Lutz e Keegan: um filme dentro do personagem.
Premiado com o Palma Queer em Cannes, o incômodo Beleza é um filme que exige esforço da plateia para acompanhar os dramas de um homem de meia-idade que mantém uma vida dupla. Em uma delas é o senhor pai de família dedicado ao trabalho bem sucedido, à esposa e às duas filhas em uma vida confortável. Em sua outra vida é um homem que tenta sufocar seu desejo por outros homens. Para lidar com isso, participa de um grupo masculino que se encontra para satisfazer desejos secretos e frequenta consultas com um psicólogo. Ainda que seja difícil a vida no armário, quando vemos François (ótima atuação de Deon Lutz) na festa de casamento da filha, percebemos logo seu autocontrole. No entanto, sua alma fica exposta com o olhar de cobiça sobre o jovem filho de um amigo. A direção de Oliver Hermanus deixa claro que já existe uma pré-história quando François reencontra o filho crescido do amigo. Christian (Charlie Keegan) é apresentado numa sexualidade quase ambígua, afinal, mesmo com a atenção de todas as mulheres da festa, aproxima-se de François para demonstrar seu interesse em trabalhar com ele após terminar a faculdade de direito. O que pode ser visto como um interesse meramente profissional do rapaz, na mente sufocada de François se transforma em segunda intenções. É evidente que debaixo dos interesses do jovem Chris, existe um carinho pelo amigo de seu pai, mas François se agarra a isso para desenvolver uma espécie de obsessão pelo moço. Tanto que organiza viagens para visitar os pais de Christian, frustra-se quando descobre que ele não estará presente num churrasco organizado pelos pais, ruma para a praia quando sabe que ele está por lá, sente ciúme da filha ao vê-la fazendo companhia ao rapaz e organiza situações para que possa encontrá-lo sozinho. Hermanus começa seu filme com câmera fixa, numa serenidade que beira a irritação para em seguida chocar a plateia com cenas homoeróticas explícitas. Depois aumenta gradativamente uma tensão silenciosa para podermos ouvir os ruídos do protagonista sendo corroído por dentro... até que o desejo transborda em violência. É essa mudança brusca de tom que torna o filme interessante, é ela que deixa a sensação de que François está prestes a explodir. Beleza é um retrato um tanto perturbador sobre a repressão dos desejos e sobre a vida no armário - quando ele começa a ficar pequeno. Ainda que eu considere uma espécie de covardia deixar uma grande lacuna no final em que o protagonista parece andar em círculos. O filme consegue fazer um retrato interessante dos sentimentos de seu personagem com o auxílio do trabalho de Deon Lutz, que impregna de sentido cenas como a da lanchonete, onde a demonstração de seu interior aparece na vida de outras pessoas. Adepto de cenas fortes (que o deixa longe de ser um filme agradável de se assistir), Hermanus consegue realizar um trabalho corajoso.
Beleza (Skoonheid/África do Sul - França - Alemanha/2011) de Oliver Hermanus com Deon Lutz, Charlie Keegan, Michelle Scott, Albert Maritz e Morne Visser. ☻☻☻
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