Renate e Anders: o poder das incertezas. |
Julie (Renate Rensvie) está prestes a completar trinta anos. Ela já começou a faculdade de medicina e deixou pela metade quando decidiu que preferia ser psicóloga - mas ao começar o curso, achou que não era muito a sua praia e acabou deixando a faculdade para enveredar na sua paixão pela fotografia. No entanto, ela não sabe muito bem como se aplicar à nova carreira. Na vida amorosa ela também se apaixonou por vários rapazes em relacionamentos curtinhos que não deram em grande coisa... pelo menos até ela encontrar Aksel (Anders Danielsen Lie), um autor relativamente conhecido de graphic novels que já passou dos quarenta anos e está naquela fase de encontrar um relacionamento sério, planejar casamento e filhos... não demora muito para que os dois percebam que estão em fases diferentes da vida, mas eles tentam lidar com isso e permanecerem juntos (pelo menos até Julie começar a repensar se aquele relacionamento será satisfatório dentro de todos os planos de Aksel). Indicado ao Oscar de filme estrangeiro e roteiro original, A Pior Pessoa do Mundo é mais um acerto na carreira de Joachim Trier, cineasta norueguês (e parente distaaaante de Lars Von Trier) do qual sou fã desde que assisti Mais Forte que Bombas (2015) e Thelma (2017), mas este aqui tem mais relação com o que está sendo chamada de trilogia Oslo, formado pelos dois primeiros filmes de sua carreira (Reprise/2006 e Oslo, 31 de Agosto/2011 que já assisti e prometo comentar em breve por aqui). Como em suas obras anteriores, A Pior Pessoa do Mundo é mais uma prova do talento que Joachim possui para contar suas histórias com uma fluência narrativa atraente, mesmo que esteja contando a história mais comuns do mundo. Aqui o filme mistura um tanto de comédia romântica, coming of age até chegar num drama de fazer chorar, no entanto, mais do que qualquer coisa, o filme é sobre um período decisivo na vida de Julie, aquele em que decidirá o rumo que sua vida tomará. Família? Carreira? Casamento? Filhos? São pontos fundamentais nas decisões que Julie tomará com a chegada da vida adulta e Renate Reinvie transpira cada emoção da personagem com uma notável naturalidade. Suas incertezas e contradições são sempre presentes de uma forma bastante humana, evitando que ela se torne o que o título anuncia e se aproxime cada vez mais uma pessoa normal que ainda busca os rumos de sua vida. Claro que no caminho algumas decisões irão magoar quem está por perto e até ela mesma, mas Joachim conduz o filme com uma elegância que sempre o afasta do lugar comum e do melodrama. Existe um cuidado com o enquadramento e a construção de cada cena que gera alguns momentos inesquecíveis (a cena de Julie correndo com o mundo inerte ao seu redor é uma delas). No desfecho não há rancores, culpas ou ressentimentos, no lugar disso, vemos gratidão às pessoas que foram importantes em sua vida. A Pior Pessoa do Mundo é sobre crescer e tornar-se você mesmo e, por isso mesmo, se torna uma história tão atrativa quanto universal (que se não fosse pela presença do japonês Drive my Car na categoria de filme estrangeiro, provavelmente levaria o Oscar para casa sem problemas). Se Joachim não foi indicado pela direção, ao menos foi lembrado na categoria de roteiro (ao lado do eterno parceiro Eskil Vogt), mas se muita gente reclama que Lady Gaga (Casa Gucci) ficou de fora do Oscar, agora faço parte do time que acha que Renate Rensvie merecia uma vaga no páreo de melhor atriz. Sua performance é tão luminosa que imagino o estrago que outra atriz poderia ter feito na pele de Julie. Assisti em uma entrevista que ela já havia feito uma pequena participação no segundo filme de Joachim Trier e que estava prestes a desistir da carreira por achar que não estava seguindo o caminho que gostaria. Ela acabou levando para casa o prêmio de melhor atriz do Festival de Cannes e foi lembrada com uma indicação ao BAFTA pelo papel de Julie. Mesmo que o Oscar não tenha reconhecido seu trabalho extraordinário, ela é uma das atrizes mais interessante a se ficar de olho nos próximos anos.
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