Tom Schilling: trajetória de um artista e de um país.
Em 2019 a disputa para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro foi a mais acirrada em muito tempo. No final das contas a categoria foi vencida pelo favorito: Roma (que concorria em dez categorias, incluindo melhor filme do ano e levou para esta e mais duas - diretor e fotografia). Porém, não são poucas as virtudes dos outros concorrentes daquele ano. Guerra Fria, Cafarnaum, Assunto de Família e Nunca Deixe de Lembrar colheram vários elogios e prêmios naquele ano e, comparado aos seus oponentes, este longa alemão escrito e dirigido por Florian Henckel von Donnersmarck deve ser o que segue um tipo de narrativa mais tradicional. Com mais de três horas de duração e fatos históricos em sua trama, o filme é bastante ambicioso ao contar a história de um jovem artista a partir da Segunda Guerra Mundial. A trama começa com o pequeno Kurt visitando um museu com sua tia (Saskia Rosendahl) e vendo uma série de obras rotuladas de degeneradas pela Alemanha hitlerista. Embora sua tia aprecie aquelas obras, ela também tem seu fascínio pelo führer e a euforia de seu encontro com o líder nazista a tira do eixo de forma determinante. Ironicamente, a trama deixa claro qual é o destino das pessoas que apresentavam qualquer tipo de inadequação dentro do regime. É com o fantasma da tia, talvez sua primeira musa, que o Kurt terá que lidar por toda a vida. Ele cresce (e passa a ser interpretado por Tom Schilling) desenvolvendo seu talento com pincel e tinta diante de uma nova Alemanha, que flerta cada vez mais com o comunismo e que valoriza seu talento para pintar murais tão gigantescos quanto imponentes sobre a nova realidade. Paralela à vida do jovem, conhecemos o que aconteceu com o médico responsável pelo destino de sua tia, o professor Carl Seeband (Sebastian Koch) que, embora tenha ligação importante com os nazistas conseguiu escapar de um julgamento mais rígido por conta de um... favor. O roteiro irá cuidar para que os caminhos de Kurt e Seeband se encontrem novamente em breve. Embora o filme não seja tão empolgante quanto o primeiro filme de Donnersmarck, a obra-prima (ganhadora do Oscar de Filme Estrangeiro) A Vida dos Outros/2006, Nunca Deixe de Lembrar serve para que esqueçamos da sua horrorosa aventura em Hollywood com O Turista (aquele desastre de 2010 com Johnny Depp e Angelina Jolie). Aqui ele também não se repete, assume aquele tom de cinema clássico, pausado, grandiloquente que segue um herói pela trajetória de uma vida. Embora Tom Schilling crie um protagonista bastante humano e o resto do elenco esteja tão eficiente quanto ele, a trama principal do filme é a própria história da Alemanha. Do nazismo, passando pela construção do muro de Berlim, sua influência no mundo das artes, tendo um roteiro que sabe ser irônico nos momentos certos (reparem como o pensamento autoritário aparece várias vezes e em um determinado personagem ele nunca se apaga, independente da ideologia que abrace). É verdade que o filme tem até uma história de amor (e com várias cenas de sexo filmadas de forma muito romântica) que serve de fio condutor da trama, mas o principal está no que aparentemente seria o pano de fundo. Não por acaso, a voz do protagonista está na arte e sua capacidade de retratar o mundo. Como o filme demonstra, ainda que deixem a realidade fora de foco, a história permanece e, o pior, se repete.
Nunca Deixe de Lembrar (Never Look Away / Alemanha - Itália / 2018) de Florian Henckel von Donnersmarck com Tom Schilling, Sebastian Koch, Saskia Rosendahl, Paula Beer, Oliver Masucci, Hanno Koffler e Jonas Dassler. ☻☻☻☻
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