segunda-feira, 8 de junho de 2020

Ciclo Palma de Ouro: A Missão (1986)

Robert e Jeremy: missionários traídos pela coroa. 

Na faculdade eu ouvia tantas pessoas comentarem sobre A Missão que confesso que tive certa implicância com o filme. Este foi o segundo filme do inglês Roland Joffé (antes ele realizou o igualmente premiado Os Gritos do Silêncio/1984), que demonstrava grande apuro técnico na construção de histórias em que o  poético e o atroz estão em conflito. A Misssão levou a Palma de Ouro em Cannes no ano em que concorria com os pesos pesados de Martin Scorsese (Depois de Horas), Arnaldo Jabor (Eu Sei que Vou te Amar, que deu o prêmio de melhor atriz para Fernanda Torres), Jim Jarmush (Down by Law), Neil Jordan (Mona Lisa) e Andrei Tarkovsky (O Sacrifício). A obra recebeu até outro prêmio por suas qualidades técnicas devido a construção de cenas que impressionam até hoje (incluindo a cena de abertura que não vou descrever para não estragar a surpresa) e mais de  trinta anos após seu lançamento ele é sempre lembrado como um dos filmes mais importantes sobre temática religiosa. Ambientado no século XVIII, o filme conta a história de missionários jesuítas responsáveis por catequizar os nativos latino-americanos nas chamadas missões, verdadeiras comunidades religiosas criadas na colonização para levar a doutrina católica e expandir os domínios europeus. Nas aulas de história sabemos que a colonização das terras latino-americanas aconteceu entre grandes disputas de poder entre Espanha e Portugal e o filme demonstra como no fim das contas o trabalho dos Jesuítas tinha um papel bem diferente de levar a palavra de Deus aos habitantes que viviam por aqui. A trama é ambientada ao nordeste da Argentina, na fronteira com a selva que se expande entre Paraguai e Brasil e gira em torno do empenho de bom grado do padre jesuíta espanhol Padre Gabriel (Jeremy Irons) em exercer sua tarefa e defender os índios de caçadores - feito o mercenário escravista Rodrigo Mendoza (Robert DeNiro), que não respeita as regras para captura de índios na colônia espanhola. A história de Rodrigo ganhará destaque no andamento da história, já que uma tragédia pessoal o fará buscar redenção e mudar os rumos de sua vida. Ele contará com padre Gabriel para reparar seus pecados e se tornará o total oposto do que era (se Rodrigo não fosse vivido por um ator tão competente como DeNiro seria difícil de engolir esta história), além disso, Rodrigo é fundamental para que o filme tenha cenas de ação e empolgar a plateia que não é muito fã de aulas de história no cinema (e Jaffé capricha em perseguições, duelos e explosões em vários pontos da trama). O cineasta constrói um filme que se beneficia muito dos cenários naturais lindíssimos e das intrigas políticas históricas que retrata, especialmente quando o trabalho de séculos dos jesuítas foi posto à prova perante os interesses europeus por aqui (e isso não chega a ser um spoiler, já que todo mundo sabe que os Jesuítas foram praticamente expulsos daqui da noite para o dia né, Marquês de Pombal?). Entre o belo e o  trágico é impossível não se indignar com com as crueldades que aparecem na trama, sobretudo em seu desfecho. É verdade que o filme romantiza muito algumas questões, mas em termos de narrativa funciona bem em sua grandiloquência - muito por conta das atuações sólidas de Irons e DeNiro (fique atento também à pequena participação de Liam Neeson em um dos seus primeiros papéis de destaque no cinema). Outro ponto que torna o filme interessante é sua temática que é tão pouca explorada no cinema, talvez por se tratar de um tema bastante espinhoso. Há de se reconhecer que Roland Jaffé e os demais envolvidos tiveram um bocado de coragem para realizar este projeto.

A Missão (The Mission / Reino Unido - França / 1986) de Rolando Joffé com Jeremy Irons, Robert DeNiro, Liam Neeson, Aidan Quinn e Ray McAnnally. 

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