da Anne Rice (a própria autora não concordava com a escolha). Quando o filme estreou, tornou-se um sucesso - em parte por mostrar o ator em um personagem totalmente diferente dos moços destemidos que encarnava. Lestat é um misto de predador e sedutor, pincele sua sexualidade com tintas de homoerotismo (ao lado de Brad Pitt - que Cruise odeia até hoje) e você terá uma das atuações mais ousadas de um galã do cinema. Pena que o Oscar não reconheceu a ousadia, indicando o filme somente nas categorias de trilha sonora e direção de arte. 

Ouro: o misógino magoado. 
01 Magnólia (1999)
Cruise sempre esteve disposto a trabalhar com diretores consagrados (trabalhou com Scorsese, Spielberg, Coppola, DePalma...), mas também fica atento aos novos talentos que podem lhe render atuações memoráveis. Foi assim que trabalhou com Paul Thomas Anderson neste que muitos consideram o seu melhor trabalho. Em meio aos vários personagens do filme, Tom vive um palestrante misógino que guarda uma grande mágoa familiar. Seu encontro com o pai, rende um dos momentos mais arrepiantes do filme (e mais ainda se você souber das semelhanças com a vida real do astro). O estranho Frank Mackey lhe valeu o Globo de Ouro de coadjuvante e uma valiosa indicação ao Oscar da categoria (e perdeu por pouco para Michael Caine). 

PL►Y: Missão Impossível: Nação Secreta

Cruise: desejo de popularidade depois dos 50. 

Lembro que assisti ao primeiro filme da franquia Missão: Impossível no cinema. Era 1996 (Oh, Meu DEUSSS!!! Vinte anos se passaram desde que eu estava no Ensino Médio, ou melhor, Segundo Grau... saudades daquele tempo...), os filmes inspirados em séries de TV estavam no auge! Curiosamente, somente Mission: Impossible continua gerando filmes de bilheterias milionárias até hoje - e o mais importante em época de reboots e remakes: mantendo o mesmo astro no alto dos créditos. Embora ainda seja um dos rostos mais conhecidos de Hollywood, muita coisa mudou de lá para cá na vida e na carreira de Tom. Se na década de 1990 ele obteve duas indicações ao Oscar, na década seguinte ele teve que lidar com o fim do seu casamento com Nicole Kidman, o início do relacionamento com Kate Holmes e vários comentários sobre suas esquisitices. Depois de alguns filmes que não empolgaram, Cruise teve que reformular a carreira e após 2010 tornou-se herói de filmes de ficção científica e ação. Esqueça os trabalhos com diretores "sérios" e indicações a prêmios, aos 53 anos, a estratégia do ator é tornar-se popular novamente com sequências variadas (Missão 6, Jack Reacher 2 e até a continuação de Top Gun estão na lista). Ele sabe que o tempo de astros garantindo milhões de bilheteria já passou, o que vale agora são franquias de sucesso - pelo menos até os efeitos do tempo chegarem e os papéis sérios voltarem ao cento de sua carreira. Enquanto a fase pós-50 não vem, assisti ao sucesso Missão Imposível: Nação Secreta sem muito entusiasmo. Acho que nunca havia percebido como todos os filmes são, sendo variações de uma mesma história: a agência está em perigo, Hunt é perseguido enquanto é o único capaz de salvar a agência, várias cenas de ação e duas sequências memoráveis entre o início e o fim do episódio parecem ser as regras da franquia. Neste episódio, além da agência estar em risco por iniciativas governamentais (aqui representada por Alec Baldwin), o herói Ethan Hunt (Cruise) terá que agir fora dos protocolos (mais uma vez) para destruir uma sociedade secreta chamada de Sindicato, que possui membros tão bem treinados quanto ele. Na empreitada ele conta com os parceiros de costume Benji (Simon Pegg) e Luther (Ving Rhames), além do engravatado William Brandt (Jeremy Renner) apresentado no filme anterior. Em sua nova missão, Hunt irá cruzar com a misteriosa Ilsa Faust (Rebecca Ferguson), que nunca deixa muito claro de que lado ela está. Christopher McQuarrie (famoso por seu Oscar pelo roteiro original do fascinante Os Suspeitos/1995) nunca empolgou muito como diretor, mas Cruise parece ter gostado de trabalhar com ele em Jack Reacher/2012 e o escalou para dirigir dois de seus novos filmes. McQuarrie cria uma ambientação menos glamourosa para o filme, o que o torna um tanto cru, mas entrega duas cenas de ação mirabolantes que devem agradar os fãs: a famosa cena de Cruise pendurado num avião e a filmada dentro do tanque de segurança - que é a melhor sequência do filme. Tirando esses momentos, o filme me pareceu um tanto burocrático, sem grandes surpresas e desprezando o fio condutor familiar de Hunt que dava alguma liga aos dois filmes anteriores (além de seus amigos coadjuvantes fazerem mais do mesmo). Missão Impossível: Nação Secreta é o tipo de filme de ação que os fãs curtem, mas que não traz nada de especial, está longe da atmosfera do primeiro ou da renovação proposta pelo terceiro. Pelo menos aproveita mais o vilão do que o longa anterior e escapa de ser tão ruim como o segundo... ou seja,  fica em quarto lugar  no meu ranking da milionária franquia - mas é hora de inovar.

Missão Impossível: Nação Secreta (Mission Impossible: Rogue Nation/EUA-2015) de Christopher McQuarrie com Tom Cruise, Jeremy Renner, Rebecca Ferguson, Simon Pegg, Ving Rhames, Alex Baldwin e Sean Harris. ☻☻

Na Tela: Rua Cloverfield, 10

John, Mary e Goodman: meu salvador é um psicopata...

