Porchat: exercício dramático contra a mesmice.
Sempre me chama a atenção quando um ator conhecido por comédias resolve investir em um papel dramático. A investida costuma dar conta de uma pendenga antiga no mundo das artes, afinal, pode redefinir uma carreira, fazendo com que o intérprete seja visto como "ator" e não mais como "comediante". Fábio Porchat ficou famoso com o humor do grupo Porta dos Fundos e sua carreira no cinema já rendeu cinco filmes de sucesso em apenas dois anos. O último deles é Entre Abelhas, que se mantem em cartaz há quatro semanas, ainda que o público estranhe o tom do filme. A verdade é que Entre Abelhas é um filme raro no cinema nacional cristalizado nos últimos anos, afinal, embora tenha algumas doses de humor, trata-se de um drama de tons quase surreais, já que o seu protagonista - depois de uma separação amorosa, deixa de enxergar as pessoas que estão ao seu redor gradativamente - rende algumas situações interessantes que compõe uma história instigante com ares de "Além da Imaginação". Bruno (Porchat) é um jovem editor de filmes, que tenta se recuperar da recente separação de Regina (Giovanna Lancellotti). Ele volta a morar com a mãe (vivida pela sempre inspirada Irene Ravache) e tem o ombro amigo de Davi (Marcos Veras) para lhe dar algum apoio moral - embora Davi seja um machista bem idiota. A vida do personagem segue uma rotina normal até que ele percebe, dentro de um táxi, que o motorista desapareceu. Desesperado, ele desce do táxi que, subitamente, volta a andar como se nada houvesse acontecido. Assim, ao andar nas ruas, ou observar fotos, ele percebe que as pessoas ao seu redor estão desaparecendo. Além da premissa interessante, o roteiro (assinado por Porchat e o diretor Ian SBF) explora como, aos poucos, o mundo de Bruno tornando-se cada vez mais solitário - como a cena da foto onde os amigos aos poucos desaparecem, ou com as pessoas que falam com ele sem que possam ser vista ou ouvidas e até a cena do jogo (de torcida minguada na arquibancada e time escasso em campo). Bruno procura uma explicação para o que acontece, mas o filme, sabiamente, escolhe deixar tudo em aberto, sem explicação até o final que pode gerar diversas interpretações (a minha é a mais romântica possível). Entre Abelhas é bem conduzido e serve ao seu propósito de fornecer à Fábio Porchat uma boa interpretação contida (ainda que em alguns momentos ele pareça prestes a explodir - evocando sua persona cômica tão conhecida). Porchat é magistralmente amparado por Irene Ravache e Luis Lobianco (que interpreta o atendente de participação importante na trama, sempre entre o cômico e o estranho), mas alguns personagens parecem negligenciados em sua construção (principalmente Regina e Davi que não colaboram para enriquecer a história como deveriam). No fim das contas, Entre Abelhas é um belo exercício de Porchat para lançar o cinema brasileiro num caminho contra a mesmice.
Entre Abelhas (Brasil/2015) de Ian SBF com Fábio Porchat, Irene Ravache, Marcos Veras, Luis Lobianco e Giovanna Lancellotti. ☻☻☻
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