Christophe e Pierre: erotismo com personagens levados a sério.
De vez em quando os diretores dos chamados "filmes de arte" resolvem flertar com a pornografia, geralmente o resultado chama mais atenção da mídia do que do grande público que ainda se choca com esse tipo de coisa - ou pelo menos diz que se choca nos tempos onde tudo pode ser visto a qualquer instante na internet. O fato é que ninguém nunca deu muita bola para os filmes do diretor francês Alain Guiraudie até ele misturar suspense, romance e sexo gay em Um Estranho no Lago, filme que conseguiu até espaço nas conservadoras salas brasileiras depois de ganhar o prêmio de melhor direção na mostra Un Certain Regard em Cannes2013. A história em si não traz muita novidade, afinal, já vimos dezenas de vezes histórias sobre pessoas que se apaixonam por desconhecidos que podem ser um serial killer, a diferença está justamente nas cenas bastante explícitas que aparecem no filme - e se você se incomoda em ver dois marmanjos se entregarem aos prazeres da carne é melhor passar bem longe do filme. Tirando as cenas mais picantes (sem trocadilho, por favor...), o que vemos é um filme bastante melancólico sobre a eterna busca pelo parceiro ideal. A história é toda ambientada nos arredores de um lago afastado da cidade onde gays se encontram com estranhos para manter relações sexuais. Sim, existe um bocado de fetiches envolvidos nisso, mas também algo de animalesco nesses encontros. O protagonista da história é o introvertido Franck (Pierre Delandochamps) que após algumas idas ao lago conhece Michel (Christophe Paou), que assim como ele, parece um tanto excitado com a aura de perigo que o local passou a ter depois que começaram a haver mortes naquela localidade. Seria algum assassino homofóbico? Seria um psicopata com fetiche por matar os seus parceiros? Diante de estranhos qualquer um poderia ser o assassino e, se não é você, provavelmente você será uma vítima. Além da dúvida que fica no ar, o filme é pontuado por vários diálogos sobre solidão e inseguranças que funcionam como excelente contraponto para as cenas mais despudoradas. Para provar que o filme não quer ser apenas sobre um bando de marmanjos se pegando, existe Henri (Patrick D'Assumção), um sujeito que não parece se enquadrar no gosto na maioria dos frequentadores e que está tão deslocado ali quanto esteve em qualquer outro lugar. Obeso, calado e visivelmente deprimido, Henri compõe ao lado de Franck alguns dos melhores momentos de um filme que pretende ser levado a sério. Um Estranho no Lago mantém o clima sempre lento, perpassado por silêncios e surpreende na angústia gerada nos momentos finais cheios de tensão. A cena final onde vemos somente a sombra de Franck perdido num relacionamento que pode ser o último de sua vida sintetiza genialmente as intenções do filme sobre as paranoias que assombram o início de qualquer relacionamento. O filme surpreendeu ao ser indicado a oito prêmios César (o Oscar francês) - incluindo melhor filme -, mas foi apenas Pierre Delandochamps que saiu premiado na categoria de ator mais promissor daquele ano.
Um Estranho no Lago (L'Inconnu du Lac/França - 2013) de Alain Guiraudie com Pierre Delandochamps, Christophe Paou, Patrick D'Assumção e Mathieu Vervisch. ☻☻☻
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