Produzido secretamente por JJ Abrams e sua produtora Bad Robot, Rua Cloverfield, 10 revela que JJ pensou numa franquia sobre filmes de suspense - inaugurada com Cloverfield: Monstro (2008). Embora os dois filmes sejam bastante diferentes, a ideia de uma grife no estilo "Além da Imaginação" mostra-se muito bem vinda. Se no longa de 2008 a destruição de Nova York era mostrada através das lentes conduzidas por um grupo de amigos, o novo filme investe num tom mais claustrofóbico e sugestivo. O filme conta a história de Michelle (Mary Elizabeth Winstead), que enfrenta problemas amorosos e resolve sair da casa do namorado. Enquanto ela dirige pela noite acontece um acidente e... ela acorda dentro de um quarto acorrentada à parede. A explicação para aquilo está na figura agressiva de Howard (John Goodman, excepcional), que aos poucos lhe explica o que aconteceu e os motivos para que ela permaneça naquele abrigo subterrâneo ao seu lado. Mas os dois não estão sozinhos, o vizinho de Howard, o simpático Emmett (o bom John Gallagher Jr.), praticamente impôs a sua presença no bunker, a contragosto do grandalhão. Com roteiro bem costurado, o filme consegue construir um suspense mais do que eficiente com a fórmula que tem em mãos (sujeitos isolados num ambiente que sugere tanto segurança quanto perigo), principalmente por conta do seu elenco. Se Winstead dá conta de construir uma mocinha esperta e Gallagher compõe uma espécie de conforto para ela, o maior destaque fica por conta de John Goodman que transforma a vida no abrigo num verdadeiro inferno, criando um personagem realmente ameaçador (mesmo quando está de bom humor). Desde as primeiras cenas fica clara a instabilidade de Howard, que só piora mediante o clima de paranoia que torna-se cada vez mais forte em sua mente. Por mais que ele argumente sobre os perigos  que estão do lado de fora, até o espectador fica em dúvida se é melhor ficar ali dentro com um sujeito tão desequilibrado - afinal, ele não espera apenas a gratidão dos seus companheiros, ele impõe a eles uma tirania que torna-se ainda mais insustentável diante da suspeita de que ele é um grande mentiroso.  Algumas pessoas poderão reclamar, mas gostei muito do último ato do filme, onde o filme muda de foco, mas intensifica ainda mais o terror que acompanhamos até ali (e o dilema que impõe à Michelle). Extremamente bem produzido e eficiente, Rua Cloverfield, 10 é a prova de que os diretores estão repensando o gênero, inserindo ideias onde a sanguinolência prevaleceu por um bom tempo. 

Rua Cloverfield, 10 (10 Cloverfield Lane/EUA-2016) de Dan Trachtenberg com Mary Elizabeth Winstead, John Goodman, Johan Gallagher Jr. e Suzanne Cryer. ☻☻☻

terça-feira, 24 de maio de 2016

PL►Y: Reaprendendo a Amar

Blythe: uma atriz de respeito. 

A veterana Blythe Danner atua desde os anos 1960, tendo mais de cem trabalhos no currículo, seja na TV ou no cinema (onde já trabalhou com diretores importantes do porte de Woody Allen, James Ivory e Costa-Gravas). Porém, a atriz (sempre elegante) ficou mais conhecida quando sua filha Gwyneth Paltrow também enveredou pelo mundo do cinema. Gwyneth ganhou um Oscar de melhor atriz em 1998 por Shakespeare Apaixonado, mas a Academia nunca rendeu o mesmo reconhecimento à Blythe - que geralmente serve como coadjuvante de peso em filmes de diversos gêneros. Em 2015 houve uma forte campanha para que esse fato fosse modificado com seu reconhecimento por Reaprendendo a Amar, simpática comédia dirigida por Brett Haley, em que Danner tem chance de brilhar como a protagonista Carol Petersen. Carol é uma senhora da faixa dos setenta anos que vive em um confortável condomínio para idosos. Viúva e com uma filha independente (Malin Akerman), Carol leva uma vida tranquila fazendo caminhadas e se encontrando com as amigas e viver um romance não lhe apetece há tempos. Sua rotina muda quando o cão de estimação adoece e ela começa a ter que lidar com a solidão. Embora o roteiro sugira a necessidade de um romance na vida da protagonista, a ideia é explorada de uma forma diferente, acontecendo espontaneamente, quase que por acaso quando ela se encontra com Bill (Sam Elliott), que nunca esconde o seu interesse por ela. Danner constrói uma mulher madura atraente e interessante não por se comportar feito uma adolescente, mas por ser exatamente uma mulher com muitos anos de vida e vivências. Essa bagagem de vida acumulada se reflete bastante nos diálogos da personagem com as amigas e sobretudo quando ela contracena com o limpador de piscina Lloyd (o ótimo Martin Starr). Não sei se era a intenção, mas pode se dizer que existe uma química de outro mundo entre Blythe e Martin, afinal, ainda que o roteiro não invista num romance entre os dois, alguns dos momentos mais interessantes do filme acontecem quando os dois estão juntos em cena. No fim das contas, a sutileza com que o diretor traça o cotidiano da personagem compõe o diferencial da história, que de maneira simples se distancia do óbvio, mesmo quando o roteiro investe em alguns momentos clichê (a cena do barato das senhoras é um desses). O final irônico não deixa de ser uma ode à independência da personagem e sugere ao espectador tudo que ainda pode acontecer na vida de Carol. Blythe Danner, ao ser premiada em vários festivais de filmes independentes em 2015 prova que a vida continua produtiva aos setenta!

Reaprendendo a Amar (I'1l see you in my Dreams/EUA-2015) de Brett Haley com Blythe Danner,  Martin Starr, Sam Elliot, June Squibb, Mary Kay Place, Rhea Perlman e Malin Akerman. ☻☻☻

PL►Y: O Último Concerto

Mark, Phil, Christopher e Catherine: lavando a roupa suja de 25 anos!

