Hatidze: registros de um mundo particular.
Hatidze Muratova é o que costumava ser chamada de caçadora de abelhas, uma especialidade cada vez mais rara no mundo. Nascida e criada nos recantos da Macedônia, ela tem pleno entendimento sobre a vida destes seres fascinantes. Sabe onde vivem e do que precisam para produzir mel frequentemente e é desta produção que ela tira seu sustento ao vender potes de mel para uma feira local. Hatidze produz pouco e consegue apenas o necessário para sua sobrevivência ao lado da mãe acamada numa casinha isolada entre as montanhas. No entanto, seu amor, cuidado e respeito pelo que faz é visível numa vida simples que logo muda com a chegada dos novos vizinhos. Se a vida de Hatidze era tranquila, com a chegada da numerosa família que passa a viver no quintal ao lado a coisa muda de figura. Se no início ela gosta de ter pessoas por perto (e especialmente crianças por perto, sendo que uma delas se interessa pela coleta de mel) por outro lado, as ambições do novo vizinho gera conflitos sérios não apenas com Hatidze, mas também com a natureza local. As consequências serão drásticas. Este registro feito no documentário Honeyland (disponível na GloboPlay) impressiona pela simplicidade e forma com que consegue contar uma história muito particular que ecoa na forma como nos relacionamos com o mundo, a natureza e a produção de riquezas. No entanto, o mais especial no trabalho dos diretores é conseguir nos transportar para um outro universo. Por noventa minutos somos imersos em um mundo diferente e sofremos as angústias de sua protagonista. Indicado aos prêmios de melhor filme estrangeiro e melhor documentário do Oscar 2020, Honeyland é o filme de estreia da dupla Tamara Kotevska e Ljubomir Stefanov que conseguiram colocar a Macedônia no radar da Academia depois de muito tempo (a primeira e única vez foi em 1994 com Antes da Chuva de Milcho Manchevski). O trabalho dos diretores segue uma linha de não interferir no ambiente que registram (ao menos quando a câmera está ligada), ao ponto de que durante o filme é difícil lembrar que havia outras pessoas presentes naquele local (e quando eu lembrava eu só repetia "eles não vão fazer nada?"). É evidente que o filme borra a divisão entre a realidade e a ficção (assim como vemos em O Agente Duplo que também tenta sua indicação ao Oscar deste ano) e isso torna tudo ainda mais interessante. Emocionante do princípio ao fim, Honeyland bem que poderia ter levado para casa o Oscar de melhor documentário (categoria em que perdeu para o mais quadradinho Indústria Americana). Fruto de um trabalho de três anos com mais de 400 horas de filmagem, quando pensamos em como foi realizado e a profundidade de sua mensagem, Honeyland se torna um triunfo ainda maior.
Honeyland (Macedônia/2019) de Tamara Kotevska, Ljubomir Stefanov com Hatidze Muratova, Nazife Muratova e Hussein Sam. ☻☻☻☻☻
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