Acho que já podemos dizer que Florence Pugh é uma das melhores atrizes de sua geração (se não for a melhor). Aos 26 anos, a atriz já demonstrou que é uma artista a ser levada a sério. Foi assim desde que encarou a complicada protagonista de Lady MacBeth (2016), depois esteve arrasadora em Midsommar (2019), foi indicada ao Oscar por viver uma personagem em fases distintas da vida em Adoráveis Mulheres (2019) e não fez feio quando se tornou a nova Viúva Negra (2021) da Marvel. Nem quando tem que desbravar toda a atribulação de Não se Preocupe, Querida (2022) ela se intimidou, nem deveria, afinal, tinha outro filme para estrear em 2022 que mostraria que ela ainda tem muito a oferecer quando o assunto é talento. Em O Milagre, em cartaz na Netflix, ela interpreta Lib, uma enfermeira encarregada de uma tarefa espinhosa. Em 1862 ela foi designada para investigar uma menina que não se alimenta há quatro meses. A situação inexplicável já é tomada como um milagre pelo vilarejo em que a garota vive, mas é preciso que exista uma observação rígida para a legitimação de um autêntico milagre divino. Para que tudo seja lavrado e sacramentado, a enfermeira será responsável por observar a menina em uma parte do dia e uma freira será responsável por outra parte do dia. Obviamente que o novo filme de Sebastian Lélio (oscarizado por Uma Mulher Fantástica/2017) já pontua, na escalação destas duas observadoras, um embate entre ciência e religião. Enquanto a enfermeira de Pugh permanece cética com toda aquela situação, todos ao seu redor permanecem em estado de graça pelo que acontece com a milagrosa Anna (Kíla Lord Cassidy). Não por acaso, Lib aos poucos irá se aproximar de um jornalista (Tom Burke, sempre interessante) que também não acredita muito no absurdo da situação e se preocupa com as manipulações em torno do caso. Conforme a narrativa avança, Lib começa a desconfiar do que está havendo naquela casa e descobre situações mais complicadas do que imaginava. Baseado no livro de Emma Donaghue a mesma de O Quarto de Jack/2015), Lelio imprime aqui uma atmosfera de drama que avança feito um suspense ancorado pela interpretação sólida de Florence como um olhar de razão em um ambiente de pura emoção e adoração que, infelizmente ainda diz muito sobre os tempos atuais. No decorrer do filme uma série de pensamentos sobre a relação do jejum com penitência, sacrifício e santidade, o que deixou o decorrer da trama ainda mais interessante. No entanto, o mais legal é ver um filme difícil (ritmo lento, tom pesaroso e sem humor) se destacar várias vezes entre os filmes mais vistos do serviço de streaming. Prova de que ainda há interesse por filmes sérios entre a plateia.
O Milagre (The Wonder / Irlanda - Reino Unido - EUA /2022) de Sebastián Lelio com Florence Pugh, Kila Lord Cassidy, Niam Alghar, David Wilmot, Toby Jones, Ciarán Hinds, Elaine Cassidy, Josie Walker e Brían F.O'Byrne. ☻☻☻☻
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