Phillipson e Natalie: o fim de uma era.
Faz
tempo que esta cinebiografia de Jaqueline Kennedy está sendo gerada por Hollywood.
Lembro de uma vez que quase saiu do papel com assinatura de Steven Spielberg e estrelado por Rachel Weisz. No entanto, mexer com um verdadeiro mito americano não é fácil. Foi quase inacreditável quando o projeto saiu do papel com
Natalie Portman no papel principal (que lhe valeu a terceira indicação ao Oscar
neste ano) e o chileno Pablo Larraín na direção. Quem conhece sabe que Larraín
entende de politizar seus filmes e aqui não faria diferente – e o fãs irão
perceber que ele foi a melhor escolha para o texto que tinham em mãos,
principalmente porque Noah Oppenheim (que curiosamente tem no currículo somente
a escrita de Maze Runner/2014 e Convergente/2016, duas produções voltadas para
o público adolescente) foge do convencional com uma colagem de fatos sobre a
ex-primeira dama tendo como base uma entrevista concedida para um jornalista
previamente selecionado (Billy Crudup). É no decorrer da entrevista que Jackie
fala sobre o atentado sofrido pelo esposo (vivido pelo dinamarquês Caspar
Phillipson), um badalado programa de TV onde apresentou a casa branca (e que
lhe valeu um Emmy) e o funeral espetaculoso que organizou para o esposo. O que
torna o filme mais interessante é a forma como lê nas entrelinhas dos
acontecimentos históricos, dando voz para Jackie explicitar (ou pelo menos
tentar) o que tinha em mente a cada passo vivenciado. Neste aspecto dois pontos
são fundamentais para o sucesso do filme, um é a direção de Larraín que imprime
o tom tão tenso quanto fúnebre (com grande auxílio de ótima trilha-sonora) durante toda a
lentidão de sua narrativa (e que torna palpável a forma como o dia 22 de
novembro de 1963 marcou o fim de uma era). O outro ponto é o que colocou o
filme no radar das premiações: a atuação de Natalie Portman. A atriz que já
provou em Cisne Negro/2011 (que lhe
rendeu o primeiro Oscar da carreira) que sabe explorar o que suas personagens tem de mais sombrio. Na pele de Jackie, ela cria uma aura cheia
de pose, com direito ao sotaque afetado (afinal, Jackie se tornou um ícone de
estilo e elegância) em contraste com o tom amargo (reforçado pelos
diálogos ásperos do roteiro), somado à obsessão de reforçar o legado
do esposo (ao mesmo tempo que procura onde se encaixa na História americana) existe a tentativa de construir uma personalidade multifacetada para a personagem. Obviamente que o
filme recria momentos importantes da história de forma arrepiante (como a cena
do carro em Dallas ou a procissão da viúva junto ao corpo do esposo) e reforça
detalhes (como a roupa manchada de sangue, o revólver de brinquedo na mão do
menino John John), no entanto a estrutura de mosaico histórico pode incomodar por romper com a ideia de uma narrativa linear enquanto se aproxima e afasta da protagonista na mesma proporção. Trata-se de um jogo cênico interessante que deixa a a cargo da plateia interpretar este ícone do século XX conforme lhe parecer mais adequado. Por servir tão bem a esta tarefa complicada, Natalie Portman está cotada para o Oscar que se aproxima (o filme ainda concorre às estatuetas de melhor figurino e trilha sonora), mas Natalie tem bons parceiros de cena, com destaque para o recém falecido John Hurt na pele do padre conselheiro da personagem e Peter Sarsgaard
como o cunhado Bobby (que anos depois teve seu próprio infortúnio). Em Jackie Larraín consegue criar uma biografia que escapa do óbvio.
Jackie (EUA/Chile/França - 2016) de Pablo Larraín com Natalie Portman, Billy Crudup, Peter Sarsgaard, John Hurt, Greta Gerwig, Caspar Phillipson e Richard E. Grant. ☻☻☻
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