sábado, 29 de abril de 2023

#FDS Lars von Trier: Ondas do Destino

 
Emily: até que a morte os separe. 

O segundo filme do final de semana especial com Lars von Trier é o seu primeiro filme a cair no radar do Oscar e, também, o que inaugura a aclamada trilogia "Coração de Ouro". Aqui ele conta a história da jovem Bess (Emily Watson), que vive em uma rígida comunidade religiosa ao norte da Escócia. Ela está decidida a casar com o namorado, o dinamarquês Jan (Stellan Skarsgård) que trabalha em plataformas de trabalho. O início deixa bem claro que para se casar, ela terá que desafiar os preceitos do grupo em que foi criada, o que provoca certo escândalo na comunidade local. No entanto, o fato de ser mal vista pelo grupo, não altera a fé de Bess - que acredita cegamente no nas palavras que Deus destina às suas orações e pedidos (e a forma como EmilyWatson conduz estas cenas específicas com um misto de ternura e estranheza são um destaque à parte, além de colaborar muito para entendermos que a saúde mental da personagem já passou por maus bocados). Com a cerimonia feita e a vida sexual mais do que satisfatória, ela entra em desespero quando descobre que o marido irá se afastar a trabalho e um desejo secreto e um acontecimento trágico irá contamina-la de uma culpa devastadora. Certa de que Deus atendeu seu pedido (ainda que por linhas tortas), a vida do casal está para sempre transformada e um pedido de Jan irá tornar a jornada de Bess irá se tornar um martírio. Misturando o amor ingênuo de sua protagonista com doses de culpa e expiação, a protagonista se torna a primeira personagem a comer o pão que Lars Von Trier amassou. Ela sofre de forma crescente em seu percurso e, acredita, que assim possa ter uma espécie de "graça alcançada". O filme traz vários elementos agregados à religião (religião,  fé, casamento, pecado, moral, excomunhão, culpa, milagre, sacrifício, santidade…), o que constrói uma trama quase paralela ao realismo impresso ao filme (e sempre ressaltada pela cunhada viúva de Bess, a enfermeira Dodo vivida por Katrin Cartlidge). Conforme tenta atender aos pedidos do esposo, Bess se torna uma pessoa mal vista e se depara com perigos cada vez maiores. Da fotografia tosca, passando pela edição crua e o uso de luz natural, nota-se aqui já alguns elementos que fazem parte do manifesto Dogma95 do qual Lars von Trier é um dos membros fundadores. Aqui ele deixa para trás a estética clássica de seu filme anterior (Europa/1991) e inicia sua jornada por filmes mais perturbadores e controversos. Neste contexto, o filme marcou a estreia da inglesa Emily Watson com vários elogios e prêmios, culminando com uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz por todo seu esforço na pele de uma heroína romântica desconstruída em situações um tanto degradantes. Apesar de todo o cinismo que possa ser enxergado no filme, os sinos ao final da sessão é uma mostra de  debaixo  de toda provocação de Trier ainda existe um tantinho de fé (embora não seja cega feito a de sua protagonista). 

Ondas do Destino (Breaking the Waves / Dinamarca - Suécia - França - Reino Unido / 1996) de Lars von Trier com Emily Watson, Stellan Skarsgård, Katrin Cartlidge, Jean Marc-Barr, Adrian Rawlins, Udo Kier, Roef Ragas e Sandra Voe. ☻☻☻

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