Foi algo quase inconsciente adiar ao máximo para assistir O Último Concerto, afinal, ficou o longa ficou conhecido como um dos últimos trabalhos do grande ator americano Phillip Seymour Hoffman, que faleceu aos 46 anos em 2014. Assinado pelo ex-documentarista Yaron Zilberman, o filme se concentra nos membros de um prestigiado quarteto de cordas formado pelo veterano Peter Mitchell (Christopher Walken), o perfeccionista Daniel Lerner (Mark Ivanir) e o casal Robert (Seymour) e Juliette (Catherine Keener). Aos 25 anos de carreira, os músicos preparam para uma nova turnê e se deparam com a notícia de que Peter está com mal de Parkinson. Embora Peter já pense em alguém para substituí-lo - e manter a integridade artística de seu grupo, a notícia começa a revelar algumas fragilidades dos vários anos de convivência. A maior delas fica por conta de Robert demonstrar insatisfação em ser o segundo violinista do conjunto - e a sua sugestão de revezar a função com Daniel rende discussões com o colega e com a esposa Juliette, que percebe a fragilidade presente no grupo. Não demora muito para o próprio casamento da dupla começar a enfrentar problemas, colocando em risco a carreira de todos. Nesse momento, a participação da filha do casal, Alexandra (Imogen Poots) recebe destaque não apenas como estudante de música, mas pelo relacionamento cada vez mais próximo com Daniel (que no passado teve um relacionamento com a sua mãe). Como filme O Último Concerto demora a engrenar, se perdendo em divagações sobre a música e dispersando seu foco por mais tempo do que deveria, restando ao seu elenco competente a tarefa de prender a atenção da plateia. Sorte que eles conseguem, o problema é quando o roteiro começa a perder a mão no relacionamento da jovem Alexandra com os músicos que a cerca, resultando em algumas soluções apressadas e um tanto melodramáticas (a discussão da garota com a mãe é dura de engolir de tão forçada), no entanto, não deixa de ser interessante como o filme aponta para o desgaste de um grupo fechado que construiu um universo bastante particular durante seus anos de trabalho (nesses momentos o uso de cenas que reproduzem um documentário sobre o grupo consegue ser bastante revelador). No elenco, enquanto Mark, Catherine e Phillip tentam fugir do tom esquemático que o roteiro reserva aos seus personagens, Christopher Walken é o que mais acerta no tom do personagem que é funciona quase como o patriarca dos demais. Embora seu personagem seja pouco explorado, ele cumpre sua tarefa com bastante competência, tornando os dilemas de Peter bastante palpáveis para a plateia. 

O Último Concerto (A Late Quartet/EUA_2012) de  Yaron Zilberman com Christopher Walken, Phillip Seymour Hoffman, Catherine Keener, Mark Ivanie e Imogene Poots. ☻☻

domingo, 22 de maio de 2016

PREMIADOS - FESTIVAL DE CANNES 2016

Daniel Blake: surpresa em Cannes. 

Pode se dizer que foi o Festival de Cannes mais surpreendente dos últimos anos. Não apenas pelo novo drama do diretor Ken Loach desbancar os favoritos e levar a Palma de Ouro com sua história de um senhor que escapa da morte e se aproxima de uma mãe solteira, mas principalmente por premiar um diretor que teve seu filme vaiado (se bem que além do novo de Olivier Assayas, a plateia ainda rendeu vaias para os novos de Nicolas Winding Refn e Sean Penn) e valorizar a nova obra de Xavier Dolan, que dividiu opiniões após ser a sessão mais disputada do ano. Se o brasileiro Aquarius de Kleber Mendonça Filho saiu de mãos abanando, pelo menos o documentário de Eryk Rocha foi reconhecido em sua categoria. A seguir os premiados do ano:

PALMA DE OURO 
"I, Daniel Blake" de Ken Loach

GRANDE PRÊMIO DO JÚRI
"Juste la Fin du Monde" de Xavier Dolan

PRÊMIO DO JÚRI
"American Honey" de Andrea Arnold

PRÊMIO DA CRÍTICA 
"Toni Erdman" de Peter Simonischeck

DIREÇÃO
Olivier Assayas ("Personal Shopper")

ATOR
Shahab Hosseini ("Forushande")

ATRIZ
Jaclyn Jose (Ma'Rosa)

ROTEIRO
Asghar Farhadi ("Forushande")

UN CERTAIN REGARD 
"Hymyilevä Mies" de Juho Kuosmanen

CURTA METRAGEM
"Timecode" de Juanjo Gimenez

CÂMERA DE OURO
"Divines" de Hounda Benyamina

OLHO DE OURO
"Cinema Novo" de Eryk Rocha

PALMA DOG
Para a bulldog Nelly de "Paterson"

MOMENTO ROB GORDON: Novos Diretores Italianos

O cinema italiano já nos presenteou com vários mestres da sétima arte: Federico Fellini, Sergio Leone, Vittorio de Sica, Antonioni, Pasolini e Ettore Scola. Algumas décadas atrás foi a época de Nani Moretti e Giuseppe Tornatore também alcançarem a fama à sombra de verdadeiras lendas do cinema. Recentemente uma nova geração de diretores italianos começou a chamar atenção em festivais e salas de cinema. A qualidade de seus trabalhos já rendaram convites para filmar em outros países carentes de novas ideias. Dentre os nomes que se destacam no novo cinema italiano eu preparei essa lista com os meus cinco favoritos. 

05 Daniele Luchetti 
O mais experiente da lista nasceu em Roma no ano de 1960 e filma desde 1985 - quando era um dos jovens cineastas mais promissores de seu país. Luchetti já foi indicado duas vezes à Palma de Ouro no Festival de Cannes (a última dela pelo comovente A Nossa Vida/2010 que rendeu o prêmio de melhor ator para Elio Germano - que dividiu o prêmio com Javier Bardem por Biutiful). A crítica costuma dizer que Daniele exagera no melodrama, mas ele não se importa.  Depois de doze filmes e doze prêmios internacionais, ele lançou no ano passado a cinebiografia do Papa Francisco, chamado Chiamatemi Francesco - Il papa della Gente que ainda não tem data de estrear no Brasil. 

04 Gabriele Muccino
Nascido na cidade de Roma em 1967, lançou seu primeiro filme em 1996, mas ficou conhecido mundialmente com sua terceira obra, o sucesso O Último Beijo/2001 (que ganhou  o prêmio da audiência no Festival de Sundance, uma refilmagem americana e uma sequência em 2010). O sucesso lhe rendeu convites para filmar em Hollywood - foi quando trabalhou com o astro Will Smith em À Procura da Felicidade/2006 e Sete Vidas/2007. Recentemente ele filmou com  Russell Crowe o elogiado Pais & Filhas (2015) ainda inédito por aqui.  Com nove filmes no currículo, Muccino já recebeu doze prêmios internacionais. 

