Jaden, Oakes e Julianne: histórias paralelas.
Wonderstruck de Brian Selznick deve ser um daqueles livros que você adora quando lê, mas imagina que seria impossível transformar em filme. O motivo para esta dificuldade está na complexidade da trama e nos sentimentos complicados que abriga ao lidar com personagens infantis. No entanto, o diretor Todd Haynes topou o desafio e fez um filme que encheu os olhos, mas também causou estranhamento no Festival de Cannes. Com roteiro do próprio Selznick (também autor e A Invenção de Hugo Cabret/2011), o diretor dado a abordar temas polêmicos, aqui se aproxima mais do gênero infantil, ao mesmo tempo que cria uma estética um tanto rebuscada que somente os mais velhos podem desfrutar de todos os detalhes e referências. Talvez este seja o motivo do filme não encontrar o seu público, chamando mais atenção pela forma como chancela o protagonismo de duas crianças surdas em sua trama. O filme conta a história de duas crianças que vivem em tempos diferentes, um deles é o menino Ben (Oakes Fegley), que na Minessota de 1977 ainda tenta lidar com a morte da mãe e que não sabe o paradeiro do pai. Por conta de um acidente, ele irá perder a audição e terá coragem de partir em uma aventura em busca do pai na cidade de Nova York. Sua história é misturada com a da menina Rose (Millicent Simmonds que depois ficou mais conhecida pelo seu trabalho em Um Lugar Silencioso/2018 e é surda de verdade) que em 1927 parece ser grande fã de uma atriz do cinema mudo (vivida por Julianne Moore) e foge de casa para encontra-la. Rose tem problemas de relacionamento com o pai e com o mundo em geral, afinal, ela se sente totalmente deslocada (e a chegada do cinema falado parece acentuar ainda mais este incômodo). As histórias destes dois jovens personagens seguirão de forma paralela ganhando tom de aventura quando Ben chega ao Museu de História Natural. Haynes conta estas histórias aparentemente distintas com estéticas bastante diferentes, o mundo de Ben é colorido e embalado pelo rock dos anos 1970, o de Rose é em preto e branco e sem vozes, emulando um verdadeiro filme mudo. Estranhamente é nesta estética mais diferente que Haynes está mais à vontade e o filme chega a ser menos envolvente quando a menina recebe menos destaque na história. Já a trama de Ben investe em tantos segredos que acaba se tornando mais cansativa do que realmente envolvente. A sorte é que quando as duas histórias se unem o filme se torna mais terno e coerente, embora alguns acusem de cair no mais puro melodrama. O fato é que Haynes sempre se interessou por personagens que não se enquadram muito bem em seu tempo e Wonderstruck (que no Brasil recebeu o título de Sem Fôlego, vai saber o motivo...) não deixa de apresentar uma certa redenção de Rose através de dois momentos distintos de sua vida. O passar do tempo, com o crescimento e o envelhecimento demonstram como aprendeu a se apropriar e se impor no mundo que está ao seu redor. Este talvez seja o maior recado deste filme assinado por um diretor que aqui camuflou suas provocações com bastante fofura (para desespero dos seus fãs mais ferrenhos).
Millicent Simmonds: só ela já valeria o filme.
Sem Fôlego (Wonderstruck / EUA - 2017) de Todd Haynes com Millicent Simmonds, Oakes Fegley, Julianne Moore, Cory Michael Smith, James Urbaniak, Jaden Michael e Michelle Williams. ☻☻☻
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