Elenco de peso falando sobre ver, olhar, observar, perceber...
Gosto do documentário Janela da Alma como se fosse um dos meus livros de filosofia favoritos, mas não pense que ele é chato e pesaroso, pelo contrário é um grande prazer vê-lo e revê-lo. Não por acaso o vi quando estava na faculdade, junto aos meus colegas da atividade de Cinema e Literatura. O mais interessante é que o filme de João Jardim e Walter Carvalho não se limita a falar sobre os problemas de visão como muitos pensavam, mas na forma como lidamos com o nosso olhar, o que apenas vemos e o que percebemos com mais profundidade. Composto de dezenove depoimentos, Janela da Alma mostra-se uma reflexão muitíssimo interessante, o título refere-se à frase de Leonardo DaVinci: "O olho é a janela da alma, o espelho do mundo" e utiliza além das entrevistas, alguns truques que brincam com a nossa percepção (quando vemos um superclose da pele humana, ou quando a câmera perde foca, desfoca, refoca... propositalmente como se fosse uma obra abstrata, tão abstrata quanto alguns dos temas na pauta dos diretores. Afinal, José Saramago (autor do célebre Ensaio sobre a Cegueira) afirma que vivemos numa época cada vez mais próxima da Caverna de Platão, já que somos bombardeados de informação, mas... podemos dizer que enxergamos a realidade? Nossas percepções podem nos ajudar a perceber o mundo, mas também podem ser muito traiçoeiras. O depoimento de Marieta Severo é bastante contundente nesse aspecto, ou então, atire a primeira pedra quem nunca teve os outros sentidos afetados quando perdeu as lentes? Todos os entrevistados tem algo interessante a dizer, seja o diretor alemão Win Wenders (que diz preferir ver o mundo enquadrado pela armação dos seus óculos), o músico Hermeto Pascoal, a atriz alemã Hanna Schygulla, deixando o momento mais bem humorado para o vereador cego Arnaldo Godoy (de Belo Horizonte) contando a sua experiência de viver sem enxergar nada. Aos poucos o filme ganha a forma de uma rede temática muito bem construída, sem pender para a chatice ou a esquisitice, sendo instigante ao abordar a construção cultural de como enxergamos o mundo. Não por acaso, alguns dos momentos mais tocantes são os referentes à animadora Marjut Rimminem e o filósofo (e fotógrafo) Eugen Bavcar, que mostram, através de suas obras, como veem o mundo. Essa peróla do acervo documental brasileiro surgiu quando Walter Carvalho e João Jardim conversavam sobre como a miopia ajudou a moldar suas respectivas personalidades (Walter tem 7, 5 pontos de miopia e João tem 8!), às vezes ver pouco pode ser sinônimo de enxergar muito.
Janela da Alma (Brasil/França-2001) de João Jardim e Walter Carvalho com Marieta Severo, José Saramago, Win Wenders, Eugen Bavcar, Hermeto Pascoal, Antonio Cícero e Agnès Varda. ☻☻☻☻☻
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