segunda-feira, 22 de abril de 2019

Na Tela: Suspiria

Dakota (ao centro) e suas colegas: o que a arte evoca? 

Ninguém refilma um clássico querendo sair ileso. Bem, pelo menos eu acredito nisso. Espero que o italiano Luca Guadagnino também, afinal, depois da aclamação absoluta de seu trabalho em Me Chame Pelo Seu Nome (2017) - que recebeu quatro indicações ao Oscar (filme, ator, canção e levou o de roteiro adaptado) o diretor me inventou de refilmar Suspiria (1977) de Dario Argento. Enquanto um bando de cinéfilos se dividiam entre a expectativa e a desconfiança eu só me perguntava o que Guadagnino tinha na cabeça. Sou do tempo que Suspiria era chamado de trash, o que não o impediu de se tornar um cult do gênero com exibições reservadas para as madrugadas. A história do filme de Argento era bastante simples: uma aluna americana resolve estudar em uma companhia de dança alemã. Chegando lá (debaixo de um baita temporal) ela se depara com uma colega surtada e, aos poucos, percebe que existe algo de muito estranho naquele lugar. Dali em diante, o filme apresentará um trabalho de cores interessantíssimo, além de locações internas que impressionam e... mortes macabras ao longo de toda a sessão. Com fãs fiéis, Guadagnino tinha uma verdadeira batata quente nas mãos. Quando comecei a assistir ao filme percebi que ele não estava nem aí para o suspense do original, já declarando logo no início que existem bruxas naquela escola. O interesse do diretor está em outro ponto: criar um espetáculo de horror elegante até desabar na sanguinolência mais bizarra dos últimos tempos. Guadagnino sempre foi conhecido por sua preocupação com a estética, com a forma e a beleza de seus filmes. Em cena, tudo precisa ser perfeito aos seus olhos. O que deixa a escolha de recriar um filme de terror ainda mais interessante. A história é praticamente a mesma com a chegada da  nova aluna (Dakota Johnson) na tal escola, só que o diretor incrementa mais ainda a história. Cria flashes sobre o passado desta garota (que no original nem existia) e amplia um personagem pequeno do filme anterior, que desta vez recebe um verniz histórico. O contexto histórico parece ser uma grande preocupação do diretor, já que ele insere até comentários sobre o grupo Baader Meinhof  na trama. De resto, ele desfia lentamente o cotidiano daquele lugar, arranha um pouco nos conflitos, nos egos (coloca Tilda Swinton em três papéis diferentes), mas sem perder de vista que existe algo de muito sinistro, sobretudo quando você percebe que aqueles números de dança conjuram feitiços e maldições. Sei que muita gente irá perder a paciência com as duas horas e trinta minutos do filme (o original tinha pouco mais de hora e meia de projeção), com a lentidão de algumas cenas e, principalmente, com o desfecho que é uma ode pagã sangrenta... Guadagnino se distanciou o máximo que pode daquele clássico do terror e criou um filme totalmente diferente. Ele aprofunda algumas questões, cria outras para abandonar ao longo do caminho e alcança um resultado que soa como um extenso pesadelo (que funcionaria melhor se algumas maquiagens não parecessem ser feitas da borracha mais descarada). Fiquei com o filme na cabeça por um bom tempo e com a trilha sonora tristonha de Thom Yorke ecoando na minha cabeça por dias. Enfim, um assombro. 

Suspiria - A Dança da Morte (Suspiria / EUA-Itália / 2018) de Luca Guadagnino com Dakota Johnson, Tilda Swinton, Chloe Grace-Moretz, Angela Winkler, Alek Wek, Elena Fokina e Mia Goth. ☻☻☻☻ 

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