sexta-feira, 21 de julho de 2023

#FDS Para Maiores: O Império dos Sentidos

Eiko e Fuji: muito mais do que sexo. 

Resolvi dedicar este #FimDeSemana a alguns filmes que assisti nos últimos meses e que por algum motivo deixei de comentar por aqui. Em comum, os três filmes listados aqui tem cenas de sexo bastante explícitas e pretensões artísticas que as retiram do nicho dos filmes pornográficos. Obviamente que os os próximos três filmes citados por aqui podem ser considerados ofensivos por parte do público, mesmo para aqueles que estão acima de sua classificação a partir de 18 anos, mas lembro que ninguém é obrigado a ler as postagens, assistir os filmes, concordar comigo ou gostar do que eles apresentam. Como qualquer crítica, trata-se da forma como eu me relaciono com as obras e como realizo minhas considerações meramente subjetivas sobre elas. Escolhi começar por O Império dos Sentidos de Nagisa Ôgima, não apenas por ter se tornado um clássico, mas também por conta da ordem cronológica que o tornou numa referência para os filmes que utilizam o sexo como elemento narrativo em obras autorais. Acredito que este seja um dos filmes mais famosos de todos os tempos, despertando a curiosidade de várias gerações desde o seu lançamento. O ponto de partida é bastante simples: Abe (Eiko Matsuda) é uma ex-prostituta que se apaixona por seu patrão casado Ishida (Tatusuya Fuji), dono de uma hospedaria. O que começa de forma até singela, a cada encontro dos personagens a obsessão de um pelo outro se torna crescente, rendendo cenas tórridas perpassadas por uma atmosfera pesada e acontecimentos que revelam cada vez mais a sensação de incompletude que os dois sentem. Vez por outra os dois fazem sexo com outros personagens, mas suas angústias aparecem mesmo quando estão juntos, criando um verdadeiro mundo a parte para ambos. Ainda que em primeiro plano seja a relação carnal que possa chamar mais atenção do espectador, os diálogos fortes provocam incômodo em quem espera um filme erótico convencional, construindo um clima de suspense até o seu desfecho. O longa é baseado em uma história real ocorrida no Japão em 1936 e torna-se o pretexto ideal para o diretor apresentar a relação da cultura japonesa com o sexo (seja na relação com o pudor, com as gueixas, mangás eróticos...). Amparado por fetiches variados, o filme avança com cenas que causaram escândalo na época pela forma natural com que apresenta o entrosamento entre o casal protagonista. Eiko Matsuda consegue imprimir várias camadas à sua personagem, a tornando em uma figura por vezes assustadora, enquanto Tatusuya Fuji consegue ser extremamente sedutor e atraente, mesmo que seu porte de galã não evite que as ações de seu personagem sejam questionadas (o que não o impede de se assustar com as fantasias de sua amante). Os enquadramentos bem realizados, a fotografia escura em ambientes fechados e toques sonoros quase macabros colaboram bastante para a densidade entre os personagens e ajudam a romper os limites entre o pornográfico e o artístico, território em que vários cineastas autorais explorariam mais tarde (o dinamarquês mergulhou no mesmo território com o gélido Ninfomaníaca/2013 mas é em Anticristo/2009 que vemos sua inspiração mais explícita na obra de Ôshima e o indie Kelly+Victor/2012 também bebeu diretamente na mesma fonte). Entre cenas que hoje podem ser consideradas degradantes e abusivas, existe de fato um tom de crônica sobre a relação entre os gêneros ao longo do filme que extrapolou a tela, enquanto Tatusuya Fuji ganhou prêmios pelo papel e permaneceu em atividade até hoje, Eiko Matsuda sofreu muito preconceito pelo papel, realizando poucos filmes nos anos seguintes. Rompendo tabus, ainda acho que uma tradução mais literal do título (Ai no Korïda, algo como "tourada do amor") faria mais sentido no alto dos créditos. Vale lembrar que o diretor lidou com um ponto de partida semelhante em O Império da Paixão (1978) que lhe rendeu o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes ao mudar um pouquinho a perspectiva do casal protagonista (mas o filme não fez um décimo do sucesso de seu clássico cult). Por aqui, O Império dos Sentidos o filme foi eleito o Melhor Filme Estrangeiro pelo Festival SESC de Cinema em 1981!  

O Império dos Sentidos (Ai no Korïda / Japão - 1976) de Nagisa Ôgima com Eiko Matsuda, Tatusuya Fuji, Aoi Nakagima, Yasuko Matsui e Meika Seri. ☻☻☻

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