quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

PL►Y: Aftersun

 
Frankie e Paul: costurando memórias

Retomando as atividades por aqui após um mês de descanso, acho bastante justo que o primeiro filme a comentar em 2023 seja Aftersun, que está em cartaz na MUBI após o lançamento em alguns cinemas brasileiros. O filme de estreia da cineasta Charlotte Wells já carrega o título de um dos mais elogiados do ano passado e conseguiu cravar uma aguardada indicação de melhor ator para o irlandês Paul Mescal no Oscar desse ano. Muitos aguardavam a presença do filme em outras categorias, mas levando em consideração a dificuldade da Academia em lidar com a linguagem um tanto difusa da montagem, já era de se esperar uma certa esnobada. O fato é que Aftersun se desenvolve como uma espécie de quebra-cabeças, com pedaços que parecem antigos registros e lembranças das férias na Turquia de um pai e uma filha. Mescal é responsável por dar vida a Calum, um rapaz que se tornou pai cedo e aos trinta anos precisa lidar com a distância da filha, a falência do relacionamento com a mãe da menina, o término de um namoro recente, uma vida financeira que não vai muito bem e o passar do tempo trazendo mais dúvidas do que certezas. No entanto, as férias planejadas com a filha Sophie (muito bem interpretada por Frankie Corio) parecem programadas para dissipar tudo isso e render bons momentos ao lado dela. O roteiro deixa aqui e e ali uma ideia do crescimento de Sophie, que começa a voltar seus olhos para os namoros que estão ao seu redor e nota que embora esteja próxima fisicamente dos pais naqueles dias, algo os distancia - o que fica bem representado naquela cena em que ela está na sala e ele no banheiro tentando tirar o gesso do braço, na cena em que ela o convida para cantar Losing my Religion do R.E.M. (ressignificada com brilhantismo pelo roteiro) ou todas as demais em que ele se vê distante da menina e a face das adversidades que Calum atravessa surgem sem máscaras de bem estar. A opção de fazer de Aftersun um filme de narrativa pouco óbvia, deixa o espectador com um nó na garganta quando percebe o que acabou de presenciar. Confesso que é um tipo de filme que passei a gostar mais no decorrer dos dias, em que o refiz na minha cabeça e compreendi o teor emocional de tudo que testemunhamos ao longo da sessão, especialmente as alegóricas cenas da rave. No final das contas, o filme é um olhar tão sensato quanto astuto sobre o passado e a busca por respostas que talvez nunca tenhamos. (Cuidado SPOILER!) A ideia de que o que vimos foram dias de uma despedida se torna mais forte quando lembramos daquela cena em que o pai caminha para o mar na escuridão da noite. 

Aftersun (Reino Unido - EUA / 2022) de Charlotte Wells com Paul Mescal, Frankie Corio, Spike Fearn, Harry Perdios e Brooklyn Toulson. ☻☻

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