domingo, 21 de junho de 2020

KLÁSSIQO: O Ódio

Saïd, Hubert e Cassell: violenta jornada dia adentro. 

De vez em quando aparece um filme francês que explora a tensão existente nos subúrbios franceses. A mistura de preconceitos, trabalho precarizado, falta de perspectiva sempre se torna uma mistura prestes a explodir em violência. É ainda mais assustador quando lembramos que em 1995 o filme O Ódio causou um impacto enorme ao ser exibido no Festival de Cannes mostrando esta bomba-relógio por dentro, com fotografia em preto-e-branco e um formato que lembra muito o cinema documental. O roteiro parece não existir e a direção do ator Mathieu Kassovitz, que estreava na direção em longa-metragem com esta obra, é imperceptível (e por isso mesmo, impressiona). A sintonia do filme com a realidade francesa era tão assustadora que o filme chegou aos cinemas em uma semana e na seguinte começaram as manifestações nas ruas francesas por conta da morte de um rapaz francês de origem árabe que aos 21 anos faleceu após ser perseguido por policiais. Era como se O Ódio houvesse previsto o futuro. Na verdade, Kassovitz se inspirou na morte de outro jovem, um imigrante zairense de 17 anos que morreu em uma delegacia por conta de um disparo acidental (na verdade, as mortes acidentais decorrentes da ação policial na França somam mais de centenas desde 1981). Reza a lenda que Kassovitz escreveu seu texto no mesmo dia em que filmava. A ideia era registrar 24 horas na vida de um trio de amigos de origens distintas no subúrbio francês, assim conhecemos Vinz (Vincent Cassell), jovem judeu que depois de um motim encontra a arma de um policial e promete se vingar das agressões que sofreu. Ele é amigo do pugilista negro Hubert (Hubert Koundé) que tenta tirar a ideia da cabeça do amigo e de Saïd (Saïd Taghmaoui), rapaz de origem árabe que não sabe muito bem o que fazer da vida. O trio de amigos se cruzam pela manhã e um conjunto de incidentes os irão colocar em conflitos com a policia, com traficantes e skinheads num dia longo e inquieto. Existe tensão e urgência na narrativa de Kassovitz, que é acentuada ainda mais pela agressividade nos encontros e em vários diálogos (que por vezes são cômicos e em outros assustadores). O filme causou tanto impacto que Kassovitz foi eleito o melhor diretor no Festival de Cannes de 1995, mas a imprensa parecia não se dar conta do que o filme retratava e se chocou quando a violência explodiu dias depois. Vinte e cinco anos após seu lançamento, O Ódio ainda é bastante atual e assusta justamente por isso (e curiosamente em 2004 o filme inspirou uma produção brasileira, Ódiquê? de José Joffily que nem de longe causou o mesmo impacto que esta produção francesa). 

O Ódio (La Raine / França -1995) de Mathieu Kassovitz com Saïd Taghmaoui, Vincent Cassell e Hubert Koundé. ☻☻

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