03 Matteo Garrone 
Nascido em 1968 na cidade de Roma, Garrone lançou seu primeiro longa metragem em 1996, mas ficou famoso mundialmente em 2008 - quando lançou o violento Gomorra sobre criminosos italianos. O filme gerou muita polêmica além de fama mundial após receber o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes. Gomorra foi aclamado como um dos melhores do ano, sendo indicado ao Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro - gerando até uma série de TV! Garrone voltou à Cannes com Reality, causando comoção por ter escolhido um presidiário para ser protagonista. O filme lhe rendeu mais uma vez o prêmio do júri no festival e três anos depois fez seu primeiro filme em inglês (O Conto dos Contos/2015). Em sua carreira Garrone já coleciona mais de 30 prêmios internacionais. 

02 Paolo Sorrentino
Se você acompanha cinema nos últimos anos sabe que o napolitano Sorrentino está no auge! Dono de 51 prêmios internacionais, este cineasta nascido em 1970 filma desde 1994, sendo indicado seis vezes à Palma de Ouro em Cannes - uma delas por Il Divo (2008), a cinebiografia de Giulio Andreoti (escolhido primeiro ministro sete vezes desde a restauração da democracia italiana em 1946). O filme foi um dos filmes europeus mais comentados daquele ano e foi indicado ao Oscar de melhor maquiagem. Depois ele lançou Aqui é o meu Lugar - que recebeu somente o Prêmio Ecumênico em Cannes e em 2014 ganhou o Oscar de Filme Estrangeiro com o aclamado A Grande Beleza e voltou a filmar em inglês no ano passado com Juventudeque concorreu ao Oscar de Melhor Canção. Sorrentino gosta de acompanhar a trajetória pessoal de seus personagens de uma maneira única (e com senso estético apuradíssimo) - e, ao que parece, é o novo diretor italiano favorito da Academia! 

01 Saverio Costanzo
O romano Saverio Costanzo é o mais jovem da lista. Nascido em 1975 ele começou a carreira como documentarista em 2002 e gosta de contar histórias repletas de personagens complexos - alimentando-os com uma humanidade ímpar. Enquanto seus colegas ganham espaço no Festival de Cannes, ele consegue renome no Festival de Veneza, especialmente com seus dois filmes mais conhecidos: o excelente A Solidão dos Números Primos (2010) e o angustiante Corações Famintos (2014), onde trabalhou com o astro americano em ascensão Adam Driver. Com seis filmes no currículo, Costanzo ainda é o responsável pela série In Treatment (o nosso Sessão de Terapia) em seu país. Com dezesseis prêmios no currículo, Saverio já é um dos meus cineastas favoritos. 

Na Tela: O Conto dos Contos

Salma: a rainha mãe.

O italiano Matteo Garrone trabalha com cinema desde 1996, mas ficou conhecido mundialmente depois que ganhou o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes pelo violento Gomorra em 2008. O filme foi indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro e causou protestos quando ficou de fora do Oscar. Seu filme seguinte, Reality (2012) repetiu o feito junto ao júri de Cannes, mas não fez tanto sucesso com a trama sobre a obsessão de tornar-se famoso, o filme causou grande repercussão por ser estrelado por um ator que ainda cumpria pena na prisão (o ótimo Aniello Arena). Nas duas obras o diretor deixou claro que não gostava de se repetir - e que sabia ser engenhoso atrás das câmeras. Quando exibiu o recente O Conto dos Contos em Cannes no ano passado, muitos ficaram surpresas pela forma como adaptou a obra do escritor napolitano Giambattista Basile (1566-1632), um dos primeiros a escrever um livro sobre os "contos de fada". O livro O Conto dos Contos foi publicado dois anos após a morte de Basile, contendo as primeiras versões de Cinderela, Bela Adormecida, Rapunzel, entre outras - e deixava claro que as histórias poderiam ser bastante assustadoras até mesmo para os adultos. O filme de Garrone mantém esse espírito sombrio ao escolher três histórias pouco conhecidas para o seu roteiro, sem aliviar os desvios de caráter de seus personagens ou as consequências de suas ações. Longe de ter o clima leve dos filmes da Disney, o filme pode causar estranhamento aos desavisados, mas isso não quer dizer que o resultado não seja mais interessante do que as releituras moderninhas que estão na moda. O filme se concentra em três histórias ambientadas em reinos vizinhos. Em Longtrellis, a rainha (Salma Hayek) está frustrada por não conseguir engravidar. Diante disso, por mais que o rei (John C. Reilly) se esforce para deixá-la feliz, ele não consegue - mas existe uma esperança quando um personagem misterioso aparece e sugere que o rei consiga o coração de um monstro marinho, que ao ser cozido por uma virgem e servido à rainha será capaz de fazer com que a majestade possa gerar um bebê. Aos poucos, o que era para ser uma dádiva torna-se uma maldição pela forma como a rainha lida com o filho e a amizade dele com o filho da tal virgem. 

Toby: com a pulga atrás da orelha. 

Perto dali, o bondoso rei de Highills (Toby Jones) se encanta por uma pulga e a torna seu animal de estimação. O rei ainda tem uma filha adolescente (Bebe Cave) que pensa cada vez mais em casamento - não irá demorar para que ele estabeleça que terá a mão da princesa somente o homem que desvendar um mistério. Nessa história o maior problema será que o Rei sabe o valor da palavra  - e isso poderá desapontar a sonhadora princesa. Já o rei de Strongcliff (Vincent Cassel) só pensa em participar de orgias com suas múltiplas parceiras até que se apaixona pela voz de uma plebeia, mal sabe ele que pertence a uma das solitárias irmãs Imma (Shirley Henderson) e Dora (Hayley Carmichael), que estão muito distantes do padrão de beleza que o rei aprecia (mas que farão de tudo para não perder a oportunidade que aparece). Filmado na Itália, com figurinos marcantes e direção de arte bem cuidada, Garrone escolheu atores que transitam em Hollywood para fazer seu primeiro filme em inglês. Embora conte com ingleses, americanos, uma atriz mexicana e um astro francês, o diretor consegue construir uma forte identidade à costura das histórias paralelas que tem em mãos. Embora deixe claro o viés da "moral" de cada história, ele surpreende quando pontua seu filme com cenas que oscilam entre o sublime (a ruiva dormindo na floresta), o surrealismo (a cena em que a rainha devora o coração do monstro) e o horror (a cena da caverna ou o triste destino de Dora), as cenas servem para retirar o filme do lugar comum que alguns filmes de fantasia costumam se acomodar. Com seu humor estranho e as ousadias visuais, O Conto dos Contos não é perfeito, mas torna-se um programa muito interessante para quem procura conhecer um diretor ousadamente criativo e ainda pouco reconhecido por aqui.  

