Damon e Douglas: plumas, paetês e um pouco de pimenta.
Não é mais novidade dizer que a televisão americana serve de abrigo para projetos mais ousados do que os estúdios de Hollywood querem bancar. Cineastas renomados como Martin Scorsese (Boardwalk Empire) e Jane Campion (Top of The Lake) são alguns que se renderam ao poder da telinha em fazer mais bonito do que a telona. Quando Steven Soderbergh anunciou que levaria para a HBO o livro de Scott Thorson (Minha Vida com Liberace) todos os ouvidos se voltaram para ele. A polêmica relação do famoso pianista com o órfão garotão já garantiria destaque para produção, mas a coisa ganhou proporções ainda maiores quando os astros Michael Douglas e Matt Damon embarcaram no projeto. Tanta curiosidade e prestígio garantiu uma rara vaga televisiva na disputa da Palma de Ouro no Festival de Cannes desse ano. Vale lembrar que Soderbergh é um dos queridos do Festival, já que bem antes de Hollywood badalar o cinema independente, ele foi premiado por sua estreia em Sexo, Mentiras e Videoteipe (1989). Behind The Candelabra tem um excelente trabalho de reconstituição de época (valorizado ainda mais pela fotografia luminosa) e desde o início deixa claro que parte do olhar de Scott (Matt Damon) para abordar sua conturbada relação com Liberace. Scott era criado por pais adotivos que percebiam que a porta do armário estava aberta. É por intermédio do amigo Bob Black (Scott Bakula) que ele conhece Liberace (Michael Douglas) num show - e nem precisava de um gay radar de última geração para ver que entre plumas e purpurinas havia mais do que um pavão. O incrível é que o público do showman não poderia saber da homossexualidade de seu ídolo. Não demora muito para Scott ser convidado a visitar a casa de Lee (como gostava de ser chamado pelos mais íntimos) e sentir-se atraído por aquele universo quase paralelo (cheio de espelhos, jóias e brilhos), bem diferente da vida que levava na casa dos pais adotivos. Esse é o passo de um relacionamento que irá funcionar até que o egocentrismo de Liberace comece a complicar as coisas. Além de ditar o visual do jovem amante, Lee chega a sugerir cirurgias plásticas para deixar Scott cada vez mais parecido com ele ("Você é o filho de Liberace, não é?" Pergunta uma fã ao ver o rosto modificado de Scott - e nem precisava saber das alardeadas intenções de Lee adotar o amante). Apesar do roteiro expressar o carinho existente entre os personagens de forma bastante sincera (e nesse ponto Michael e Matt merecem todos os elogios pela disposição em fazer cenas que suas fãs devem estranhar um bocado), fica evidente o apetite sexual de Liberace por rapazes mais jovens. O que parecia um conto de fadas começa a se chocar com a vida real quando o astro não consegue conter suas fantasias (e nem precisaria se não fosse uma figura pública que sustentava mentiras como o relacionamento com uma patinadora que nem aparece no filme). Enquanto isso, Scott mergulha o nariz nas drogas e remédios para emagrecer. Nesse ponto, o papel exige de Matt Damon mais do que costuma fazer nos filmes de ação a que se dedicou nos últimos anos - e o ator prova que não está enferrujado para viver papéis mais desafiadores. Da mesma forma, Michael Douglas está hilário com as afetações de Liberace e o sorriso quase maternal com que aprecia seus obejtos de desejo. Soderbergh mergulha bastante a vontade na complexa relação que se estabelece entre os personagens, sem perder tempo estabelecendo quem é mocinho ou vilão No entanto, não chega a fazer um filme inovador - desculpem, mas cenas homoeróticas não é sinal de inovação. Ainda assim, a dramédia Behind the Candelabra é bastante reveladora sobre os bastidores de uma das figuras mais pop do século XX.
Behind The Candelabra (EUA-2013) de Steven Soderbergh com Michael Douglas, Matt Damon, Scott Bakula, Debbie Reynolds e Cheyenne Jackson. ☻☻☻☻
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