O jovem cineasta Malcolm (John David Washington) e sua namorada Marie (Zendaya) acabam de chegar em casa após a promissora estreia do primeiro filme dele. Ele é todo empolgação com os elogios e olhares atentos que seu filme recebeu, tudo indica que as críticas serão bastante positivas ao seu trabalho. Ela parece bem menos animada. Enquanto ela prepara um macarrão para servir de refeição para aquela noite, ele bebe um bocado, dança, canta e parece inabalável diante daquela vitória pessoal. No entanto, diante da indiferença de sua parceira, ele percebe que existe algo de errado e a plateia irá descobrir aos poucos o que se esconde debaixo daquele casal glamouroso que acaba de chegar em casa. Por conta de seu discurso de agradecimento, a coisa se complica e apresenta camadas cada vez mais sombrias, ressentidas e até agressivas daquele relacionamento. Ancorado nos diálogos ásperos (algumas vezes cruéis e em outras dotado de um humor irônico), o casal de atores tem a chance de apresentar atuações memoráveis e, de fato, apresentam trabalhos vigorosos na pele de um casal que precisa lavar a roupa suja diante da câmera do diretor Sam Levinson. Sam ficou famoso com a série Euphoria da HBO, que rendeu um Emmy para Zendaya, que aqui demonstra que cresceu e deixa os papéis de adolescente para trás (quem só a conhece por conta da MJ dos últimos filmes do Homem-Aranha deve se surpreender). Realizado nos primeiros meses da pandemia, seguindo todos os protocolos de segurança, o filme veio da necessidade dos envolvidos realizarem algo durante os meses de isolamento social. O resultado é um filme que transmite certa urgência, especialmente pelos seus diálogos que remetem ao cenário do cinema indie recente, a relacionamentos abusivos, ao relacionamento dos artistas com a crítica, representatividades, estereótipos e saúde mental, além de beber na fonte de que entre quatro paredes a vida de um casal de capa de revista pode ser surpreendente. No entanto, a narrativa calcada nas discussões pode se tornar um pouco cansativa para a plateia, já que em alguns momentos os diálogos são deliciosamente lapidados, mas em outros soam até improvisados, assim, a briga entre os dois não é realizada num tom crescente, mas oscilante. Este resultado prejudica muito o filme, mas pode custa um pouco da empolgação diante dele. Pesa ainda sobre ele que ao redor do mundo aconteceram vários projetos em tempos de isolamento, mas nenhum deles com a ambição de Malcolm & Marie. A belíssima fotografia em preto e branco, a trilha sonora charmosa, o elenco em ascensão e as atuações deixam claro que a produção ambiciona aparecer em premiações. Com exibição restrita antes de seu lançamento na Netflix, houve boatos de que Zendaya seria uma das grandes apostas para o Oscar de atriz, mas o que se vê até agora não corresponde a esta expectativa (no entanto, até a Academia apresentar seus indicados no dia 14 de março muita coisa pode acontecer). De fato a atriz impressiona, especialmente nos momentos em que sua expressão carrega boa parte da carga dramática do filme. É visível como aqueles sentimentos fermentam em sua cabeça e o espectador se torna capaz de senti-los com a mesma intensidade, além da própria transição da personagem que começa vestida para arrasar em uma festa e depois aparece desconstruída em seu corpo ainda tão juvenil. Se a almejada indicação ao Oscar não chegar, Malcolm & Marie já é um marco na carreira da atriz de 24 anos que promete realizar papeis cada vez mais interessantes no futuro.
Malcolm & Marie (EUA-2021) de Sam Levinson com Zendaya e John David Washington. ☻☻☻☻
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