Jack e o labirinto: colagem de referências ou de subjetividades?
Não sei o efeito que os filmes de Stanley Kubrick têm sobre você, mas tenho consciência de que eu sou hipnotizado por eles. Posso até não gostar quando os assisto pela primeira vez, mas sinto vontade de vivenciar as experiências que proporcionam mais de uma vez - e quando os assisto novamente consigo apenas enxergar qualidades. Talvez seja por esse motivo que Kubrick seja considerado um mestre, um dos poucos cineastas capaz de enfileirar uma obra-prima depois da outra e, por isso mesmo, um documentário sobre a sua obra era quase inevitável. Room 237 causou alguma polêmica quando foi exibido em Sundance, talvez pela forma bastante subjetiva como recebe o formato documental quando, na realidade, seja uma coleção de interpretações sobre um dos filmes de maior sucesso de Kubrick: O Iluminado. Lançado em 1980, o filme é considerado um dos melhores filmes de terror de todos os tempos, o que torna mais curioso perceber que embaixo da trama esconde-se uma série de referências que tornam o filme mais rico. São essas referências que renderam o título nacional de O Labirinto de Kubrick. O cineasta mescla simbologias de forma quase inconsciente na mente do espectador. Dentro dos vários olhares que o filme apresenta, a única que eu havia percebido é a forma como o diretor apresenta o hotel como um verdadeiro labirinto de percepções (é como se os cômodos tivessem vida própria, movendo-se de um lado para o outro, confundindo o espectador entre cortes e sobreposições precisas. O Hotel nunca parece o mesmo quando se anda dentro dele - é quase como se os personagens e o espectador se perdessem em seu sistema digestório). Há indícios de que Kubrick queria provocar o espectador a perceber o quanto é fácil ser enganado pelas imagens e isso o torna bastante instigante. No entanto, esse é apenas um dos itens utilizados pelo diretor para enriquecer essa adaptação da obra de Stephen King (que, como dizem no filme, odiou a adaptação devido as alterações que o diretor realizou em sua história original). A trama mostra um escritor Jack (Jack Nicholson) que se isola num hotel junto com a família e enlouquece aos poucos sob a influência das assombrações que habitam aquele lugar - dizer mais do que isso pode estragar a sessão. De acordo com os entrevistados, a trama aparentemente simples, servia como uma luva para as ousadias narrativas que o diretor queria utilizar depois de sua insatisfação com o resultado alcançado em Barry Lyndon (1976). Se Lyndon pode ser considerado um filme "tedioso feito por um homem entediado", Kubrick queria se recuperar em sua obra seguinte, realizando um filme que explorasse o poder da imagem sobre o espectador, misturar referências que iam desde o genocídio dos índios americanos, o holocausto, desejos sexuais, mitologias e a forma como a humanidade destrói sua família sobre a terra. Debaixo de todas essas camadas que rondam a cabeça do protagonista (e do diretor), ainda há os que acreditam que O Iluminado esconde a confissão de Kubrick sobre seu envolvimento na farsa das imagens divulgadas da viagem da Apollo 11 à Lua (essa confissão estaria presente em diálogos, na camisa usada pelo filho de Jack, no número do quarto presente no título - que corresponde à distância entre a Terra e a Lua). O diretor Rodney Ascher faz em seu primeiro longa-metragem (antes havia realizado somente curtas e tinha experiência em efeitos visuais) uma colagem curiosa das obras de Kubrick (além de O Iluminado, ainda utiliza várias cenas de 2001 - Uma Odisseia no Espaço/1968, Lolita/1962, De Olhos bem Fechados/1999...) com filmes antigos e outros nem tanto (como a versão de O Iluminado feita para TV em 1997 em forma de minissérie) para ilustrar o que seus entrevistados tem a dizer. Chama a atenção o fato de nenhum deles ser famoso e que em momento algum o rosto deles é revelado, trata-se de um grupo de pessoas diversas que admiram o diretor e sua obra - e que constuíram ao longo do tempo interpretações interessantes para um filme. É interessante conhecer essa colagem subjetiva de impressões, mas dificilmente suas afirmações irão ser lembradas quando o espectador estiver mergulhado na narrativa de O Iluminado mais uma vez. Prometo que assistirei a O Iluminado novamente e escreverei sobre ele ao efeito do que ouvi sobre esses 102 minutos.
O Labirinto de Kubrick (Room 237/EUA-2012) de Rodney Ascher com entrevistas de Bill Blakemore, Geoffrey Cocks, Juli Kearns e Jay Weidner. ☻☻☻
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