Gandolfini, Lane e Robbins: o vovô de The Osbournes.
Falando de Reality Shows pouca gente deve lembrar que a coisa não começou com o famigerado Big Brother. A história do embrião de tudo que há de interessante e obscuro nesse tipo de programa é o foco de Cinema Verité, filme produzido com o padrão de qualidade HBO e com elenco do porte de Diane Lane, Tim Robbins e James Gandolfini. Exibido no Brasil com o título pouco inspirado de A Saga de Uma Família o filme explora algo que eu já havia percebido há tempos e que meus amigos mais intelectualóides quase me mataram quando contei: os reality shows são filhos dos documentários. Não sei por qual motivo (talvez pelos realitys serem exibidos na TV e os documentários serem considerados uma forma mais elevada e séria de cinema) mas esse parentesco é rejeitado quando todo mundo resolve esculhambar o Big Brother e outros programas de gênero. Esse borrão nas fronteiras do documentário é de onde nasce o programa An American Family, lançado em 1973, onde uma família, os Loud de Santa Bárbara, aceitarm o convite para ter seus dias filmados, editados e exibidos num programa de televisão sem ganhar um tostão por isso. A ideia, nascida da mente do cineasta Craig Gilbert (Gandolfini, um dos atores mais interessantes dos EUA, mas que não tem recebido o devido espaço nos cinemas desde que acabou o seriado Família Soprano) brotou do documentário realizado pela renomada antropóloga Margareth Mead como estudo de antropologia cultural. No entanto, ao invés de utilizar a observação de famílias em Samoa e Nova Guiné (nas décadas de 1920 e 1930), a ideia de Gilbert era filmar o cotidiano de uma família comum estadounidense. Vale destacar que apesar dos Loud formarem uma família como tantas outras, Gilbert notava que havia uma tensão ali que era comum na época (afinal era a década de 1970 com suas rupturas comportamentais, sexuais, sociais, experimentais...) que quando devidamente estimulada poderia explodir: uma mãe (Diane Lane, excelente) que fica entre a transformação e a manutenção da ordem exigida na casa pelo esposo conservador (Tim Robbins), uma filha pré-adolescente, uma que inicia sua vida amorosa, dois irmãos roqueiros e um que está prestes a sair do armário (Thomas Dekker que vive Lance Loud). Inspirado pelo movimento de Cinema Verdade (daí o nome original) a ideia foi vendida para a recém criada TV educativa e quando foi ao ar se tornou um sucesso - enquanto a família era massacrada pela mídia e os próprios espectadores. Com as feridas íntimas expostas em rede nacional o resultado foi uma catástrofe tamanho família para os Loud, alvo de julgamentos de todos ao redor, os Loud não seguraram a pressão em sua vida pessoal de forma que restou-lhes revidar em programas de entrevistas e revistas. A família argumentou ter sido manipulada por Gilbert, os câmeras responsáveis pelas filmagens (Patrick Fugit é o que tem mais destaque como Alan Raymond) também brigaram com o produtor e a fidelidade aos fatos foi atacada como não sendo tão fiel assim. Os diretores Shari Springer Berman e Robert Pulcini conseguem fazer seu filme mais instigante desde O Anti-Herói Americano (2003) e lança questões para o público que fez o gênero Reality um sucesso da TV atual. O que há de tão interessante na vida alheia? Por que é tão comum massacrar essas pessoas que expoem suas vidas em troca de um pouco de fama? E a melhor de todas: existe mesmo alguma realidade nesse tipo de programa? Se pensarmos que a realidade não pode ser percebida num momento descolado do todo (essa é a crítica que sempre remete ao que se perdeu na ilha de edição) sobra pouco mais do que show nesse tipo de coisa. Berman e Pulcini realizam um bom trabalho, com ótima reconstituição de época, boa fotografia e tensão crescente, mas não me incomodaria se dedicassem mais tempo aos rumos que a família seguiu depois que as visceras desse ambiente familiar foram exibidas. A opção por resumir a jornada de cada um depois do programa em breves parágrafos ao fim da sessão me deixou a sensação que o melhor dessa experiência de Cinema Verité ficou de fora. Só para lembrar, Alan e Susan Raymond (os câmeras que brigaram com Gilbert) continuaram na carreira de documentarista tendo sido indicados ao Oscar duas vezes, ganhando em 1994 por I am a Promise (documentário sobre crianças de uma escola pública americana).
A Saga de Uma Família (Cinema Verité/EUA-2011) de SShari Springer Berman e Robert Pulcini com Diane Lane, Tim Robbins, James Gandolfini, Thomas Dekker, Patrick Fuggit e Johny Simmons. ☻☻☻
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