Kappel: estreia transgressora.
Quando a sueca Bella Cherry (a estreante Sofia Kappel) chega no aeroporto de Los Angeles, lhe perguntam se ela chegou nos Estados Unidos por motivos de "Negócios ou Prazer?", ela não pensa muito e responde que veio à prazer. Provavelmente o interlocutor não imaginava que aquela jovem chegava por lá com a ambição de se tornar uma grande estrela do cinema pornô. Aparentemente Bella é uma novata na indústria pornográfica, não tem muita experiência e carrega o hábito de fotografar e publicar suas experiências em redes sociais (em busca de novos seguidores e alimentar a sua fama). Bella consegue um agente, passa a morar com um grupo de garotas um tanto parecidas com ela e se mete em projetos cada vez mais degradantes. É preciso dizer que esta espécie de "Nasce Uma Estrela" do cinema pornô é dirigido pela cineasta sueca Ninja Thyberg, ativista há vinte anos contra a pornografia e que realizou uma pesquisa severa na construção de seu filme. Além de estar ciente do tipo de pornografia que é mais consumida na internet e da forma como as "preferências" se tornam marca de status dentro da indústria, Thyberg visitou os bastidores deste tipo de produção para ver o comportamento dos envolvidos nas filmagens. Esta é a inspiração para o choque dos sonhos de sua protagonista com a realidade, especialmente nas cenas cada vez mais violentas a que se submete para se tornar uma estrela. A cineasta faz o que pode para simular o sexo em cena, faz bom uso de cortes e sons, os closes milimetricamente calculados e oferece até mais destaque aos, digamos, atributos masculinos do que os femininos. A ideia do masculino no filme ainda está temperada com um cinismo trágico em cenas que beiram o insuportável de serem assistidas. Confesso que em alguns momentos fechei os olhos como se estivesse diante de um filme de terror (e acredito que em alguns momentos o filme é isso mesmo) e em outras, avancei a cena como só o streaming é capaz de permitir (o filme foi disponibilizado recentemente na MUBI). Soa como uma ironia que um filme chamado Pleasure (Prazer) beire a tortura. Salvo as devidas proporções, o filme lembra um pouco o brasileiro Bruna Surfistinha (2011) no retrato de ambições amparadas por ilusões de um conforto que só os sonhos são capazes de proporcionar - e que a realidade transforma em pesadelos sem muita dificuldade. No entanto, na comparação, Pleasure perde no que diz respeito à sua estrutura narrativa. Ao optar por ser mais expositivo, o filme perde um bocado de fôlego ao não deixar muito claro para onde caminha até chegar ao seu desfecho. O que salta aos olhos aqui é a transgressão de seu formato para expor as relações de poder temperada com um tanto de sadismo, seja diante da câmera ou nos bastidores pornôs. Um filme que exige estômago para ser assistido.
Pleasure (Suécia / Países Baixos / França - 2022) de Ninja Thyberg com Sofia Kappel, Zelda Morrison, Evelyn Claire, Chris Cock, Jason Toler, John Strong, Alex Braun e Bill Bailey. ☻☻
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