Mason: no início, aos cinco anos...
Outro filme aguardado presente no Festival do Rio 2014 é Boyhood (com estreia nacional prevista para dia 30 de outubro) que é saudado como mais do que um filme, mas um verdadeiro experimento cinematográfico. Embora o cinema de vez em quando crie documentários sobre pessoas comuns que crescem diante de uma filmagem, o diretor Richard Linklater teve a ideia de criar um filme de ficção com base na mesma premissa. Linklater trabalha no filme há doze anos. No entanto, somando todos os dias de filmagem, o filme consumiu 39 dias de filmagem, já que o diretor utilizava três ou quatro dias filmando por ano. No entanto, deve existir toneladas de material extra que ficou de fora do resultado final (e nem conte que caberão nos extras de um DVD). Em seus 163 minutos, seria pouco dizer que o diretor conta a história do menino Mason (Ellar Coltrane), quando na verdade, Boyhood é sobre o passar do tempo, as tristezas, alegrias e as lembranças que carregamos ou deixamos pelo meio do caminho. Parece cerebral demais? Pois tudo que Linklater quer é não ser cerebral, pelo contrário, seu filme poderia resultar numa espécie de releitura de Forrest Gump/1994 se a trama se apegasse demais aos fatos históricos ocorridos no período, no entanto, o diretor opta por deixar esses acontecimentos como detalhes - que assim como a onipresente música pop ou os livros de Harry Potter, servem para localizar o espectador no tempo e no espaço, tanto quanto o envelhecimento inevitável de seus atores diante da câmera. Da mesma forma, evita manobras como doenças terminais, falcatruas, crimes ou romances impossíveis que poderia desviar o foco diante de sua ideia principal. Mason vive com a mãe (Patricia Arquette) e a irmã (Lorelei Linklater), vendo o pai músico (vivido por Ethan Hawke) de vez em quando. Quando o filme começa, Mason tem cinco anos e pouca coisa para se preocupar. Com o passar do tempo precisa lidar com uma mudança de endereço, o novo casamento da mãe, o primeiro amor, o primeiro emprego, a independência financeira da matriarca, o gosto pela fotografia e termina com sua chegada à faculdade. Durante a narrativa não existem vilões, apenas alguns personagens pontuais que servem para que Mason aprenda a se impor como indivíduo no mundo. É uma experiência cinematográfica única, especialmente porque vemos como os próprios atores mirins crescem não apenas fisicamente, mas como interpretes diante da câmera. Da espontaneidade infantil passamos para o constrangimento adolescente e, conforme a narrativa avança, eles conseguem transmitir personalidade aos personagens (ainda que não saibamos, por exemplo, onde termina Ellar e começa Mason). Obviamente que a mídia clama que o filme marque presença nas premiações de fim de ano e ele tem chances, principalmente pela identificação inevitável de qualquer mortal com o menino que precisa tornar-se homem, ou de sua irmã que passa por processo semelhante - ou a mãe que também busca seu lugar no mundo (ainda que seja adulta). Linklater tem fortes chances de ser lembrado pelo seu esforço e determinação de conduzir seu processo de criação (que resulta bastante realista), mas acho que somente Patricia Arquette tem força para ser lembrada nas categorias das premiações. Sei que o filme de Linklater é mais do que qualquer estatueta dourada, mas ficaria muito feliz de ver Patricia celebrada como um dos nomes mais promissores dos anos 1990 - e que foi mais reconhecida na TV do que no cinema. Lidando com atores inexperientes a maior parte do tempo, ela serve como ótimo elemento para alinhavar as atuações dentro da proposta do diretor. Sua última cena é tão memoravelmente forte que instala um verdadeiro espectro na cabeça de Mason e da plateia. Boyhood tem uma ideia ambiciosa, mas funciona justamente pelo trato simples ao lidar com a magia do passar do tempo. O efeito é o mesmo que observar a areia de uma ampulheta projetada numa tela de cinema.
No final (de beca): aos dezoito.
Boyhood (EUA-2014) de Richard Linklater com Ellar Coltrane, Patricia Arquette e Lorelei Linklater. ☻☻☻☻
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