Jackson e Naomi: boas atuações no universo de Garcia.
Ano passado Naomi Watts foi outra loura que teve suas chances nas premiações naufragadas, já que as produções que estrelou não vingaram nas bilheterias. Mas dos três filmes que preparou para o ano passado, o mais desprezado foi este Destinos Ligados que foi lançado por aqui direto nas locadoras. Além de Naomi - que além de ser uma mulher de encher os olhos (sorte de Liev Schriber) ainda é capaz de fazer coisa boa mesmo em bombas como O Chamado/2002 - o filme ainda conta com Annette Benning na outra ponta da narrativa construída por Rodrigo Garcia, além de um elenco de apoio mais do que eficiente. Garcia andava em baixa depois de aceitar conduzir o suspense sobrenatural Passageiros (2008) que foi espinafrado pela crítica, mas tém lá os seus encantos. Mesmo assim, quem conhece e aprecia os outros filmes do diretor não vai se decepcionar com Destinos Ligados, onde volta a explorar universos paralelos explorando a vida de três mulheres. Uma delas é Karen (Benning), mulher amarga que trabalha numa clínica e cuida da mãe de saúde comprometida quando chega em casa. Se fosse um objeto, Karen seria uma metralhadora. Ela utiliza palavras como se fossem verdadeiras munições para ferir quem ousar se aproximar de sua trajetória. Mesmo quando se interessa por um colega de trabalho (Jimmy Smit) ela não sabe como demonstrar esse interesse, sendo grosseira numa espécie de defesa para evitar um envolvimento afetivo que poderá feri-la depois. Desde o início suspeitamos que existe um vínculo entre ela e a advogada Elizabeth (Watts), que possui postura semelhante, ainda que agressivamente mais sexual. Excelente advogada, as constantes mudanças entre as cidades percebidas por seu novo patrão (Samuel L. Jackson, a vontade num papel bem diferente que costuma fazer há pelo menos uns dez anos) só ressaltam sua dificuldade de criar laços com quem está por perto. Menos do que dizer que existe algo de genético entre as duas, o filme de Garcia ressalta que a vida de ambas foi marcada por um corte emocional profundo quando Kern doou a filha (Elizabeth) para adoção e desde então se pergunta sobre o paradeiro dela. A ousadia da narrativa é nos expor a duas personagens femininas desagradáveis, quase impossíveis de suportar num longa metragem. Na dificuldade de ter nossa simpatia capturada, a personagem Lucy (Kerry Washington) surge como uma brisa de ar fresco na sua tentativa de adotar um filho ao lado do esposo compreensivo (David Ramsey). Curiosamente quando ela demonstra que tem lá suas próprias dificuldades de relacionamento (ela é humana, oras!), as outras duas personagens percebem que construir laços com os outros pode mudar nosso mundinho intererior. Nesse momento que Benning e Watts mostram porque são duas das melhores atrizes do cinema, explorando nuances que apontam semelhanças e diferenças entre temperamentos aparentemente tão idênticos (Watts, por exemplo, captura toda a dualidade de não saber quem é o pai de seu filho, o que compromete a relação com o homem que resiste para não amar). Garcia, como de costume, utiliza muitas simbologias e metáforas no seu texto, só que desta vez se concentra na relação entre mãe e filho. Mais do que com relação ao afeto, procura trabalhar a relação de gerar (ou não) a vida dentro de si e relacionar-se com esta vida quando ela se exterioriza num outro ser. Embora tenha boas ideias, é impossível não notar as semelhanças do filme com o melhor longa do diretor: Coisas que você pode dizer só de olhar para ela (2000). Estão lá os relacionamentos interraciais, a gravidez indesejada, a menina cega, homens que não parecem os ideais (mas que são verdadeiros cavalheiros), homens que parecem os ideais (mas são inseguros), a mulher sisuda que cuida da mãe doente... estes personagens (e as ruas vazias) parecem apontar para a construção de um universo próprio (tal como o de Almodóvar, Woody Allen ou David Lynch) pelo diretor. Se existe um problema no filme é que, embora ambicione, ser profundo existe frieza na condução dos dramas em que suas personagens mergulham - mesmo que ao final uma tragédia possa anunciar a redenção.
Destinos Ligados (Mother and Child/EUA-2010) de Rodrigo Garcia com Anette Benning, Naomi Watts, Kerry Washington, Samuel L. Jackson e David Ramsey. ☻☻☻
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