segunda-feira, 25 de março de 2024

KLÁSSIQO: Mephisto

Klaus: A arte de ser repulsivo.
Mephisto é o sexto livro e obra mais conhecida de Klaus Mann, que o publicou em 1936 quando estava exilado em Amsterdam. A trama traz muitos elementos que relacionam diretamente o protagonista com o ator Gustaf Gründgens, ex-marido de Erika Mann, irmã de Klaus. Ambos são filhos do renomado Thomas Mann e vale a pena procurar mais informações sobre a história da família que já é interessante por si só. Durante a ascensão de Hitler na Alemanha, Gustaf teria se aproximado do partido sob o pretexto de continuar trabalhando, mas a que preço? Klaus constrói no livro uma analogia a Fausto de Goethe com as atitudes do ex-cunhado que vende à alma para um regime em troca de fama e sucesso, assim como Fausto o fez ao demônio que dá nome ao filme. O livro gerou muitas polêmicas após sua publicação na Alemanha na década de 1950, rendendo processos e tudo mais, no entanto, ela permanece relevante sobre o período que retrata, especialmente ao demonstrar que a participação de pessoas aparentemente comuns foram cruciais para ascensão do partido na Alemanha. Em 1981 o cineasta húngaro István Szabó resolveu realizar uma adaptação do livro e se consagrou com o prêmio de melhor roteiro no Festival de Cannes e  Oscar de Filme Estrangeiro pela forma exuberante como retrata a sombria história de Hendrik Hoefgen (Klaus Maria Brandauer), um ator do teatro alemão que se aproxima cada vez mais da ascensão extremista alemã. Hendrik é apresentado como um sujeito talentoso e bastante envolvente em suas relações amorosas, mas também vaidoso ao ponto de se envolver com pessoas poderosas para conseguir alcançar um status que até então não havia sido reservado à sua carreira. Embora utilize o trabalho como escudo, suas atitudes se tornam cada vez mais reprováveis com relação às pessoas que o cerca. Em determinados momentos não sabemos quando ele está atuando e quando está falando a verdade, até que ele se revele de vez ao espectador. O trabalho de Klaus Maria Brandauer é o grande destaque do filme, ao construir um personagem escorregadio, capaz de sórdidas traições em nome de sua vaidade. É interessante perceber que o filme parece um capítulo seguinte ao que vemos em Cabaré (1972) de Bob Fosse (um filme oscarizado que merecia ser mais lembrado do que é), sobre o referido período na Alemanha. No entanto, os dois filmes não poderiam ser mais diferentes, enquanto o filme de Fosse é um musical temperado com um país em sombria transformação, Mephisto é um drama pesado sobre um homem que vende sua alma para conseguir cada vez mais poder em sua esfera. Visto hoje, há quem considere o filme um tanto exagerado e afetado, no entanto, nada faz com que perca a força da história que tem para contar. A enigmática cena final ainda soa tão provocadora quanto antes quando personagem indaga que ao espectador "o que mais poderia fazer?", existe a sugestão de que tudo seria em nome da sobrevivência, mas também a ideia de que poderia ter seguido por caminhos diferentes em nome de princípios que talvez ele nunca suspeitasse que existissem. Mephisto é um clássico que permanece impactante até hoje. 

Mephisto (Hungria/1981) de István Szabó com Klaus Maria Brandauer, Ildikó Bánsági, Krystyna Janda, Rolf Hoppe, Péter Andorai e György Cserhalmi

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