domingo, 30 de janeiro de 2022

PL►Y: Cala boca, Phillip!

  
Moss e Jason: comédia sobre o insuportável.  

Alex Ross Perry é um nome ascendente no cinema independente americano, no entanto, seus filmes propõem um verdadeiro desafio ao espectador: acompanhar até o final a jornada de um personagem insuportável. É uma proposta não apenas interessante, mas também, corajosa, já que a possibilidade de seus filmes serem detestados por conta dos protagonistas é grande. Por aqui, o título nacional (para o mais brando Listen Up, Phillip) já deixa claro a postura que a plateia terá com o jovem escritor vivido por Jason Schwartzman. Jason é Phillip Lewis Friedman, novelista que começa a chamar atenção de público e crítica, mas que enfrenta problemas para elaboração de sua nova obra. Num roteiro tradicional, nós ficaríamos envolvidos com o drama do rapaz e torceríamos para que ele conseguisse superar seu bloqueio criativo, mas aqui o texto de Perry vai para o caminho oposto. Arrogante e egocêntrico, Phillip sente-se melhor atacando qualquer pessoa que atravessa seu caminho, isso inclui amigos, ex-namoradas e até a namorada, Ashley (Elisabeth Moss), que achava graça da postura enfezada do parceiro até que a relação começa a ficar mais pesada e difícil de sustentar.  Cala boca, Phillip parece então ser uma brincadeira ácida com os bastidores de um escritor cheio de pretensões, mas que é uma pessoa difícil de querer encontrar por aí. O humor brota justamente da postura exagerada de Phillip com tudo e todos que o cerca e ganha outra camada quando ele encontra uma espécie de versão mais velha dele mesmo, o renomado escritor Ike Zimmerman (Jonathan Pryce), que se torna um espécie de mentor para ele. Ike poderia destilar ensinamentos nobres para o seu discípulo, mas ele não difere muito da postura de Phillip perante o mundo. Se você já achava chato o filme com um Phillip, com a chegada de Ike na narrativa, toda arrogância e prepotência do filme é elevada ao quadrado - ao ponto que em alguns momentos o próprio protagonista percebe que alguns limites estão sendo ultrapassados, principalmente quando consegue enxergar o mentor pelos olhos da filha negligenciada, Melanie Zimmerman (Krysten Ritter). Cala boca, Phillip tem um roteiro que foge dos padrões ao ser narrado como se fosse em si uma obra literária que amplia seu universo conforme apresenta seus personagens. Em vários momentos, a jornada de Phillip cede espaço para outros, mas sempre evitando julgamentos sobre suas posturas, deixando a cargo do espectador perceber  onde residem os problemas. A fotografia granulada, figurinos, ambientações e fontes dos créditos, remetem diretamente ao cinema dos anos 1970 enquanto a linguagem lembra muito a dos primeiros filmes de Noah Baumbach (que também eram chegados à misantropia) e os primórdios de Woody Allen (mas sem a autocrítica neurótica), demonstrando que Perry é um diretor cuidadoso, embora a maioria da plateia possa estranhar seu senso de humor tão ácido quanto afiado. 

Cala Boca, Phillip! (Listen Up, Phillip / EUA -2014) de Alex Ross Perry com Jason Schwartzman, Elisabeth Moss, Jonathan Pryce, Krysten Ritter, Jess Weixler, Daniel London e Teddy Bergman.☻☻ 

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