Pier e Walter: o desejo não tem idade.
Lake (Pier-Gabriel Lajoie) namora com Désirée (Katie Boland) e trabalha na prevenção de afogamentos na piscina de um clube local. Embora os dois formem um casal jovem dos mais fofos, existe algo de estranho naquela relação que fica visível desde a primeira cena com os inúmeros beijos na boca embalados por nomes de mulheres tão distintas como Angela Davis, Aileen Wuornos e Winona Ryder, que entre dezenas de outras, são classificadas como revolucionárias pela garota. Lake não entende muito bem os critérios utilizados por ela – e ela também não sabe explicar muito bem quais são. Ela trabalha em uma livraria e precisa lidar com o assédio do chefe algumas décadas mais velho (Brian D. Wright), por quem ela nutre mais pena do que qualquer outra coisa. Ironicamente é no trabalho que seu namorado começa a perceber que sente algo diferente por homens idosos, um interesse que vai além dos desenhos que realiza sem que os banhistas mais velhos notem... até que um incidente revela para ele (e algumas pessoas que estão por perto) que seus desejos são indisfarçáveis. Lake decide parar de trabalhar na piscina e acaba, por indicação da mãe, Marie (Marie-Hélène Thibault) indo trabalhar em uma casa de repouso, o que só o faz notar ainda mais a atração que sente por homens mais velhos. O que parecia apenas uma espécie de fetiche ganha contornos diferentes conforme ele convive com um dos usuários do lugar, no caso, o experiente Melvyn Peabody (Walter Borden). Os dois irão estabelecer um relacionamento que torna o rapaz mais consciente de seus sentimentos, mas também provoca nos demais um estranhamento que só revela o quanto Gerontofilia vira do avesso à percepção que temos da velhice. Se para alguns pode soar como um período sofrido da vida, marcado pela solidão, problemas de saúde, rugas e uma dependência (aspectos presentes no filme) que passa longe do apelo sexual, para o protagonista, os efeitos do tempo na aparência de uma pessoa tem o efeito de aumentar ainda mais a libido. Dirigido pelo provocador Bruce La Bruce, Gerontofilia é um filme que surpreende pela sutileza com que trata um tema que poderia cair facilmente no deboche ou na baixaria. O canadense La Bruce começou a fazer cinema nos anos 1980 com influências que iam do experimentalismo de Andy Warhol à cultura punk. O desejo sempre foi peça central em suas obras, mas sempre foi algo ornamentado com uma estética daqueles filmes voltados para maiores de 18 anos, o que faz com que muitos considerem sua obra como um tipo de “pornografia estranha” com personagens marginalizados e toques grotescos (talvez sua obra mais famosa seja L.A Zombie/2010 que mistura cenas de sexo explícito com muito sangue e vísceras). É fácil entender seu interesse pelo tema abordado aqui, mas o tratamento cuidadoso conferido à produção é realmente algo surpreendente em sua filmografia. Não há nada gratuito por aqui. Acho que a parceria no roteiro com Daniel Allen Cox fez total diferença na construção dessa história no imaginário do cineasta. Distante da estética de seus outros filmes, o longa se leva à sério na medida certa. Mas nem tudo é perfeito, se Lake e Melvyn se tornam personagens cada vez mais interessantes em suas dissonâncias, o mesmo não se pode dizer de Marie e Désirée não conseguem ser desenvolvidas para além da caricatura, oferecendo às atrizes alguns momentos irritantes. Confesso que o título e a assinatura de LaBruce me deixaram desconfiado, mas a produção em cartaz na Reserva Imovision merece atenção pela forma como nos faz ver nossos próprios preconceitos quanto à relação entre idosos, desejo e sexo, especialmente em tempos em que o hetarismo está em pauta.
Gerontofilia (Gerontophilia / Canadá - 2013) de Bruce La Bruce com Pier-Gabriel Lajoie, Walter Borden, Katie Boland, Marie-Hélène Thibault e Brian D. Wright. ☻☻☻
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