Charlotte: um trabalho impecável.
Finalizando nosso #FimDeSemana dedicado a Novos Clássicos, está um dos filmes mais instigantes do cinema mundial. Sob a Areia deixou o público bastante inquieto mediante as especulações em torno da história da mulher que em uma temporada na casa de praia, perde seu marido após ele ir para um banho de mar. Ela não sabe se ele foi embora. Não sabe se ele se afogou ou até mesmo se tentou suicídio. A partir desta situação angustiante, Marie Drillon (a magnífica Charlotto Rampling) começa a tentar juntar pistas presentes no passado sobre os rumos que seu casamento tomava nos últimos tempos. Para cada teoria, o filme possui um conjunto de flashbacks capazes de fazê-la pensar no que pode ter acontecido. Dos silêncios do esposo, passando por uma conversa com a sogra, Marie busca uma resposta com a mesma intensidade que nega o que parece cada vez mais inevitável. No entanto, mais do que especular sobre o que teria acontecido, o roteiro (escrito pelo diretor François Ozon em colaboração com Emanuèle Bernheim e Marina de Van) explora outros pontos desta realidade assustadora. Marie tenta manter sua rotina, ao ponto de estranhamente continuar vivendo como se o esposo a esperasse em casa e dialogasse com ela como se nada houvesse acontecido. Tal comportamento causa estranhamento nos amigos, mas também começa a motivar problemas quando a chance de um novo romance se torna possível. Ainda que fuja da obviedade, dificilmente o filme funcionaria sem o talento de Charlotte Rampling ao destrinchar uma personagem tão complexa, com sentimentos tão conflitantes em torno das possibilidades que se apresentam. A atriz explora o que a história pode ter de trágico, de sensual, de irônico e até de cômico numa interpretação introspectiva que se tornou cada vez mais sua especialidade na longa carreira como atriz. A ideia funciona tão bem que eu já estava preocupado em como Ozon terminaria seu filme. Sempre costumo achar que os desfechos do cineasta não estão à altura de todo o resto, basta lembrar o que fez nos desfechos de Verão de 85 (2020) e Dentro da Casa (2012) - mas a ideia é tão bem costurada que o final não poderia ser diferente: se torna brilhante em sua simbologia dos anseios de sua protagonista. Sob a Areia é um filme tão interessante que serviu de divisor de águas para as carreiras de Ozon e Charlotte. François Ozon, depois de uma longa carreira dirigindo curtas-metragens engatava o ano definitivo de sua carreira. Depois de realizar dois longas que não receberam muita atenção, na virada do século ele realizou o provocador Gotas D'água em Pedras Escaldantes (2000) e este Sob A Areia (2000), dois filmes que não poderiam ser mais diferentes em seus temas e narrativas. Ozon apresentava a grande diversidade que marcaria sua carreira e a impressionante produtividade de lançar pelo menos um longa por ano. Já Charlotte Rampling, se tornou uma das atrizes mais respeitadas do cinema, com sua expressão enigmática, olhos gélidos e emoções contidas que tiram proveito da passagem do tempo em sua imagem de beldade que iniciou a carreira como modelo e estreou no cinema em Os Reis do Iê Iê Iê (1964) ao lado dos Beatles. Junto de 45 Anos (2015), que rendeu a ela sua primeira indicação ao Oscar de Melhor Atriz, e o clássico O Porteiro da Noite (1974), Sob a Areia completa o pódio de filmes mais emblemáticos da carreira da atriz.
Sob a Areia (Sous Le Sable / França - 2000) de François Ozon com Charlotte Rampling, Bruno Cremer, Jacques Nolot, Alexandra Stewart e Pierre Vernier. ☻☻☻☻☻
Nenhum comentário:
Postar um comentário