domingo, 6 de outubro de 2019

Na Tela: Ad Astra

Brad: na solidão do universo. 

É curioso pensar que li O Coração das Trevas de Joseph Conrad no início deste ano por conta dele servir de inspiração para o clássico Apocalypse Now (1979) e, embora o livro seja bastante diferente do filme de Francis Ford Coppola, ambos se tornam ainda mais interessante pelos pontos que tem em comum. O mesmo pode se dizer de Ad Astra, filme produzido e estrelado por Brad Pitt e dirigido por James Gray que bebe na mesma fonte da guerra de Coppola, só que aqui, a trama é ambientada no espaço. O filme gira todo em torno de Roy McBride (Brad Pitt), um sujeito intimista, meio deslocado e que se dedica a ser astronauta na esperança de ficar bem longe da Terra e seus habitantes. Este desejo não deixa de ser uma influência do pai, H. Clifford McBride (Tommy Lee Jones) que fez história e se tornou famoso por conta de suas expedições para toda a distância que nosso sistema solar permitia. Explorando outros planetas, Clifford chegou até Netuno e perdeu-se contato com ele por muitos anos. Agora, diante de ondas de energia que tem causado estragos na Terra e nas bases instaladas em planetas vizinhos, chega-se à conclusão que Clifford está vivo e precisa ser encontrado para que estes sinais sejam impedidos. Para esta missão é escolhido Roy, principalmente pelo apelo emocional que pode ter junto ao pai, mas sua mensagem para o recluso astronauta só poderá ser enviada de Marte e a jornada de Roy começa. Na verdade ela já começou há tempos, desde que o pai partiu e deixou um enorme vazio que afetou para sempre sua relação com as outras pessoas, sobretudo com a esposa (Liv Tyler), sempre condenada a ficar em segundo plano diante das ambições do esposo. Brad Pitt tem aqui um dos maiores desafios de sua carreira, vivendo um personagem calado e intimista, o ator consegue demonstrar emoções com uma sutileza rara em sua carreira. Habituado a ser escalado para viver personagens expansivos e de charme quase irresistível, Brad demonstra aqui que o passar do tempo lhe fez muito bem! Aos 55 anos, demonstra ser um ator capaz de um trabalho complexo, cheio de camadas e Ad Astra se apropria não apenas de suas expressões, mas também de sua voz para dar conta de uma narrativa em off modular, como se fosse a voz de uma consciência sempre incomodada. Para ambientar a jornada de Roy, James Gray tem o cuidado de construir mundos dotados de beleza e estranhamento, que em alguns momentos parecem sonhos e em outros cópias frias de nosso planeta. No entanto, da Terra até Netuno,  a busca de Roy pelo pai, um sujeito que provoca temor e admiração (tal e qual o perturbado General Kurtz de Apocalypse Now) mostra-se bem mais grata do que a de Clifford que em busca do desconhecido, perdeu talvez o que poderia ter de mais precioso. Não por acaso é na solidão do espaço que Roy explora um território ainda mais complicado: ele mesmo.  

Ad Astra: Rumo às Estrelas (Ad Astra / EUA - 2019) de James Gray com Brad Pitt, Tommy Lee Jones, Donald Sutherland, Ruth Negga, Liv Tyler e Donnie Keshawarz. ☻☻☻☻

Nenhum comentário:

Postar um comentário