Banderas: belo reencontro com Almodóvar.
Foram os filmes mais coloridos de Pedro Almodóvar que apresentaram Antonio Banderas para o mundo. O ator tinha vinte e dois anos quando foi descoberto pelo cineasta espanhol em Labirinto de Paixões (1982). Depois os dois voltaram a trabalhar juntos em Matador (1986) e A Lei do Desejo (1987), além dos clássicos Mulheres a Beira de Um Ataque de Nervos (1988) e Ata-me (1989). Depois o astro enveredou por Hollywood e fez todo tipo de filme, filmes bons, filmes ruins, filmes muito ruins, sucessos... Almodóvar e Banderas só se reencontraram em 2011 com o excelente A Pele que Habito (2011). O diretor já era bem mais contido e Banderas sabia que o passar do tempo lhe exigia mais do que a pose de galã. Pena que Almodóvar tropeçou na parceira seguinte (Os Amantes Passageiros/2013, filme que nunca consegui assistir inteiro) e não o escalou para o insosso Julieta (2016). Os deuses do cinema queriam que os dois hispânicos se encontrassem novamente neste Dor e Glória (2019), filme que foi exibido em Cannes e rendeu ao ator o maior reconhecimento de toda a sua carreira: o prêmio de melhor ator. Foi merecido, já que Banderas apresenta uma atuação contida, melancólica e costura a narrativa mais pessoal e literária já construída pelo diretor. Dor e Glória avança quase em capítulos, apresentando seu protagonista para a plateia enquanto aparenta ir e voltar no tempo de suas memórias de infância. O astro vive Salvador Mallo, cineasta que obteve grande reconhecimento, mas que depois de enfrentar problemas com o protagonista de seu filme mais famoso, entrou para o ostracismo. Na verdade, o personagem sofre de dores crônicas em todo o corpo que só se agravaram com tempo. Tomando medicamentos pesados e passando por cirurgias, falta energia para se dedicar à arte. O filme se movimenta entre a costura do tempo de menino (Asier Flores) ao lado da mãe (Penelope Cruz) e o presente no contato com Alberto Crespo (Asier Etxeandia), ator famoso que roubou-lhe a cena no passado. Enquanto estes dois colocam os pingos nos is (com cenas de humor, drogas e algumas desavenças), Mallo está prestes a reencontrar um grande amor do seu passado (o argentino Leonardo Sbaraglia). Dor e Glória é a revisão de um homem sobre a vida, suas dores, amores, desejos e apresenta a narrativa mais pessoal e contida de Almodóvar. Nem precisa dizer que existe muito aqui de sua vida pessoal, mas na última cena ele deixa claro que existem momentos em que vida e arte se confundem, mas são dimensões diferentes. Faz tempo que o diretor deixou de lado o humor agudo (e da última vez que tentou retomá-lo, desafinou feio com Amantes Passageiros), mas algumas pessoas devem estranhar o tom que resolveu adotar neste filme e, quem não o conhece, irá estranhar a cena de nudez masculina frontal ou o beijo apaixonado entre dois personagens. A melancolia embalando o tom confessional faz de Dor e Glória um belo filme e, o melhor ainda, somente Almodóvar terminaria a história de um homem feito Salvador com um recomeço e não com uma despedida.
Dor & Glória (Dolor y Gloria / Espanha - 2019) de Pedro Almodóvar com Antonio Banderas, Penélope Cruz, Asier Etxeandria, Asier Flores, Leonardo Sbaraglia, Nora Navas, César Vicente, Cecilia Roth e Julieta Serrano. ☻☻☻☻
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