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Grant: labirinto retórico que funciona. |
Duas jovens mórmons (Sophie Tatcher e Chloe East) batem de porta na busca novos fiéis para sua religião. Entre ridicularizações que parecem testar a fé das duas, elas costumam conversar nas visitas que realizam afim de esclarecer dúvidas que possam ter sobre a religião da qual são devotas. Elas nem imaginam no início de uma terrível tempestade elas baterão na porta de Mr. Reed (Hugh Grant). Ele mostra-se bastante simpático e receptivo, até menciona que a esposa fez uma torta para receber as meninas. Conversa vai, conversa vem, a mulher do homem nunca aparece. As perguntas parecem cada vez mais provocativas e algumas mentiras, do antes simpático Mr. Reed, começam a ser reveladas. Durante a melhor parte de Herege, o que temos é uma interessante discussão sobre religião e fé. O trio principal deixa a conversa sempre estimulante e constrói um elaborado labirinto retórico aos olhos e ouvidos do espectador. Os diretores Bryan Woods e Scott Beck conseguem manter o interesse do espectador em uma tensão crescente que desperta aquela curiosidade por onde aquela situação irá chegar. Os dois têm o crédito por participarem da elaboração de Um Lugar Silencioso (2018), mas também possuem culpa no cartório por estrearem na direção com aquela bomba Ameaça Pré-Histórica (2023) estrelada por Adam Driver. Isso diz um pouco sobre a estrutura do filme, que vai muito bem até um pouco além da metade, mas se perde quando começa a delirar demais, deixando o suspense e a bela retórica de lado e descamba para um terror de apelo trash. Deixa a impressão de que os dois não acreditavam que o filme daria conta do recado somente com as reflexões que provocam nas duas devotas (e na plateia) que se veem prisioneiras do jogo doentio de um homem misterioso. É verdade que os jovens talentos de Sophie Tatcher e Chloe East tem papel importante em nosso envolvimento com a história, afinal, nos importamos com as duas desde a primeira cena. No entanto, os maiores elogios foram para Hugh Grant. Muitos críticos consideraram que a melhor interpretação da carreira do veterano está neste filme. Indicado a vários prêmios por sua performance (incluindo o BAFTA, o Critic's Choice e Globo de Ouro) é interessante ver como o ator, que figurou entre os maiores galãs da Inglaterra dos anos 1990 soube assumir as rugas e os cabelos brancos, sabendo reconfigurar seu sorriso e expressões para dar vida a um tipo tão ameaçador. Obviamente que o ator utiliza seu charme de sempre para convencer aquelas meninas de que não é um mal sujeito, para logo depois, mostra-se um completamente insano. Essas oscilações do personagem faz até a plateia esquecer das escorregadas que o filme possui para criar um desfecho tão elaborado quanto insatisfatório. Herege seria um filme muito melhor se mantivesse sua discussão sobre a escolha de uma religião e a fé envolvida nisso.
Herege (Heretic / EUA - Canadá / 2024) de Bryan Woods e Scott Beck com Hugh Grant, Sophie Tatcher, Chloe East, Topher Grace, Elle Young e Elle McKinnon. ☻☻☻
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