Hinata e Soya: nada é o que parece. |
Talvez com a idade (44 anos e contando...) o tipo de filme que eu mais aprendi a gosta seja seja o drama que é contado como se fosse um suspense. Não sei se chega a ser um gênero, mas é algo que sempre prende minha atenção ao ponto que os olhos (cansados após um dia de trabalho) consigam ficar ligados na tela enquanto a trama se desenvolve. Caso eu tivesse conseguido assistir Monster de Hirokazu Kore-eda no ano passado, provavelmente o filme teria ficado entre os meus favoritos do ano passado. Lançado em novembro nos cinemas brasileiros, o filme chegou a pouco nos streamings e pode ser visto no TelecinePlay. O roteiro foi premiado no Festival de Cannes pela forma como o diretor costura a história de dois meninos sobre o olhar de outros dois personagens. Primeiro conhecemos Saori (Sakura Ando) que cuida sozinha do filho, Minato (Soya Kurokawa). Nas primeiras cenas (que apresentam um prédio em chamas causando alvoroço na cidade que servirá de marco zero para os atos do filme), vemos que mãe e filho se entendem e convivem super bem. No entanto, com o passar dos dias, o comportamento do menino se torna cada vez mais estranho e arredio. Ações e frases sem muito sentido começam a deixar a mãe preocupada e ao que tudo indica, o responsável por tudo isso é o jovem professor responsável pela turma do menino. Na parte seguinte, somos apresentados ao ponto de vista do professor (Eita Nagayama) sobre o que acontece com Minato, ganhando ênfase a relação do menino com um colega da escola, Yori (Hinata Hiiragi) que é perseguido e rejeitado pelos demais. Assim, descobrimos novas pistas sobre os dois meninos e o roteiro se constrói das bordas para o centro - que é apresentado no terceiro ato totalmente protagonizado pelos dois meninos. O texto de Yûji Sakamoto é mais do que eficiente ao nos mostrar que nossa subjetividade (representada na tela pela mãe e o professor) afeta mais do que o desejado na hora de criarmos nossas conclusões sobre o que está diante dos nossos olhos. Sorte que no cinema pode ser apresentado diversos pontos de vista sobre uma mesma história e a plateia se comove quando o filme chega ao seu desfecho tão poético quanto triste. Na vida real, com as barreiras criadas por nossa inabilidade em reconhecer o querer e a dor do outro, o que existe é a incompreensão que paira sobre os dois meninos que estão crescendo e descobrindo sentimentos que ainda não sabem explicar, mas sabem que podem trazer consequências repressoras para ambos. Talvez por conta disso o filme tenha recebido comparações com o belga Close (2022), que no ano anterior também foi apresentado no Festival de Cannes e saiu de lá com o Grande Prêmio do Júri. Monster (e o título, "monstro" se torna polivalente ao se encaixar em várias leituras ao longo da história) pode ser visto por alguns como o que teria acontecido aos meninos de Close se seguissem por outro caminho. Seja como for, Kore-eda demonstra mais uma vez que está no auge de sua carreira ancorado em sua capacidade de universalizar temas pelo viés da sutileza. Se antes seus filmes primavam pelas emoções de situações corriqueiras (como vistas em Pais e Filhos/2013 e Depois da Tempestade/2016), agora ele demonstra que pode ser bastante denso sem perder seu estilo introspectivo. Monster é um filme sensível, mas também pode ser tão doloroso quanto um soco no estômago.
Monster (Kaibutsu / Japão - 2023) de Hirokazu Kore-eda com Sakura Ando, Soya Kurokawa, Eita Nagayama, Hinata Hiiragi, Nakamura Shidō II e Yüko Tanaka. ☻☻☻☻☻
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