Ganhador do Leão de Prata no Festival de Veneza deste ano e indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, o italiano A Mão de Deus ambiciona uma vaga nesta mesma categoria no Oscar que se aproxima. Lançado aqui pela Netflix o filme chama atenção para quem conhece os filmes anteriores de Paolo Sorrentino, o oscarizado A Grande Beleza (2013) e A Juventude (2015) - este seu primeiro filme em língua inglesa - mas tem pouca relação com estes dois. O filme marca o retorno do cineasta à sua cidade natal, Nápoles, local em que não filmava desde a sua estreia em 2001 e ainda carrega a expectativa de trazer vários pontos inspirado em sua própria vida. No entanto é melhor calibrar as suas expectativas, já que o filme é bastante irregular em suas ambições. Mistura uma família "excêntrica", com futebol, a passagem para vida adulta, erotismo, uma tragédia pessoal numa verdadeira colagem de situações que não chega a ter uma cadência envolvente. Geralmente acusado de se preocupar mais com a forma do que o conteúdo dos seus filmes, aqui Sorrentino parece querer abraçar tudo o que a vida é capaz de proporcionar ao seu jovem protagonista, mas infelizmente deixa de lado a elegância que costuma estampar seus filmes. A trama é ambientada nos anos 1980 e gira em torno do adolescente Fabietto (Filippo Scotti que parece o irmão caçula do Timothée Chalamet), que vive com o pai, Saverio (Toni Servillo), a mãe (Teresa Saponangelo) e o irmão (Marlon Joubert) num apartamento em Nápoles. Enquanto o irmão sonha em ser ator, Fabietto quer ser filósofo e depois cineasta. O jovem é apaixonado por uma tia problemática (Luisa Ranieri) e por futebol, o que fica bastante evidente com a promessa da compra do craque Maradona para o seu time. Sorrentino tem o hábito de citar vários filmes italianos clássicos e aqui ele se utiliza de muitas referências de comédias familiares espalhafatosas, mas também apela para um forte teor de comédias picantes. Em alguns momentos fica difícil se equilibrar entre o bom senso e a vulgaridade principalmente nas cenas em que o filme apela para a exposição física da tia do rapaz e também na primeira experiência sexual do menino. O gosto duvidoso também aparece em algumas cenas de humor, como os comentários quando a tia obesa vai mergulhar ou do convidado que precisa de um aparelho para conseguir conversar (e o que acontece com ele é no mínimo lamentável). O título faz uma alusão ao histórico gol de Maradona contra a Inglaterra, mas também a um fato que muda a vida do protagonista para sempre. Quando o filme faz sua guinada dramática, ele parece ficar ainda mais disperso, dependendo muito da habilidade do diretor para construir suas cenas com auxílio de uma belíssima fotografia. Entre tantos tipos caricatos que cercam o rapaz, o meu personagem favorito acabou sendo o Marchino, o irmão mais velho de Fabietto. Indo contra o tom que na maioria das vezes soa tão postiço, o ator Marlon Joubert tem uma discreta e importante participação como um território seguro para as inseguranças do seu irmão, pena que a bela relação dos dois é pouco explorada. Quando chega ao final, A Mão de Deus se revela uma verdadeira colagem de ideias variadas (ou seriam memórias?), mas faltou uma forma mais sutil de costurá-las. Em cartaz na Netflix, o filme também conta com um pequeno documentário de Sorrentino falando um pouco sobre seu retorno à Nápoles e alguns pontos de inspiração, mas não melhora em nada a minha frustração com este filme.
A Mão de Deus (È Estata la mano di Dio/Itália - 2021) de Paolo Sorrentino com Filippo Scotti, Toni Servillo, Teresa Saponangelo, Marlon Joubert, Luisa Ranieri, Renato Carpentieri, Massimiliano Gallo e Betty Pedrazzi. ☻☻
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