Andreu e Farriol: descobrindo que o pão branco não lhes pertence.
Pão Negro foi o indicado pela Espanha a concorrer a uma indicação ao Oscar de filme estrangeiro em 2011. O filme acabou ficando de fora da lista depois de concorrer a 14 estatuetas no Goya (o Oscar da Espanha), dos quais ganhou nove (incluindo filme, direção, roteiro adaptado, atriz, ator revelação, atriz revelação...) e o filme merece atenção pelos seus vários méritos. Embora não seja novidade contar o sofrido período ditatorial da Espanha pelos olhos de uma criança, o filme consegue ter uma atmosfera impecável, especialmente em sua primeira parte. Desde o início quando pai e filho são surpreendidos por uma figura encapuzada na beira de um abismo - e tornam-se vítimas da simulação de um acidente - , sabemos que não estamos diante de um filme leve. O pequeno Andreu (Francesc Colomer) é o primeiro a ver o resultado do acidente e comunica aos seus pais. Esse é o início de uma rede de intrigas repleta de relações suspeitas que chegam à superfície. Desde a brutal sequência inicial o público prende o fôlego e Andreu associa aquelas mortes às últimas palavras da vítima - que faz alusão a uma figura quase folclórica que viveria nas cavernas locais. Seria verdade? Enquanto o pai de Andreu, Farriol (Roger Casamajor) torna-se um suspeito do ocorrido, o pequeno é mandado para a casa da avó e lá, junto aos primos, especula sobre a relação do acidente e o ser que habita a floresta. Não vai demorar para que o olhar quase fantasioso sobre o que está acontecendo evidencie o contexto político da época, não só a perseguição aos comunistas no fascismo franquista (que promete vitimar Farriol como um bode expiatório), como também a troca de interesses que existe entre a classe mais alta e a classe trabalhadora. A narrativa do cineasta Augustí Villaroga contamina gradativamente a ótíca de Andreu (e das outras crianças) sobre o mundo e faz o mesmo com o espectador. O filme, que poderia investir na linha que separa realidade e fantasia, aos poucos se torna cada vez mais denso, pesado, num emaranhado de mentiras e incompreensões que faz até Andreu perceber que seu pai não é o herói que imaginava. Conflitos sobre sexualidade, vida adulta, classes sociais e ideologias parecem sufocar os personagens conforme a trama avança. No fim das contas, Pão Preto mata (propositalmente) toda a poesia que seu roteiro abrigava. Talvez o menino que colecionava pássaros junto ao seu pai tenha descoberto que não havia muita diferença entre prender aquelas vidas e destruir outras. Ao final de Pão Preto (com seus chocolates imaginários em xícaras vazias se transformando em chocolates reais em xícaras caras) o que acontece é uma espécie de morte da esperança. Desfecho amargo para uma trama ambientada na guerra civil espanhola, que ficou conhecida como a última guerra romântica, a última onde o bem e o mal estavam bem demarcados. A julgar pelo destino de Andreu eu não saberia dizer quem ganhou a batalha.
Pão Preto (Pa Negre/Espanha-2010) de Augustí Villaroga com Francesc Colomer, Roger Casamajor, Marina Comas, Nora Navas e Sergi López. ☻☻☻
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