Polvorosa: não vou estragar a surpresa.
Lançado no Festival de Berlin deste ano e em cartaz no Netflix aqui no Brasil, o filme de estreia de Eduardo Casanova recebe tantos elogios quanto críticas pela abordagem do tema delicado que tem nas mãos. Peles reúne um grupo de personagens que não se enquadram esteticamente nos padrões e o que o diretor propõe é deixar o público incomodado com as histórias que pretende contar sobre cada um deles. O filme começa com uma senhora obesa nua apresentando um homem uma criança sem olhos, com a qual se dirige para um quarto e, não demora muito para que o filme retome a personagem uma década depois sem perspectiva de vida além da prostituição. O filme ainda terá um rapaz que sente necessidade de amputar as próprias pernas, uma anã que ganha a vida dentro de uma fantasia meiga, um casal sexualmente abrasivo com aparências bem diferentes e uma adolescente que nasceu com o ânus no lugar da boca. Como se percebe Casanova não tem medo de flertar com o mau gosto e a tolerância do espectador. Se por um lado ele cria personagens envolventes em seus dramas, por outro, ele não tem medo de propor um humor jocoso sobre suas aparências. Aclamado como uma bela provocação do cinema espanhol, o filme se propõe a alguns desafios que acabam prejudicando seu desenvolvimento. Com o grupo amplo de personagens em situações complexas, parece que nenhum deles é desenvolvido a contento, sempre com dificuldade para se afastar da caricatura e, em alguns casos, das situações grotescas que aparecem. Para atenuar essa impressão quase sensacionalista que emana do filme, Casanova investe numa fotografia em tons pastéis, com uso de tons de rosa e lilás como se evocasse um tom de fantasia para a narrativa. Ao fim da sessão percebemos falta sutileza e um pouco de trato para transformar seus personagens em seres reais e não apenas "pessoas-com-aparências-diferentes" - algo que vários diretores já experimentaram em filmes como O Homem Elefante (1980) de David Lynch (que tinha sua dose de humor, ironias e estranheza) ou o subestimado Crash - Estranhos Prazeres (1996) de David Cronenberg, ou, para ir ainda mais longe, o controverso Freaks (1932) de Tod Browning. A ideia de Casanova veio de seu curta "Eat my Shit" (o que já dava conta de que o diretor não é chegado a sutilezas) onde apresentava a personagem com o ânus no rosto e que considerou uma ideia promissora. Pena que ao se dedicar a tantas tramas, Peles não consiga proporcionar a nenhuma delas algo que vá além do fetiche ou do estranhamento.
Peles (Pieles/Espanha-2017) de Eduardo Casanova com Macarena Gómez, Jon Kortajarena, Ana Polvorosa, Carolina Bang, Candela Peña e Eloi Costa. ☻☻
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