Ronald e Nina: a hora da verdade.
Só de ter uma protagonista que recebe um novo rosto após ser cruelmente desfigurada a história já chamaria a atenção, mas o escritor Hubert Monteilhet queria mais quando escreveu "Le Retour des Cendres" em 1961. Adaptado para os cinemas em 2014 pelo cineasta alemão Christian Petzold, o filme chamou a atenção dos críticos pela forma intimista com que trata uma sobrevivente do Holocausto. Nelly Lenz (Nina Hoss) sobreviveu dois anos num campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial e teve o rosto desfigurado por torturas variadas. Ela conta com a ajuda da amiga Lene Winter (Nina Kunzendorf) para reconstruir o rosto e sua vida. Quanto ao rosto, um cirurgião plástico é capaz de tornar o mais próximo possível do que era antes - ainda que Nelly não se reconheça ao se ver refletida no espelho -, o problema maior são as marcas profundas que a guerra deixou em sua memória. Além das atrocidades que sofreu, ainda precisa lidar com a ausência de familiares e amigos executados nos campos. Porém, Nelly sabe que seu esposo, Johny (Ronald Zehrfeld) está vivo em algum lugar de Berlim e, na cidade em destroços, pretende encontrá-lo. Tal como o nome da ave mitológica que dá o nome ao filme, Nelly é capaz de renascer das cinzas, mas com o diferencial do alto custo de querer a vida antiga de volta. Nesse ponto, o reencontro com o esposo renderá alguns dos momentos mais dramáticos da sessão. Não apenas por ele não reconhecê-la, mas por haver a suspeita de que foi ele que a entregou aos nazistas em troca da própria sobrevivência. Haverá uma aproximação entre os dois, mas em nome de um golpe que Johny pretende aplicar a partir da semelhança da mulher que cruza seu caminho com a esposa que julga falecida. É na preparação desse golpe que Johny e Nelly irão se reaproximar, trocar lembranças e fazer com que Nelly perceba (de forma bastante áspera) que seu mundo não é mais como era antigamente. Christian Petzold cria um de tom solene, mas que funciona pela dinâmica que instaura entre o casal protagonista que lida, cada um do seu jeito, com os fantasmas do passado. Assim, a amiga Lene funciona como uma espécie de voz da consciência da amiga, que sempre lembra o que não pode ser esquecido de sua trajetória. Bem executado, ainda que modesto, em alguns momentos achei que a história funcionaria melhor sobre um palco, mas nada que prejudique o fluxo da narrativa. O grande destaque são as atuações das Ninas e Ronald Zehrfeld em cenas arrepiantes - com menção honrosa para a tristíssima cena final, onde Nelly solta a voz e despedaça o coração de quem está por perto (incluindo o nosso).
Phoenix (Alemanha/Polônia-2014) de Christian Petzold com Nina Hoss, Ronald Zehrfeld e Nina Kunzendorf. ☻☻☻☻
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