segunda-feira, 14 de agosto de 2017

CATÁLOGO: Os Sonhadores

Pitt, Eva e Louis: o triângulo amoroso de Bertolucci. 

Fazia tempo que um filme do diretor italiano Bernardo Bertolucci não chamava tanta atenção da mídia. Desde que O Pequeno Buda (1993) encerrou sua grandiloquente trilogia oriental com críticas mornas, o diretor voltou para a Europa em busca de produções mais modestas e intimistas. Beleza Roubada (1996) e O Assédio (1998) mostrava que ele voltava às suas origens na busca de personagens que buscavam a si mesmos - tendo o desejo como um poderoso verniz de suas narrativas. Em Os Sonhadores (2003) ele vai mais longe no erotismo e deixa a impressão de que sua intenção era revisitar o seu clássico O Último Tango em Paris (1972) com um elenco jovem e, não por acaso, as tramas de ambos os filmes se passa isolada num apartamento em um período bastante libertário. Ambientado em 1968, Os Sonhadores é baseado no livro de Gilbert Adair e conta a história de dois irmãos e um amigo que se conhecem em meio às manifestações estudantis de Paris. Os protestos ficaram famosos por motivarem debates sobre reformas educacionais na França e instigarem trabalhadores a realizarem uma greve geral que marcou a história política da França. Em meio aos protestos havia também um discurso de liberação sexual que era considerado bastante avançado para época. Os protestos tem papel importante no filme de Bertolucci, já que são eles que aparecem no início fazendo com que o estudante americano Matthew (Michael Pitt) conheça os irmãos franceses Isabelle (Eva Green) e Theo (Louis Garrell). O amigo é acolhido pela família dos irmãos e sua presença se torna constante na casa, especialmente quando os pais do casal (vividos por Anna Chancellor e Robin Reuncci) viajam e os três constroem um mundo a parte. Bertolucci cria então um triângulo amoroso incomum, afinal, existe uma atração sexual explícita entre os três personagens, tornando Matthew cada vez mais um objeto do desejo de ambos. Em alguns momentos o filme deseja ser uma homenagem aos clássicos do cinema (sob o pretexto de uma brincadeira estabelecida pelos três personagens vários trechos de obras consagradas aparecem durante o filme), assim, parece que Bertolucci glamourizar essa atração no início para depois a envolver num cenário cada vez mais caótico - repare como o apartamento se deteriora aos poucos, tornando-se mais sujo e desorganizado. No entanto, tudo parece um tanto frouxo na história, tornando a narrativa irregular enquanto esgarça aquela relação ao limite - e, ironicamente, o que os salva é justamente quando a realidade invade o ambiente em que se isolaram. O que mais impressiona durante o filme é a desenvoltura do elenco em ficar sem roupa diante de câmera - o que foi suficiente para transformar Eva Green em símbolo sexual instantâneo, o que não foi suficiente para que aparecessem papeis marcantes em sua carreira (ela apareceu como a melhor Bondgirl de todas em Cassino Royale/2006 para depois ter o papel de sua vida na série Penny Dreadful/2014-2016). Michael Pitt também se destaca e mostrou que deixava de ser um adolescente estranho para se tornar um ator de verdade, já Garrell tem o mesmo ar blasé de sempre (seja com ou sem cueca). No fim das contas, Os Sonhadores é um filme sobre perda da inocência ambientado numa época em que ocorreu exatamente isso ao redor do mundo.

Os Sonhadores (The Dreamers / Reino Unido-França-Itália / 2003) de Bernardo Bertolucci com Eva Green, Michael Pitt, Louis Garrell e Anna Chancellor. ☻☻

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