Bettany: entre a fé e a ciência
Criação foi um filme que acompanhei a produção cheio de expectativas. Afinal de contas não é todo dia que vemos a promessa de uma cinebiografia sobre Charles Darwin no conturbado momento em que criava sua polêmica obra: A Origem das Espécies. Colaborava muito para a expectativa crescente a presença de um dos melhores e mais desperdiçados atores do cinema atual: Paul Bettany. Acrescente a isso o fato dele atuar ao lado da patroa Jennifer Connely e o filme tinha tudo para fazer bonito nas bilheterias e nas premiações. Não foi bem assim. O filme recebeu críticas mornas e passou praticamente em branco nos cinemas e nas premiações da vida. O motivo? Acho que com medo de levantar mais polêmicas do que deveria, o estúdio preferiu um lançamento discreto em escala mundial e, para piorar, a crítica pegou no pé do diretor Jon Amiel argumentando que seu filme abordava qualquer coisa, menos a genialidade de Darwin e de sua obra. Até entendo esta posição, mas acho extremamente injusto acusar um filme de não ser o que ele nunca quis ser. O roteiro, assinado pelo próprio diretor e John Collee, concentra-se num lado mais íntimo da vida de Darwin e que rendeu grande polêmicas em casa: o fato de muitos considerarem que sua obra matava Deus. Pensar que as espécies surgiram e evoluíram de forma menos divina do que a igreja pensava poderia levá-lo para a fogueira em outras épocas. Quando criou seu legado, Darwin teve que resolver as pendengas em casa com a esposa católica e com o vizinho amigo e padre (Jeremy Northan). Além dessa encruzilhada particular entre ciência e religião, Charles, pai de família, devotado e recluso tinha que lidar com a morte de sua primogênita, Annie (Martha West). O filme deve ser realmente decepcionante para quem espera uma aula sobre Darwinismo, afinal não conta com mais do que alguns causos pautados em suas observações e algumas anedotas interessantes, mas que os iniciados no assunto não devem achar muita graça - assim como o ciclo iniciado pelo jacaré em decomposição que é interessante, ainda que já vista antes.Os Darwinistas também devem se irritar quando vêem seu herói na tela conversando com a filha morta se culpando por ter casado com uma prima, mas, para quem quer conhecer os conflitos que estavam por trás de uma obra revolucionária o filme cumpre o seu papel com muitas qualidades (ainda que quase afirme que seu conflito com a religião ocorreu pela morte da filha). Além de Bettany e Connely, que estão em bons momentos à frente do elenco - que conta ainda com Toby Jones e Benedict Cumberbatch (da série cult Sherlock)- o longa conta ainda com fotografia bem cuidada, belas locações e figurinos corretos. A direção de Jon Amiel também não compromete o resultado final e admiro sua coragem de colocar Darwin em meio a um drama familiar quando todo mundo queria ver um cientista aguerrido. Fragilizado, recluso, observador e questionado, o filme comove por ter um personagem que é menos mito e mais humano.
Criação (Creation/Reino Unido - 2009) de Jon Amiel com Paul Bettany, Jennifer Connely, Toby Jones, Jeremy Northam e Benedict Cumberbatch. ☻☻☻
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