Fernando: o sepultamento da esposa idealizada.
Posso dizer que Fernando Alves Pinto é um dos raros atores de cinema do Brasil. Com vinte e cinco longas no seu histórico, o sobrinho do Ziraldo é um dos poucos atores que são associados diretamente à sétima arte em nosso país. Aos 46 anos (embora ainda pareça ter bem menos), Fernando tem a sua atuação mais sombria e multifacetada neste suspense dramático do diretor Aly Muritiba. O filme recebeu vários elogios e prêmios em festivais (só no Festival de Brasília ganhou seis, incluindo pra o ator e diretor). Para Minha Amada Morta é bastante introspectivo ao contar a história de Fernando, um jovem viúvo que cuida do filho pequeno e alimenta a saudade da esposa assistindo vídeos e cultuando as roupas e sapatos da falecida. O ambiente da casa é um tanto mórbido, com muitas fotos e pouca luz, como se fosse um autêntico filme de fantasma - como de fato é. De certa forma, Fernando gosta de viver naquela penumbra, imerso nas lembranças de um casamento perfeito em sua idealização. No entanto, tudo muda quando ele encontra entre os VHS da esposa uma filmagem dela num motel dizendo ao amante que ele é a melhor coisa que aconteceu na vida dela. A expressão de Fernando muda e o que era saudade torna-se algo muito mais difícil de explicar. Ele parte na jornada em busca do amante da esposa e o encontra. Um mecânico, ex-presidiário e evangélico chamado Salvador (Lourinelson Vladimir), do qual se aproxima - não apenas dele, mas também de sua família composta pela esposa Raquel (Mayana Neiva, ótima), a filha adolescente (Giuly Biancato) e uma menina de três anos. Embora todos considerem Fernando um sujeito estranho, de poucas palavras, ele se envolve cada vez mais na rotina da família, sustentando o filme na suspeita de que ele poderá cometer alguma atrocidade. Quem espera um suspense que explode em violência irá se decepcionar, já que o roteiro investe em poucos diálogos e muita sugestão durante a narrativa. Existe uma bela construção em cada cena, do enquadramento, ao movimento de câmeras, passando pelos gestos, longos silêncios e olhares sutis do elenco (que flerta com o estranhamento e a sedução, sobretudo nas cenas protagonizadas pelos dois homens - que exalam uma mistura precisa de atração e repulsa, de lembranças e mágoas sustentadas pelas expressões sugestivas de Fernando). Lentamente bem construído, Para Minha Amada Morta opta pelo caminho mais difícil do gênero: sufocar a energia de seu protagonista até o sepultamento definitivo, que pode ser doloroso, mas primordial para que a vida dos sobreviventes prossiga. Aly Muritiba criou um forte candidato a melhor filme brasileiro do ano.
Para Minha Amada Morta (Brasil/2016) de Aly Muritiba com Fernando Alves Pinto, Lourinelson Vladimir, Giuly Biancato, Michelle Pucci e Vinicius Sabag. ☻☻☻☻
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