Ícaro: a tentação das asas de barro.
O documentário Ícaro é um dos três indicados ao Oscar deste ano que estão em cartaz no Netflix (os outros são Strong Island e o curta Heroínas que prometo comentar em breve). Para os brasileiros Ícaro pode ter até um sabor especial, já que acompanhamos de perto todo o drama dos atletas russos diante do escândalo de dopping pouco antes das Olimpíadas do Rio em 2016. Sabendo que o filme abordava esta polêmica, fiquei surpreso quando o filme começou e imaginei que estava assistindo a outro documentário por engano. O filme se inicia com a proposta do ciclista e documentarista Bryan Fogel lançar-se no auto-desafio de utilizar substâncias proibidas e não ser descoberto nos exames que precedem uma corrida na França. Nesta parte você imagina como o processo em si é um bocado antiético, mas acompanha para ver no que vai dar. O diretor fala sobre sua admiração por Lance Armstrong e o quanto ficou decepcionado quando descobriu que seu vigor nas provas era uma farsa e você nota um pouco de dor de cotovelo do diretor por não ter se tornado um atleta tão premiado e reconhecido como imaginava e, por isso mesmo, quis provar que os exames de dopping não foram capazes de acusar o que seus concorrentes utilizavam deliberadamente. No início ele tenta consultoria com um americano, mas logo é encaminhado para um russo, Grigory Rodchenkov, que é apresentado como alguém capaz de ajudá-lo a usar tais substâncias e melhorar seu desempenho sem que fosse pego pelo exame antidopping. Fogel segue as recomendações de Grigory, sente realmente seu desempenho melhorar e o público tem a impressão que enganar os exames não é realmente algo tão complicado... pelo menos até que investigações sobre Grigory e seu laboratório ganham as manchetes e a história ganha proporções assustadoras. O filme acompanha o desenrolar das denúncias de que existia uma verdadeira operação secreta para administrar o uso de tais substâncias sobre os atletas russos e como driblar os testes. A sensação de assistir Ícaro é um tanto estranha, já que falta um pouco de criticidade no olhar do diretor sobre Grigory, que de charlatão é quase apresentado como um herói. Fica perceptível como a proximidade dos dois afetou a objetividade do trato que a história recebeu diante da câmeras, mas, ainda que não amplie a discussão sobre os testes feitos nos eventos esportivos, pelo menos serve para apresentar os interesses que estão por trás do dopping e dos testes. Particularmente, não acredito que é somente a Rússia que utiliza tais procedimentos e Rodchenkov deve conhecer várias histórias que ele preferiu não revelar para a câmera. No entanto, Ícaro consegue manter a tensão do início ao fim e não duvido que em breve possa servir para construção de uma versão dramatizada em Hollywood - e que os russos sejam os vilões da história novamente.
Ícaro (EUA/2017) de Brian Fogel com Brian Fogel, Grigory Rodchenkov e Nikita Kamaev. ☻☻☻
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