Cassel e Stacy: quase a Venus de Botticelli.  

O Conto dos Contos (Il Racconto dei racoonti - Itália/França/Reino Unido/2015) de Matteo Garrone com Salma Hayek, Toby Jones, John C. Reilly, Vincent Cassel, Shirley Henderson, Hayley Carmichael, Stacy Martin, Christian Lees, Jonah Lees e Bebe Cave. ☻☻☻

sexta-feira, 20 de maio de 2016

PL►Y: Virando a Noite

Scott, Taylor, Jason e Judith: a noite mais perigosa de todas!

Além de berço do movimento grunge, existe um consenso de que a chuvosa Seattle é uma das melhores cidades para se criar um filho - talvez por isso seja a cidade mais densamente povoado do estado de Washington. É de lá que vieram Alex (Adam Scott) e Emily (Taylor Schilling) um casal feliz que resolveu mudar-se para ensolarada Califórnia com o pequeno RJ (R.J. Hermes). Apesar da afinidade, o casamento da dupla precisa superar alguns desafios que vão para além do sustento ficar por conta do trabalho de Emily. O problema é sugerido na cena inicial, mas será retomado mais adiante quando eles se aproximarem dos pais de um menino com que RJ faz amizade numa festinha. Kurt (Jason Schwartzman) e Charlotte (Judith Godrèche) moram num casarão e parecem os melhores anfitriões do mundo quando os novos amigos os visitam a primeira vez. No entanto, depois que os meninos dormem, algumas atitudes fazem a desconfiada Emily perceber que existe algo de estranho no ar. Produzido pelos irmãos Jay e Mark Duplass, o filme tem o típico tom de comédia indie assinada pelos dois, mas a direção de Patrick Brice incrementa ainda mais a graça conjugada à tensão do que acontecerá a cada ato que se sucede. Passando pelo vídeo protagonizado por Charlotte, o atelier de Kurt (com seu quadros sugestivos), o banho de piscina durante à madrugada... tudo é pontuado com diálogos insinuantes que tornam as suspeitas de Emily ainda mais palpáveis para o público. Virando a Noite brinca com a rotina do casamento e fantasias sexuais com uma habilidade rara, sem cair na baixaria (e existem muitos momentos que isso realmente poderia ter acontecido) e lida com a nudez de seus personagens com uma naturalidade difícil de encontrar. Misturando o que é suspeita e o que é real, o resultado consegue ser uma comédia adulta interessante que pode gerar debates por horas entre os casais que o assistirem. Brincando com temas sérios, o resultado ainda consegue ser enxuto em seus 80 minutos de duração, alcançando seus objetivos com um grande eficiência - parabéns ao diretor esperto (que estava mais acostumado a lidar com filmes de terror como Creep/2014) e aos atores que tornam seus personagens em sujeitos comuns, pessoas que poderiam ser seus vizinhos ou até os pais do amiguinho do seu filho. 

Virando a Noite (The Overnight/EUA-2015) de Patrick Brice com Adam Scott, Taylor Schilling, Jason Schwartzman, Judith Godrèche e R.J. Hermes. ☻☻☻

PL►Y: Minions

Minions e Scarlet: servindo aos maiores malvados da História. 

Os Minions ficaram famosos como coadjuvantes nas aventuras de Gru em Meu Malvado Favorito  1 (2010) e 2 (2013).  A origem dos simpáticos monstrinhos amarelos nunca foi explicada, mas diante do grande apelo que as criaturas possuem diante da criançada era de se imaginar que eles teriam uma aventura solo, onde maiores informações seriam trabalhadas. Sucesso nos cinemas, Minions partiu justamente dessa premissa para fazer sucesso nas bilheterias e o filme consegue ser bem divertido, mesmo com alguns grandes desafios para dar conta. O primeiro deles é que diante da semelhança entre as centenas de amarelinhos eles precisavam construir a identidade de pelo menos alguns deles para garantir uma aventura com começo meio e fim, assim são designados Bob, Kevin e Stuart. O próximo desafio era muito mais complicado, já que a trama apresenta os personagens como seres que desde a origem da vida no planeta Terra se dedicaram a servir aos maiores vilões do mundo. Em tempos do politicamente correto, como fazer os protagonistas sendo cúmplices de atos malévolos? Sendo assim, começaram servindo a tubarões, tiranossauros, um homem das cavernas mal intencionado... por algumas razões que não vale revelar, eles acabam se isolando no polo norte, mas a existência do grupo passa a ficar cada vez menos interessante. Assim, o trio citado acima parte na busca de um novo líder maléfico para servir, eles acabam encontrando Scarlet Overkill (voz de Sandra Bullock), a primeira supervilã da história. Scarlet, ao lado do esposo Herb (voz de Jon Hamm) - que inventa uma mente privilegiada para criar apetrechos esquisitos, possuem um plano maluco para tomar a coroa da Rainha da Inglaterra, mas precisa da ajuda de Bob Kevin e Stuart. O filme capricha nas trapalhadas dos protagonistas, deixando tudo engraçadinho, voltado especificamente pas as crianças - mas os adultos que entrarem na brincadeira devem achar graça sobretudo de alguns detalhes (a sorridente rainha da Inglaterra, um renomado diretor de cinema filmando a chegada do homem à Lua dentro de um estúdio...). É verdade que existem momentos que o filme patina em gelo fino (como a cena na câmara de tortura), mas acho que as crianças nem entendem direito do que se trata numa animação que utiliza a fantasia para espantar qualquer aspecto realista. Eu cheguei a pensar em alguns momentos que Scarlet (personagem que tem o visual da vocalista Karen O. da banda Yeah Yeah Yeahs!) e Herb eram os pais de Gru, mas a maldade dos personagens é maior e espantam logo essa impressão, sobretudo na última cena. Minions fez muito sucesso ao redor do mundo e deve render novas aventuras para os amarelinhos, mas só depois que Meu Malvado Favorito 3 chegar aos cinemas no ano que vem!

