Não por acaso, a data em que o blog fecha o #FimDeSemana com filmes do cineasta Lars von Trier é o dia de aniversário do controverso dinamarquês. Lars nasceu em 1956 e sua família sempre prezou por sua criatividade com esperança de que se tornasse artista na idade adulta. No entanto, seus pendores artísticos sempre penderam para a polêmica por desafiar muitas vezes o que consideravam convencional. Em 1995, Lars ao lado de outros cineasta lançaram o manifesto Dogma95 com regras para se fazer filmes de maneira mais simples, menos comercial e provocadora. Foi no Festival de Cannes de 1998 que foram lançados os primeiros filmes integrados ao movimento, um foi Festa de Família (1998) de Thomas Vinterberg que colheu elogios e foi até indicado ao Globo de Ouro, do outro lado estava Os Idiotas (1998) de Lars von Trier que fez com que muita gente deixasse a sessão antes da metade e gerou vários questionamentos sobre o que se via na tela. Visto hoje, Os Idiotas pode soar ofensivo demais ao retratar um grupo de pessoas que fingem ter algum déficit cognitivo para testar a reação de quem está por perto. No entanto, lembro que quando o filme foi lançado, ele foi cercado de uma polêmica danada e não foi por conta das imitações realizadas no filme, mas por conta de uma cena de orgia em que uma cena bastante explícita foi realizada por um casal de atores pornográficos (que serviram de dublê para o elenco). Se antes muita gente a considerou sem propósito, hoje ela parece apenas sem graça com seus atores nus amontoados fingindo que estão fazendo algo sexual (e os dublês estão lá só para desviar nosso olhar do descontrole geral diante da câmera). Falando em descontrole, tudo parece tão improvisado que por vezes eu até esquecia que se tratava de um filme (sendo lembrado pelo microfone que insiste em aparecer em várias cenas). Além das "pegadinhas" feitas pelo grupo, o roteiro parece ser realizado de pontos que servem de partida para as ações do elenco, um desentendimento aqui e outro ali, uma despedida sofrida acolá, discussões de relações, crítica à lógica burguesa/capitalista das relações sócio-econômicas, o tom autoritário do líder (vivido por Jens Albinus) e doses de melodrama em torno de Karen (Bodil Jørgensen), a personagem que cai nos truques do grupo e que aos poucos se integra às ações deles. Ela os acompanha numa espécie de retiro em que o sentido está em não seguir regras e fazer o que quiser, não importa o quão bobo pareça (a este estado eles chamam de "paranoia"). A presença de Karen é um dos assuntos que aparecem quando o filme toma ares de documentário fake e no final sabemos que ela possui um drama pesado para carregar (e que talvez por isso ela repita o tempo inteiro que nunca foi tão feliz quanto os dias que passou ao lado do grupo de desconhecidos). É a personagem que faz com que os críticos incluam Os Idiotas na trilogia Coração de Ouro de Trier, embora era tenha bem menos destaque na trama que as protagonistas dos outros que compõem a trilogia. Os Idiotas tem aquele visual bastante característico dos filmes do Dogma95, fotografia tosca, câmera tremida, uso de luz natural, ausência de trilha sonora, não apego aos gêneros cinematográficos, zero efeitos especiais, não identificação do diretor na abertura, alguns destes fatores já servem para afastar muita gente, some isso às cenas de nudez mostradas com aquela naturalidade nada glamourosa e você vai entender o motivo do filme ter se tornado um dos mais polêmicos do diretor que adora que falem dele (mesmo que seja falar mal). No fim das contas, Os Idiotas pode gerar duas leituras, uma sobre a sociedade que os personagens criticam e outra sobre a postura alienada dos personagens disfarçada de intelectualidade. Talvez o que o filme queira dizer é que não devemos levar o que é convencional tão a sério, mas, e quando o anticonvencional se torna a severa convenção de um grupo? Essa autocrítica pode ser a maior provocação que o filme traz em suas entrelinhas.
Os Idiotas (Idioterne / Dinamarca - França - Países Baixos - Alemanha - Suécia - Itália /1998) de Lars Von Trier com Bodil Jørgensen, Jens Albinus, Anne Louise Hassing, Troels Lyby, Nikolaj Lie Kaas, Louise Mieritz e Luis Mesonero. ☻☻☻
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