Irene e Jean-Louis: o brilhante arremate da trilogia das cores.
Fechando a trilogia das cores com chave de ouro, A Fraternidade é Vermelha se tornou um dos filmes mais queridos dos anos 1990. Krzysztof Kieslowski fez uma verdadeira cereja para o bolo com uma história de amizade improvável que consegue costurar as várias emoções apresentadas nos filmes anteriores (incluindo um brilhante arremate envolvendo todos os seus protagonistas de forma tão emocionante quanto inesperada). Se em A Liberdade é Azul (1992) a tristeza dava o tom e em A Igualdade é Branca (1993) a ironia tomava conta, com A Fraternidade é Vermelha o diretor apresenta uma história mais otimista e, ao mesmo tempo, com um verniz um tanto metafísico na figura do juiz solitário vivido por Jean-Louis Trintignant. O filme gira em torno de Valentine (Irene Jacob), uma modelo cheia de compromissos e presa à história de amor que nunca avança mediante as constantes ligações telefônicas. Em uma noite ela se distrai e acaba atropelando um cachorro. Sem saber o que fazer, ela procura o dono do animal, um homem de idade que vive isolado e que não demonstra o mínimo interesse em ter seu animal de estimação de volta. Valentine acaba levando o bicho para a veterinária e o adotando, ainda mais quando descobre que em breve nascerão alguns filhotes. Ela acaba reencontrando aquele senhor mais uma vez e descobre que ele guarda um segredo bastante desconfortável ligado aos seus vizinhos e... se eu contar mais estragarei todas as surpresas que o filme reserva. O relacionamento entre os dois protagonistas inicia com um conflitos moral e ético, mas que logo segue por caminhos inesperados, que revelam o quanto uma amizade pode alterar a visão de mundo entre as pessoas. Na pele do ex-juiz Joseph, Trintignant tem uma atuação excepcional, especialmente na forma como seu personagem caminha do distanciamento que mantinha para o renascimento de uma fé na humanidade que ele julgava não ter mais fundamento. O momento mais sombrio de seu personagem funciona em ótimo contraste com a interpretação de Irene Jacob na pele da doce Valentine. Desde a primeira cena percebemos que a moça tem um bom coração, embora não encontre quem o valorize. É uma bela observação do cineasta inserir sua protagonista espirituosa no mundo fashion que é geralmente visto como frívolo e fútil por seu vínculo com as aparências. O papel cai como uma luva pra a a atriz suíça que havia trabalhado com Krzysztof Kieslowski em A Dupla Vida de Veronique (1990) e aqui confere alma quase angelical para a personagem - o que torna fácil entender a empatia que desperta no endurecido juiz. Para além de tudo isso a trama trabalha com várias coincidências que aos poucos deixam a impressão que não aconteceram por obra do acaso (o que pode promover diversas leituras sobre o próprio personagem de Trintignant, sua influência na vida das pessoas e suas verdadeiras intenções em casa situação que surge na história). Confesso que faço uma leitura bastante particular do filme e que não escreverei aqui para não soar muito viajante ou estragar o que o filme pode ter de mais surpreendente. A Fraternidade é Vermelha foi o filme mais bem sucedido da trilogia das cores e foi indicado a três prêmios: direção, roteiro original e fotografia (graças ao magnífico tom de vermelho que Piotr Sobocinski insere em cada cena). Adoro.
A Fraternidade é Vermelha (Trois Couleurs: Rouge / Suíça - França - Polônia) de Krzysztof Kieslowski com Irene Jacob, Jean-Louis Trintignant, Jean-Pierre Lorit, Teco Celio, Samuel Le Bihan e Frédérique Feder. ☻☻☻☻☻
Nenhum comentário:
Postar um comentário