Minions (EUA/2015) de Brian Lynch com vozes de Sandra Bullock, Jon Hamm, Michael Keaton, Steve Coogan, Geoffrey Rush e Allison Janney. ☻☻☻

quarta-feira, 18 de maio de 2016

PL►Y: Amor Fora da Lei

Rooney e Casey (ao centro): alma de faroeste. 

David Lowery tem longa carreira como editor de filmes (são 33 no total, a maioria curtas metragens), mas ele também é um cineasta indie bastante produtivo (são 16 filmes, apenas três longas) embora pouco conhecido. Para o público brasileiro o filme que funcionou como cartão de apresentação do diretor foi este Amor Fora da Lei estrelado por Rooney Mara e Casey Affleck. Ambientado nos anos 1970, o filme conta a história do ladrão Bob Muldoon (Affleck), que é apaixonado por Ruth (Mara) - com quem vive de assaltos na região. Um dia eles são descobertos pela polícia e, por conta de uma troca de tiros, Bob é preso e condenado a passar longos anos na prisão. Aumenta ainda mais a angústia do personagem o fato de Ruth estar grávida e ele não acompanhar o crescimento do bebê. Enquanto Bob está preso, a vida de Ruth segue tranquila junto à filha e da atenção do policial Patrick Wheeler (Foster), mas as coisas mudam quando Bob foge da prisão e a polícia volta a aparecer em sua vida - afinal, eles consideram que em breve o fugitivo irá procurar a família. O filme conta a jornada  do protagonista rumo ao encontro, que parece cada vez mais distante enquanto Lowery demonstra pleno controle da narrativa, construindo lentamente uma história de amor triste e cheia de tensão que remete, curiosamente, à linguagem do faroeste. Entre diálogos, uma mocinha que é menos ingênua do que parece e um anti-herói que anseia por encontrar seu destino, o filme é decorado com bela reconstituição de época e fotografia caprichada. A edição também é bastante competente e, em alguns momentos, remetem à construção narrativa de Terrence Mallick, numa conjunção reflexiva de imagens e reflexões. Para além da qualidade técnica impressa pelo diretor, o filme conta com boas atuações, Casey Affleck ainda me parece o melhor ator da família (mesmo que às vezes se esforce demais em parecer estranho) e Rooney Mara consegue criar um tipo mais humano do que está acostumada (também vale ficar atento ao melhor amigo de Bob, vivido pelo ator Nate Parker que causou sensação no último Festival de Sundance com o filme "The Birth of a Nation", já cotado para o Oscar do ano que vem). Embora o desfecho seja previsível, Lowery consegue chegar até ele com um controle impressionante deixando a impressão de termos vivido uma experiência cinematográfica peculiar, uma espécie de Bonnie & Clyde que troca o glamour pela melancolia. 

Amor Fora da Lei (Ain't them Bodies Saints/EUA-2013) de David Lowery com Rooney Mara, Casey Affleck, Ben Foster, Keith Carradine e Nate Parker. ☻☻☻

PL►Y: Fique Comigo

Tassadit e Michael Pitt: encontro inusitado. 

Lançado no início de março em poucas salas no Brasil, a comédia dramática Fique Comigo poderá conquistar o espectador que curte um tipo de humor mais melancólico em DVD. O filme do cineasta Samuel Benchetrit foi exibido numa mostra paralela do Festival de Cannes no ano passado e concorreu ao César (o Oscar francês) de melhor roteiro adaptado com uma ideia é bastante simples, mas que cativa pela simpatia como mistura suas tramas. A história se passa em um prédio no subúrbio parisiense onde conhecemos alguns moradores, um deles é Sterkowitz (Gustave Kervern) que recusa-se  a colaborar na compra de um novo elevador para o prédio, pelo simples motivo de morar no primeiro andar - mal sabe ele que um golpe do destino fará com que se arrependa da decisão (ainda que a partir dela, conheça a enfermeira interpretada pela sempre interessante Valeria Bruni Tedeschi). Outra parte da história acompanha o jovem Charly (Jules Benchetrit, filho do diretor) que conhece a nova vizinha, a atriz Jeanne Meyer (a cultuada Isabelle Huppert), que ainda precisa encontrar um novo rumo para a carreira. A história mais inusitada aborda o encontro da senhora argelina chamada Hamida (Tassadit Mandi) que recebe a visita de um astronauta americano (Michael Pitt) que, literalmente, cai sobre o prédio e precisa permanecer secretamente no apartamento dela. São três histórias que funcionam de forma independente, mas que giram em torno de uma temática em comum: tipos solitários que encontram novos relacionamentos e procuram mantê-los. O resultado pode não ser surpreendente, mas gera bons momentos seja com o fotógrafo Sterkowitz superando seus desafios para conquistar a melancólica enfermeira, com Charly ajudando Jeanne a conseguir um papel no teatro ou a relação entre duas pessoas completamente diferentes que não compartilham nem a mesma língua. Durante o filme se escuta diálogos em francês, inglês e árabe, mas o que vemos não é uma Torre de Babel, pelo contrário, Benchetrit sustenta seu filme com um senso de humor bastante sutil e uma abordagem singela da construção dos laços entre os seres humanos. Outro aspecto interessante é como o interior dos apartamentos  contrasta com o universo desgastado do mundo exterior (seja nas ruas ou nos corredores depredados), parece que para além da história dos personagens, o filme os utiliza para compor um microcosmo onde os espaços coletivos se encontram desgastados, enquanto o mundo privado, por mais que seja aconchegante, parece um tanto vazio, pronto para acolher outro indivíduo. É na relação entre o coletivo e o individual que o diretor abriga, nas entrelinhas de sua história, sua visão de mundo (que não deixa de ser curiosa num tempo onde as pessoas interagem cada vez mais virtualmente e esquecem o quão prazeroso pode ser estabelecer laços fisicamente). A cena final, embora bem realizada e até emocionante, pode desagradar quem não curte finais abertos, mas, ainda assim, Fique Comigo pode revelar-se uma grata surpresa aos cinéfilos mais atentos.

