Anticristo: Casal comendo o pão que Von Trier amassou...
Lars von Trier é um dos diretores mais provocadores dos últimos anos e por isso mesmo coleciona desafetos (seja em Hollywood ou na crítica mundial). Depois de criar o magistral Dogville (2003) ele teve que engolir as críticas negativas à sequência Manderlay (2005) e sua primeira comédia O Grande Chefe (2007). O dinamarquês ficou arrasado. Mergulhado em uma depressão ficou afastado dos sets por alguns anos e pensou em abandonar a carreira. Sorte que ele mudou de idéia. O renascimento de Von Trier veio em Cannes no ano passado, onde exibiu seu primeiro filme de terror. Bem, se fazendo dramas pesadões o cara já assusta imagina o que ele pode fazer num gênero desses! Coitado de quem imaginou que veria um filme de horror tradicional. Para amenizar (ou precaver) os mais animados, o diretor avizou que se tratava de um terror erótico - eu continuei preocupado. A exibição em Cannes lotou, mas ele esqueceu de dizer que era uma jornada perturbadora pelo sofrimento humano - ou seja, mais um filme de Lars Von Trier. Anticristo é uma experiência radical, tão radical que até seus fãs mais fiéis o estranharam. Sem ter um roteiro bem costurado (afinal, Trier disse que o escreveu utilizando somente uma parte de suas capacidades intelectuais) o filme atira para todos os lados para dizer que a humanidade não faz a mínima idéia de para onde vai. Um casal (Willem Dafoe e Charlotte Gainsburg, premiada em Cannes) perdeu o filho de três anos enquanto faziam amor, as consequências desse fato trágico (ainda que lindamente filmado por Trier) será um teste de resistência para a afinidade que existe entre os dois. O marido não confia no tratamento psiquiátrico que a esposa vem recebendo e a leva para uma casa no campo, o qual chama de Eden, com objetivo de que ela filtre a dor. Quando a esposa parece melhorar as coisas começam a piorar até o desfecho trágico. Mais interessante do que assistir os conflitos do casal é apreciar como Trier constrói ao redor de seus protagonistas um clima ameaçador em meio à natureza que parece expulsá-los (sementes que caem no teto, raposas falantes, corvos visitantes, pássaros mortos, vento...). Trier investe pesado em dicotomias (homem-mulher, prazer-dor, amor-ódio...) e exagera nas sequências mais violentas. De resto, pouco importa os segredos que a trama guarda, bom mesmo é passear pela criatividade no auge da perturbação de um cineasta em crise em belíssima fotografia. Só para esclarecer, apesar das simbologias religiosas da trama o título é inspirado em Nietzche e não na Bíblia (além de ser uma brincadeirinha com Willem Dafoe que já foi Jesus em A Última Tentação de Cristo). Longe de ser perfeito o filme é uma experiência única.
Anticristo (Antichrist - 2009/Dinamarca; Alemanha, França; Suécia; Itália; Polônia) de Lars Von Trier com Charlotte Gainsbourg e Willem Dafoe. ☻☻☻☻
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