Ethan Hawke: perdendo a fé.
Muita gente considerou que Ethan Hawke seria lembrado no Oscar por seu trabalho em First Reformed, um dos filmes mais elogiados do ano passado. Seu trabalho acabou celebrado somente em festivais e premiações indies - o que culminou nas quatro indicações do filme ao Independent Spirit deste ano (concorreu a ator, filme, primeira produção e roteiro). Com problemas de distribuição nos Estados Unidos o filme foi lembrado somente na categoria de melhor roteiro original pelo Oscar. O roteiro e a direção são de Paul Schrader, especialista em criar tipos deslocados em seus trabalhos (Taxi Driver/1976, Gigolô Americano/1980, Temporada de Caça/1997, Auto Focus/2002...). Aqui ele gira em torno de Toller (Hawke), um líder religioso que atua numa pequena congregação nos arredores de Nova York. De início não existe nada demais naquela realidade apresentada sem grandes atrativos. A coisa começa a mudar quando uma mulher grávida (Amanda Seyfried) se aproxima dele e revela que seu esposo insiste para que realize um aborto. Diante da angústia daquela jovem, Toller se aproxima do casal e tenta fazer com que o marido dela mude de ideia. Acontece que o moço tem uns pensamentos estranhos. De comportamento radicalista, o problema domiciliar é apenas um dos pontos de conflito entre os dois personagens. Schrader compõe um roteiro que se desenvolve aos poucos, enriquecendo detalhes sobre os personagens, especialmente sobre o protagonista que começa a questionar aspectos de seu papel. O filme fala um pouco de política, da forma como o homem se relaciona com o mundo e a natureza, além de fazer Toller revisitar os próprios fantasmas e o renascimento do desejo (que precisa ser sufocado a todo custo). Schrader consegue imprimir uma alma viajante no filme, ainda que seus planos e enquadramentos tenham uma rigidez bem cuidada em fotografia quase sem cores. Este aspecto reflete com fidelidade os conflitos de Toller, que sempre busca o equilíbrio sob o fio da navalha. Me arrisco a dizer que Hawke tem aqui o seu melhor trabalho,. Contido a maior parte do tempo, seus olhos são capazes de expressar um desespero genuíno como alguém que aos poucos perde suas certezas. Lançado por aqui com o nome de Fé Corrompida, o filme de Paul Schrader fala de uma fé muito maior do que a religiosa, trata-se de fé na própria humanidade e, por isso mesmo, seu final em aberto parece ainda mais certeiro.
Fé Corrompida (First Reformed/EUA-2017) de Paul Schrader com Ethan Hawke, Amanda Seyfried, Cedric The Entertainer, Victoria Hill, Philip Ettinger, Bill Hoag e Frank Rodriguez. ☻☻☻☻
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