Fique Comigo (Asphalte/França-2015) de Samuel Benchetrit com Gustave Kervern, Isabelle Huppert, Jules Benchetrit, Tassadit Mandi, Michael Pitt e Valeria Bruni Tedeschi. ☻☻☻

terça-feira, 17 de maio de 2016

§8^) Fac Simile: Tom Holland

Thomas Stanley Holland
Não parece, mas mês que vem o jovem ator Tom Holland irá completar 20 anos! Como presente de aniversário ele recebe o sucesso de sua encarnação como Homem-Aranha no blockbuster Capitão América: Guerra Civil. A participação no filme da Marvel só foi possível mediante um acordo entre o estúdio com a Sony, detentora dos direitos do personagem aracnídeo. A escolha do ator, que encarna a versão mais adolescente do herói, foi perante uma grande disputa em Hollywood. Nosso repórter imaginário encontrou o jovem astro inglês em meio à divulgação do filme e conseguiu lhe fazer essas cinco perguntas numa entrevista que nunca aconteceu:

§8^) Você chamou atenção na primeira vez em que apareceu na telona - quando sobreviveu ao tsunami de O Impossível/2012 (que lhe valeu o título de melhor ator coadjuvante aqui no blog). Você não envelheceu nada de lá para cá! Qual o seu segredo? Botox?

Tom Não mesmo! KKK meu segredo foi ter nascido em 1996! E eu não sabia que fui considerado melhor ator coadjuvante por vocês! Fico lisonjeado! 

§8^) Qual a sensação de ter sido o escolhido para viver o SpiderMan mais jovem do cinema?

Tom Eu ainda não acredito que fui o escolhido! Tinha tantos jovens atores legais na disputa. Tinha o Asa Buterfield, o Logan Lerman... fiquei realmente surpreso quando a Marvel decidiu que eu era a melhor escolha. Sem falar que eu tenho feito personagens muito sérios até aqui, fazer um filme de super-herói me pareceu pura diversão! Vendo na tela fica melhor ainda...

§8^) O que foi mais difícil: sobreviver ao Tsunami ou enfrentar o Capitão América?

Tom Ainda não tinha pensado nisso, mas acho que enfrentar a versão gigante do Homem Formiga foi mais assustador! O Capitão América é um cara legal, não importa o que ele faça em Guerra Civil. É o tipo de herói em estado puro... eu sabia que não corria grandes riscos contra ele. Acho que o pior de tudo foi ter enfrentado Moby Dick em No Coração do Mar/2015, até hoje quando revejo o filme eu fico enjoado! 

§8^) Você tem mais três filmes previstos para esse ano e em breve deve estrelar o novo filme do herói aracnídeo. O que você espera dessa nova fase do herói nas telas?

Tom Acredito que será a melhor de todas! A Marvel sabe realmente como tratar seus heróis na tela, eles não criam filmes, mas tecem um verdadeiro universo! Já me disseram até que terá participação especial do Homem de Ferro! Não é demais ter Tony Stark como mentor? E a Marvel deixou bem claro que não terá pressa de envelhecer o personagem! Bom que assim eu tenho idade para fazer pelo menos uns dez filmes do Homem-Aranha!

§8^) E você prefere o SpiderMan do Tobey Maguire ou do Andrew Garfield?

Tom Eu curti mais os filmes com o Tobey! Eram mais divertidos e eu poderia ficar dias vendo só o Aranha pendurado pulando de prédio em prédio. Ainda que o terceiro filme dele fosse um pouco esquisito - e espero que nunca me peçam para fazer um Peter Parker emo - ele ainda era melhor que A Vingança de Electro que é muito ruim. Eu acho a próxima aventura muito promissora, e nem estou levando em conta que Marisa Tomei é a Tia May mais linda de todos os tempos! Dá para acreditar que ela já tem 51 anos?! Ela até fez um filme com o Robert Downey Jr. nos anos noventa... mas eles não gostam de lembrar disso... parece que não era muito bom... como era mesmo o nome... não consigo lembrar...

§8^) Não se preocupe, querido... ninguém lembra...

domingo, 15 de maio de 2016

Na Tela: Capitão América - Guerra Civil

Capitão América Vs. Homem de Ferro: crise ideológica. 

Acho que no futuro o ano de 2016 será lembrado como o ano em que nossas certezas foram quebradas. Verdades, ideologias e ideias foram questionadas, desconstruídas e reconstruídas numa escala poucas vezes vista. Da ascensão de ideias que considerávamos coisa do passado, chegando a redenções que nunca se concretizaram com seus ídolos caídos, acho interessante como os filmes de super-heróis captaram essa mensagem em voga. Na história das adaptações em histórias em quadrinhos, o ano em que vivemos será lembrado como o ano das pendengas super-heroicas. Afinal, foi o ano em que Batman tinha tanto medo de um mundo com seres mais poderosos que ele, que quase deu cabo de Superman e tudo o que ele representava em Batman Vs Superman (2016). Não bastasse isso, chegou a vez do time de heróis da Marvel, Os Vingadores discutirem a relação, especialmente Capitão América (Chris Evans) e Homem de Ferro  (Robert Downey Jr.) que ficam em lados opostos quando tem que enfrentar as consequências de toda a destruição que causaram enquanto salvavam o mundo em suas missões - porém, causaram as mortes de centenas de civis. No início de Capitão América: Guerra Civil, outro acidente vitimando pessoas comuns acarreta um arranjo governamental para regular a ação dos Vingadores: o Tratado de Sokóvia. Um acordo que subjuga a ação dos heróis à supervisão do governo. O passado bélico faz com que Tony Stark concorde com a medida, no entanto, o Capitão percebe que a influência dos interesses governamentais sobre suas ações poderá gerar problemas (assim como gerou à S.H.I.E.L.D) - some isso à perseguição ao seu amigo Buck, ou melhor, O Soldado Invernal (Sebastian Stan), acusado de cometer um ato terrorista e você sentirá para o lado que o sempre correto Capitão pende. Na primeira parte os heróis escolhem seus lados numa trama cheia de intrigas, espionagem e os conflitos mais bem desenhados de uma trama elaboradaa, mesmo com o desafio de lidar com mais de uma dezena de personagens - alguns deles que não conseguem escolher um lado até a já antológica cena do aeroporto. 

