Rebecca: atuação digna de Oscar.
Pena que sem encontrar espaço nas salas brasileiras, este filme seja lançado somente em streaming por aqui. Mesmo que seja bem realizado e traga uma atuação precisa da inglesa Rebecca Hall é fácil entender o motivo de Christine ter perdido espaço nas premiações: o filme é facilmente um dos filmes mais depressivos do ano passado. O novaiorquino Roberto Campos consegue fazer um retrato bastante metódico, contido e perturbador da história de Christine Chubbuck, jornalista que trabalhava em um noticiário local da Flórida e que se suicidou ao vivo numa transmissão em 15 de julho de 1974. O roteiro de estreia de Craig Shilowich (assistente de produção do ótimo Rio Congelado/2008) tenta evitar as respostas fáceis sobre o que levou a sua personagem real ao seu ato e, com a preciosa ajuda de Rebecca, o filme consegue montar uma rede de relações e sensações que teriam motivado a jornalista a querer acabar com a própria vida. Desde o início não fica claro qual foi a situação desagradável que a personagem atravessou antes de decidir se mudar para a Flórida, também existe um pequeno problema de saúde em sua vida, o relacionamento com a mãe é sempre tenso, mas o que parece consumir Cristine de forma ainda mais intensa é sua relação com o trabalho. Desde a primeira cena percebemos um descompasso da pessoa que Christine ambicionava fazer e o que realmente fazia Ela tinha seus próprios ideais no trato com as notícias e o choque com o editor Michael (o também dramaturgo Tracy Letts, que anda se especializando em criar tipos antipáticos) era inevitável quando ele começou a notar o interesse do público em histórias de sangue e violência, sendo assim, começava a lógica de que para elevar a audiência o noticiário local não deveria temer se tornar uma carnificina. É visível o desconforto de Christine com a situação, some isso ao relacionamento discretamente platônico com o âncora local (Michael C. Hall) e a promessa de ir trabalhar em outro lugar e você terá uma ideia de como as expectativas e frustrações agiram sobre a jornalista. O filme trabalha dentro de um mecanismo bastante lento, mas que serve para que o espectador acompanhe aos poucos o desgaste que todo aquele universo provocou na protagonista - e a atuação introspectiva e profundamente emocional de Rebecca Hall chega a ser arrepiante. Hall sempre foi uma atriz interessante, mas este é provavelmente seu trabalho mais complexo e ela alcança cada detalhe que o roteiro lhe exige. Christine é mostrada de forma complexa, se equilibrando entre uma personalidade forte de inteligência notável, mas que ao mesmo tempo escondia uma fragilidade que lhe tomava aos poucos silenciosamente - tanto que quem estava ao seu redor não notaria o desfecho trágico (e irônico) que sua carreira teria. O impacto da situação inspirou o clássico Rede de Intrigas (1976) poucos anos depois. Curiosamente, ano passado também foi lançado Kate Plays Christine (2016), documentário sobre o trabalho da atriz Kate Lyn Sheil tentando reconstruir os conflitos da personagem, ou seja, mais de quarenta anos depois do primeiro suicídio ao vivo da televisão, Christine Chubbuck permanece um enigma dos mais perturbadores.
Christine (EUA/Reino Unido - 2016) de Roberto Campos com Rebecca Hall, Tracy Letts, Michael C. Hall, Maria Dizzia, Timothy Simons e Morgan Spector. ☻☻☻☻
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