terça-feira, 7 de maio de 2024

NªTV: Lucky Hank

Mireille, Odenkirk e seus visitantes: adeus, Saul Goodman.
 
Foi num clima estranho no qual assisti a cada episódio da série Lucky Hank da AMC. Afinal, quando ela começou a ser exibida no Brasil, ela já estava cancelada pelo canal. Sendo assim, cada episódio era um passo rumo à despedida. O maior terror de quem acompanha uma série é que ela termine sem um final, com aquela ideia aberta que pode ir para qualquer lugar que sua mente direcione. A sorte é que Lucky Hank terminou neste domingo deixando ao menos um arco fechado sobre seus personagens - e que você pode imaginar o que acontecerá com  o protagonista a partir dali como um recomeço. Seria ótimo ter mais uma temporada, mas já que não tem, não me arrependo de ter acompanhado oito episódios sobre o professor William Henry Devereaux Jr. vivido por Bob Odenkirk se despedindo de vez do advogado Saul Goodman, que começou a dar vida em Breaking Bad (2008-2013) e terminou em Better Call Saul (2015-2022). Para um ator que viveu o personagem por tanto tempo, o protagonista de Lucky Hank foi um presente, já que é um sujeito bem diferente para defender. Henry Jr. escreveu um livro que encontrou algum sucesso, mas sempre viveu à sombra do pai, de quem carrega o mesmo nome e carreira. Já que a carreira de escritor não decolou, Henry trabalha como professor em uma universidade e é o controverso chefe do departamento de Literatura (que é composto por personagens bastante diferentes entre si e que tornam tudo mais divertido quando seus egos acadêmicos se chocam continuamente). Ele não é propriamente um tipo simpático, mas os episódios tendem a revelar que Henry é bem menos rabugento do que aparenta. O fato é que ele colecionou várias mágoas ao longo da vida e como não deve acreditar nos benefícios de psicoterapia, lida com suas amarguras na marra. Assim, o relacionamento com os colegas não é dos melhores, mas a situação o sustenta ao lado da esposa Lily (Mireille Enos), ou pelo menos até ela dar vazão às suas  próprias ambições (que colocará Henry em uma verdadeira encruzilhada cheia de gatilhos). Henry tem contas a acertar com seu passado, especialmente com o pai, que em determinado momento irá voltar para convivência da família, mas sem a possibilidade daquela conversa catártica que Henry tanto deseja. No meio do caminho também tem a filha de Henry, Julie (Olivia Scott Welch) que é casada com um rapaz que é desprezado pelo sogro, Russell (Daniel Doheny). Henry também tem um melhor amigo, Tony Conigula (Diedrich Bader), que por vezes faz o amigo olhar para o mundo à sua volta com uma nova perspectiva (embora o personagem esteja bem longe de ter o perfil de conselheiro). Embora os episódios de Lucky Hank fluam muito bem isoladamente com o tom de uma comédia dramática (que poderia ter rendido um belo filme indie a ser cultuado na temporada de premiações e a assinatura de Peter Farrelly do oscarizado Green Book/2018 realça isso), como minissérie, a ideia pode ser considerada um tanto esticada demais (e nisso o fato dos episódios semanais ajuda muito a prender a atenção). Particularmente eu gostei muito da série, especialmente por ser um programa que aborda temáticas de personagens maduros em suas crises sobre o que fizeram de suas vidas. É verdade que a coisa começa a ficar um tanto cansativa quando Henry precisa fazer uma lista de demissão de professores a mando de um novo investidor e a série deixa de lado o relacionamento tempestuoso do protagonista com os seus alunos (que rende momentos sempre interessantes). O elenco está ótimo em cena e adoraria vê-los por mais algumas temporadas, especialmente Bob Odenkirk desenvolvendo as nuances mais emocionais ao longo de uma nova temporada (como no episódio do jantar que me deu um nó na garganta). Bob está ótimo em cena, mas se a série não vingou, pelo menos serviu para desvencilhar sua imagem de Saul Goodman para aqueles que se aventuraram pela primeira e única temporada de Lucky Hank. Para quem curtir a série, resta procurar o livro Straight Man de Richard Russo, lançado em 1997 que serve de inspiração para a trama. 
 
Lucky Hank (EUA-2023) de Paul Lieberstein e Aaron Zelman com Bob Odenkirk, Mireille Enos, Sara Amini, Suzanne Cryer, Shannon DeVido, Jackson Kelly, Cedric Yarbrough, Oscar Nunez, Diedrich Bader, Nancy Robertson e Anne Gee Byrd.

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