Pantera Negra: como manda o figurino.

Os diretores Joe e Anthony Russo conseguem manter a narrativa entre os ideais de um e outro, demonstrando que por mais que o espectador escolha um lado, ele é capaz de compreender os motivos que movem os adversários. Entre o "time" Capitão América e o "Time" Homem de Ferro, existem motivações que envolvem conflitos bastante pessoais, sobretudo pelos laços de amizade que se formaram nos filmes anteriores. Assim, por mais que o roteiro insira o ardiloso Zemo (Daniel Brühl, que poderá render muito mais nos próximos filmes da Marvel, já que o desenvolvimento me pareceu mais uma introdução do personagem no universo), o antagonismo fica por conta dos personagens conhecidos que já lutaram juntos nos filmes anteriores. É preciso destacar que os diálogos são tão valorizados como as cenas de ação - dessa vez, sem o exagero de efeitos especiais que se tornaram quase obrigatórios nesse tipo de filme - e servem para inserir um novo marco nos filmes do estúdio (que serve de ponto de partida para Vingadores - Guerra Infinita, previsto para 2018). Além disso, traz Homem-Formiga (Paul Rudd) para o front e insere Pantera Negra (em outra ótima atuação de Chadwick Boseman) com uma gana invejável ao universo já instituído, sem falar que conserta tudo o que o cinema já errou com o popular Homem Aranha (graças à boa participação de Tom Holland), de volta para casa Marvel após o desastrado último filme da Sony. Holland encarna o SpiderMan mais fiel que já vimos na tela: adolescente, tagarela, gentil... assim como o Pantera Negra, deixa o desejo de vermos um filme solo somente dele. No fim das contas, Capitão América: Guerra Civil coloca nos trilhos o que ficou desengonçado em A Era de Ultron. Embora o carro chefe da Marvel sejam os filmes dos Vingadores, percebo que são nos filmes de seu veterano herói que a Marvel costuma desenhar suas melhores estratégias, lapidando tramas mais sérias e  com verniz político no que poderia ser apenas entretenimento descartável. Em Guerra Civil, mais do que um super-herói impedindo os planos de um vilão maluco, o que vale são os conflitos de ideias impregnadas de ideologias e subjetividades. Acredito que os filmes da Marvel não serão os mesmos depois daqui. 

Homem-Aranha: voltando para casa Marvel. 

Capitão América: Guerra Civil (Captain America: Civil War/EUA-2016) de Joe e Anthony Russo com Chris Evans, Robert Downey Jr, Scarlett Johansson, Chadwick Boseman, Anthony Mackie, Sebastain Stan, Daniel Brühl,  Elizabeth Olsen, Paul Bettany, Tom Holland, Paul Rudd e Don Cheadle. ☻☻☻☻

sexta-feira, 13 de maio de 2016

Na Tela: Para Minha Amada Morta

Fernando: o sepultamento da esposa idealizada. 

Posso dizer que Fernando Alves Pinto é um dos raros atores de cinema do Brasil. Com vinte e cinco longas no seu histórico, o sobrinho do Ziraldo é um dos poucos atores que são associados diretamente à sétima arte em nosso país. Aos 46 anos (embora ainda pareça ter bem menos), Fernando tem a sua atuação mais sombria e multifacetada neste suspense dramático do diretor Aly Muritiba. O filme recebeu vários elogios e prêmios em festivais (só no Festival de Brasília ganhou seis, incluindo pra o ator e  diretor). Para Minha Amada Morta é bastante introspectivo ao contar a história de Fernando, um jovem viúvo que cuida do filho pequeno e alimenta a saudade da esposa assistindo vídeos e cultuando as roupas e sapatos da falecida. O ambiente da casa é um tanto mórbido, com muitas fotos e pouca luz, como se fosse um autêntico filme de fantasma - como de fato é. De certa forma, Fernando gosta de viver naquela penumbra, imerso nas lembranças de um casamento perfeito em sua idealização. No entanto, tudo muda quando ele encontra entre os VHS da esposa uma filmagem dela num motel dizendo ao amante que ele é a melhor coisa que aconteceu na vida dela. A expressão de Fernando muda e o que era saudade torna-se algo muito mais difícil de explicar. Ele parte na jornada em busca do amante da esposa e o encontra. Um mecânico, ex-presidiário e evangélico chamado Salvador (Lourinelson Vladimir), do qual se aproxima - não apenas dele, mas também de sua família composta pela esposa Raquel (Mayana Neiva, ótima), a filha adolescente (Giuly Biancato) e uma menina de três anos. Embora todos considerem Fernando um sujeito estranho, de poucas palavras, ele se envolve cada vez mais na rotina da família, sustentando o filme na suspeita de que ele poderá cometer alguma atrocidade. Quem espera um suspense que explode em violência irá se decepcionar, já que o roteiro investe em poucos diálogos e muita sugestão durante a narrativa. Existe uma bela construção em cada cena, do enquadramento, ao movimento de câmeras, passando pelos gestos, longos silêncios e olhares sutis do elenco (que flerta com o estranhamento e a sedução, sobretudo nas cenas protagonizadas pelos dois homens - que exalam uma mistura precisa de atração e repulsa, de lembranças e mágoas sustentadas pelas expressões sugestivas de Fernando). Lentamente bem construído, Para Minha Amada Morta opta pelo caminho mais difícil do gênero: sufocar a energia de seu protagonista até o sepultamento definitivo, que pode ser doloroso, mas primordial para que a vida dos sobreviventes prossiga. Aly Muritiba criou um forte candidato a melhor filme brasileiro do ano. 

Para Minha Amada Morta (Brasil/2016) de Aly Muritiba com Fernando Alves Pinto, Lourinelson Vladimir, Giuly Biancato, Michelle Pucci e Vinicius Sabag. ☻☻☻☻