Margus e Ivo: a guerra sob o olhar de dois homens comuns.
Tangerinas ficou famoso por ser o primeiro filme da Estônia a concorrer ao Oscar de filme estrangeiro. Antes ele já havia recebido prêmios em festivais e tornou-se uma espécie de unanimidade entre a crítica pela forma simples em que constrói um pequeno manifesto contra a guerra. Impressiona a forma como o diretor Zaza Urushadze cria em menos de uma hora e meia uma história vigorosa com poucos personagens em cena e diálogos que possuem grande clareza em transmitir uma ideia. A história acontece nos anos 1990 durante a guerra da Geórgia, mais precisamente na região de Apkhazeti, onde a maioria dos moradores fugiram de suas casas por conta dos embates entre tchetchenos e georgianos. No entanto, dois moradores locais se despediram de suas famílias e permaneceram em suas casas. Margus (Elmo Nüganen) pretende sair dali logo após que colher as tangerinas que amadurecem em sua plantação, ele conta com a companhia do amigo e vizinho Ivo (Lembit Ulfsak), que constrói as caixas de madeira para que as tangerinas sejam transportadas. Os dois irão testemunhas um embate sangrento perto de suas casas e Ivo acolherá dois feridos em sua casa, dando início a uma tensão que não esperava presenciar, afinal o tchetcheno Ahmed (Giorgi Nakashidze) não vê a hora de eliminar o inimigo georgiano Nika (Misha Meskhi) que encontra-se inconsciente. A história evolui sem pressa, a partir das reflexões que Ivo instiga em seus dois hóspedes, afinal o que torna sagrado tirar uma vida? Quem deu o direito para que um homem possa tirar a vida de outro? Mas a pergunta que fica na mente do espectador é: será que dois homens endurecidos pela guerra serão capazes de conviver sobre o mesmo teto? O embate entre dois senhores comuns que apenas tentam viver em meio aos escombros da guerra e dois homens de guerra já vale o filme. Esse confronto de perspectivas é conduzido sem pieguices pelo diretor, revelando a humanidade que estava escondida nos dois homens enfurecidos. Vale destacar o ótimo elenco guiado pelo diretor, com menção honrosa para a atuação de Lembit Ulfsak, um senhor tão ciente de suas convicções que funciona como excelente mediador de um verdadeiro purgatório para Ahmed e Nika. No desfecho, a total ausência de lógica de uma guerra invade a realidade dos personagens mais uma vez e revela que todas as diferenças entre os inimigos são apenas ilusórias. Tangerinas é um filme modesto que tem total consciência da força de sua história e, por isso mesmo, merece todo o respeito - e em tempos de intolerância merece ser descoberto.
Tangerinas (Mandariinid/Geórgia-Estonia/2013) de Zaza Urushadze com Lembit Ulfsak, Giorgi Nakashidze, Elmo Nüganen, Misha Meskhi e Raivo Trass. ☻☻☻☻☻
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