Kidman e Cruise: pesadelo erótico.
Stanley Kubrick dirigiu apenas 13 longa metragens. Para muitos ele é considerado um dos grandes gênios do cinema e criador de obras que figuram entre as favoritas de muita gente. No entanto, quis o destino que ele se despedisse com um filme que não é favorito de ninguém. De Olhos Bem Fechados só foi exibido pela primeira vez depois que Kubrick já havia falecido em consequência de um ataque cardíaco. O filme era um dos mais aguardados de 1999, especialmente por conta do casal Tom Cruise e Nicole Kidman - que casados na época, deixavam propagar na mídia que protagonizariam cenas repletas de erotismo no filme. A polêmica em torno do filme só crescia quando o cineasta faleceu e Cruise aparecia como grande defensor de que nada fosse cortado ou acrescentado ao longa, para que fosse exibido exatamente da forma como Stanley concebeu. Ao ser exibido no Festival de Veneza a obra dividiu opiniões - alguns o consideraram um vexame outros uma obra sensorial e hipnótica. O maior sabor de decepção deve ter ficado por conta de quem esperava ver momentos de intimidade reveladoras entre o casal de atores, que apareciam em cenas de sutil erotismo sob a batuta do cineasta (que dizem ter até contratado uma ajuda técnica para que o casal perdesse a timidez diante das cenas mais picantes). De Olhos Bem Fechados é um filme sobre fantasias sexuais e, por isso mesmo, torna-se bastante complicado de ser realizado (se podar demais fica frio, se relaxar demais fica vulgar...). A própria história do livro que inspira o filme é interessante, já que La Ronde de Arthur Schnitzler foi escrito em 1897 e impresso em poucas cópias (para alguns amigos) no ano de 1900, o livro oferecia um mergulho num mundo onde o sexo aparecia como um ato de transgressão sobre convenções sociais e relações de classe. O roteiro adaptou a história tendo como protagonista o doutor William Harford (Cruise), casado com Alice Harford (Kidman). Belos, casados, bem sucedidos e endinheirados os dois chamam atenção por onde passam e os assédios são recorrentes, mas basta William suspeitar que Alice poderia tê-lo traído que ele mergulha em situações que lhe pareciam surreais (e o clima remete a isso mesmo, meio confuso, abstrato, nebuloso...). Se no início ele encontra com um pai que lhe oferece a própria filha adolescente, a situação fica ainda mais tensa quando ele se depara com uma sociedade secreta que organiza orgias num casarão nas redondezas da cidade. Kubrick surpreende por investir num erotismo que compõe uma atmosfera estranha, do pianista que toca vendado todas as noites (participação do diretor Todd Field), dos corpos nus, das máscaras, dos rituais misteriosos e com a morte sempre à espreita... tudo faz com que o longa pareça mais um pesadelo do que um sonho erótico - e se essa for a intenção está explicado o motivo do roteiro não se preocupar em costurar as cenas com muito empenho. Seja como for, Kubrick surpreendeu ao oferecer aos seus fãs mais um filme completamente diferente do que havia realizado até então - e, mesmo com pouco tempo de tela, ofereceu à Nicole Kidman a chance de provar que poderia se tornar uma grande atriz. Hoje, Tom Cruise poderia mostrar o mesmo gosto por ousadias com diretores renomados ao invés de correr atrás de franquias milionárias que o desvalorizam cada vez mais.
De Olhos Bem Fechados (Eyes Wide Shut / Reino Unido - EUA/1999) de Stanley Kubrick com Tom Cruise, Nicole Kidman, Sydney Pollack, Todd Field, Vinessa Shaw, Leelee Sobieski e Thomas Gibson. ☻☻☻
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